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Queda de Boeing em Teerão agrava crise de confiança na construtora dos EUA

As caixas negras foram recuperadas mas Teerão fez saber que os dados do voo não seriam enviados aos norte-americanos.

Queda de Boeing em Teerão agrava crise de confiança na construtora dos EUA
ABEDIN TAHERKENAREH

A queda de um avião Boeing 737 NG da transportadora ucraniana International Airlines na quarta-feira em Teerão deve agravar a crise de confiança em que está mergulhado o construtor norte-americano, apesar de ainda se desconhecerem as causas.

Depois de dois acidentes trágicos, que provocaram 346 mortos, envolvendo outro modelo de aparelho, o 737 MAX, a reputação do construtor aeronáutico está fortemente posta em causa.

As caixas negras - que podem ajudar a esclarecer as circunstâncias do acidente que provocou 176 mortos -- foram recuperadas, mas Teerão fez saber que os dados do voo não seriam enviados aos norte-americanos, com as tensões entre os dois Estados a permaneceram vivas.

"Estamos prontos para dar a nossa assistência, seja qual for a forma", declarou à AFP um porta-voz da Boeing, recusando adiantar se, perante o embargo dos EUA ao Irão, os seus quadros estavam autorizados a viajar para o país do Médio Oriente, para auxiliar os investigadores, como é o hábito em casos destes.

"Para participarem no inquérito, os EUA devem ser convidados pelos iranianos", afirmou à AFP, sob anonimato, um dirigente norte-americano.

"Este acidente acontece em muito má altura para a Boeing", considerou Michel Merluzeau, analista na Air Insight Research. "A confiança e a imagem junto do público estão nos mínimos", referiu.

Além de considerar que "as aparências não são favoráveis à Boeing", Richard Aboulafia, do Teal Group, disse ainda que "a declaração do porta-voz do aeroporto de Teerão, afirmando que o acidente era devido a 'dificuldades técnicas', não é credível, porque os investigadores não inspecionaram as caixas negras, nem as comunicações dos pilotos".

A Boeing está mergulhada desde março na pior crise da sua história, o que conduziu ao despedimento, no final de dezembro, do presidente-executivo Dennis Muilenburg e provocou numerosas críticas sobre a sua cultura empresarial.

Dois aviões 737 MAX, um pertencente à Lion Air e outro à Ethiopian Airlines, caíram no espaço de cinco meses, provocando 346 mortos.

Os inquéritos colocaram em questão programas informáticos e o construtor aeronáutico tem estado a trabalhar para conseguir o levantamento da interdição de voo deste aparelho que representa mais de dois terços da sua carteira de encomendas.

O processo tem estado cheio de momentos de tensão com a autoridade federal da aviação (FAA, na sigla em inglês), que detetou problemas suplementares, um relacionado com o sistema de controlo de voo e outro, mais recentemente, com as cablagens elétricas. Mas, peritos como Michel Merluzeau realçam que "tem de se dissociar a queda do 737-800 (NG) ucraniano da crise do 737 MAX".

Michel Merluzeau exortou a "olhar o acontecimento em partes separadas e analisar o que se passou: o local, o equipamento, o aeroporto e a empresa aérea. São os elementos principais que tiveram um efeito sobre o que se passou".

Na opinião de Scott Hamilton, perito na Leeham, "os artigos de imprensa que associam a queda da Ukraine (International) Airlines em Teerão à crise do MAX são irresponsáveis".

Considerando que ainda é demasiado cedo para tirar qualquer conclusão, Hamilton recordou que o costume é os investigadores explorarem várias pistas, como "um erro dos pilotos, um problema de manutenção, um erro técnico, fatores externos, como a meteorologia, o terrorismo ou uma manobra militar que correu mal".

Outros peritos ouvidos pela AFP não excluíram que o avião tenha absorvido um objeto que estivesse sobre a pista, no momento da descolagem.

Segundo a transportadora Ukraine International Airlines, "o avião foi produzido em 2016 e foi recebido diretamente pela companhia aérea diretamente da fábrica (Boeing)" e "teve a sua última inspeção técnica em 06 de janeiro de 2020".