O Presidente de França, país que preside atualmente ao Conselho da União Europeia, vai conversar com o Presidente russo na sexta-feira, em mais um esforço para tentar desanuviar a tensão sobre a Ucrânia.
A conversa telefónica entre Emmanuel Macron e Vladimir Putin ocorre numa altura em que a “bola” está do lado de Moscovo, depois de os Estados Unidos e a NATO terem respondido, por escrito, às exigências russas sobre a questão ucraniana.
Ocidente responde à Rússia
Os EUA e a NATO anunciaram que enviaram as respostas às exigências russas sem revelar pormenores, mas reafirmando uma posição já anunciada: a Aliança Atlântica mantém o princípio de porta aberta, o que significa rejeitar a exclusão da adesão da Ucrânia, como pretendia Moscovo.
Tanto a administração norte-americana como a NATO disseram que ofereceram a Moscovo a via diplomática para resolver a crise.
Agora, “a bola está no campo russo”. Moscovo deve decidir se escolhe o caminho da diplomacia ou o da confrontação.
A NATO aumentou a prontidão e a presença das suas forças, “incluindo nas regiões dos mares Negro e Báltico, com mais navios e aviões”.
A NATO exigiu ainda à Rússia “uma conversa séria” sobre o controlo de armas, incluindo armas nucleares e mísseis terrestres de médio e curto alcance.
Milhares de soldados na fronteira
A crise foi desencadeada com o envio, pela Rússia, de dezenas de milhares de soldados e armamento pesado para a fronteira da Ucrânia, ainda em 2021.
A Ucrânia e os países ocidentais dizem que esta concentração de forças – que afirmam ultrapassar os 100.000 soldados – indicia que a Rússia pretende invadir novamente o país vizinho, depois de ter anexado a península ucraniana da Crimeia, em 2014.
Moscovo tem repetidamente negado essa intenção e acusa os EUA e os seus aliados da NATO de armarem a Ucrânia.
A 18 de janeiro, a Rússia começou também a enviar soldados para a Bielorrússia para exercícios de combate nas fronteiras da UE e da Ucrânia.
Qual foi a reação do Ocidente?
Os EUA e a NATO manifestaram o apoio à Ucrânia e reforçaram o envio de equipamento militar para Kiev.
Esta semana, os EUA colocaram em alerta 8.500 soldados como parte da Força de Reação da NATO, que tem 40.000 efetivos.
Dinamarca, Espanha e França também enviaram efetivos e meios navais e aéreos para os mares Báltico e Negro, Roménia (onde a NATO tem uma base de defesa antimísseis) e Lituânia.
Além destes reforços, a NATO tem 5.000 efetivos na Estónia, Letónia, Lituânia e Polónia, embora sem caráter permanente, e uma missão de vigilância do espaço aéreo dos Estados Bálticos na Lituânia, em que Portugal participou até 30 de novembro de 2021.
A UE anunciou um apoio urgente de 1.200 milhões de euros à Ucrânia.
Exercícios militares
A Rússia iniciou manobras militares no Mar Negro, na quarta-feira, destinados a determinar as ações necessárias para “proteger os interesses nacionais russos (…), bem como combater as ameaças militares à Federação Russa”, segundo um comunicado do Ministério da Defesa.
Exercícios distintos e separados serão realizados nas águas dos mares Mediterrâneo, Norte, Okhotsk, na parte nordeste do Oceano Atlântico e no Oceano Pacífico.
No total, Moscovo conta com a presença de mais de 140 navios de guerra e embarcações de apoio, mais de 60 aeronaves, 1.000 unidades de equipamento militar e cerca de 10.000 soldados.
A ação da diplomacia
A crise foi discutida pelos presidentes dos EUA e da Rússia numa cimeira virtual a 7 de dezembro de 2021.
Joe Biden ameaçou a Rússia com “fortes sanções económicas” e Vladimir Putin exigiu “garantias legais seguras” para impedir a adesão da Ucrânia à NATO.
Moscovo divulgou depois a sua proposta: dois tratados para proibir a expansão da NATO e o estabelecimento de bases militares no Leste, bem como a retirada de tropas aliadas da Roménia e Bulgária, num regresso à situação anterior a 1997.
À cimeira Biden-Putin, seguiu-se uma semana de negociações em janeiro, que começou com um encontro entre Blinken e Lavrov no dia 10, em Genebra, Suíça.
No dia 12, realizou-se em Bruxelas um Conselho NATO-Rússia, a que se seguiu, a 13, uma reunião em Viena da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE).
Formato Normandia
A Alemanha e a França estão também a tentar reativar o chamado Formato Normandia, que criaram em 2014, com a Rússia e a Ucrânia, na sequência da guerra na região ucraniana de Donbass (leste).
Representantes dos quatro países reuniram-se na quarta-feira, em Paris, e concordaram na necessidade de cumprir o acordo de cessar-fogo em Donbass.
Também decidiram realizar uma nova reunião ao nível de conselheiros políticos dentro de duas semanas, em Berlim, mas não abordaram a possibilidade de um novo encontro dos líderes do quarteto.
A última cimeira do grupo da Normandia realizou-se em dezembro de 2019, em Paris, e foi o primeiro encontro entre Vladimir Putin e o seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelenski.
Sanções nunca vistas
Os EUA e os seus aliados prometeram aplicar sanções nunca vistas à Rússia se invadir a Ucrânia.
Os pormenores não foram divulgados, mas poderão implicar a retirada da Rússia do sistema de transferências interbancárias, o que poderia afetar o acesso aos lucros internacionais do petróleo e do gás, que representam 40% das receitas russas.
O adiamento da entrada em funcionamento do gasoduto Nord Stream 2, que liga diretamente a Rússia à Alemanha, pode ser outra das sanções, mas Moscovo também pode cortar os fornecimentos de gás à UE.
Perante essa possibilidade, os EUA e a UE iniciaram contactos com outros fornecedores para suprir as necessidades europeias, mas a simples perspetiva de crise contribuiu para fazer disparar os preços dos combustíveis e a inflação na Europa.
Os EUA também pretenderão restringir a exportação de tecnologia para a Rússia, sobretudo em áreas como a indústria aeroespacial e de defesa, robótica ou inteligência artificial, que Moscovo não poderá substituir facilmente.
Expectativa na frente e calma aparente em Kiev
Soldados e civis no leste da Ucrânia aguardam com expectativa o desenrolar dos acontecimentos, conscientes de que o seu destino está a ser decidido por políticos em capitais distantes, segundo relatos da linha da frente.
Kiev, uma cidade com mais de quatro milhões de habitantes, “vive em calma aparente: o tráfego é intenso e permanente, edifícios em estilo neoclássico, outros da época soviética, rivalizam com modernos edifícios onde as lojas oferecem os melhores produtos ocidentais”, como descreveu esta semana o enviado da Lusa à Ucrânia.