Uma das grandes vantagens que as plataformas de streaming trouxeram foi a possibilidade, por vezes surpreendente, de acedermos a muitos títulos marcantes da história do género documental. Um bom exemplo actual poderá ser “Tristeza e Compaixão”, um clássico de 1969 com assinatura de Marcel Ophüls (título original: “Le Chagrin et la Pitié”; título internacional: “The Sorrow and the Pity”).
Mais de meio século depois do seu lançamento, o filme tem um lugar na galeria dos grandes clássicos do documentário, o que, em qualquer caso, só aconteceu depois de uma recepção polémica, a suscitar opiniões muito contrastadas. Ophüls conduz um inquérito cinematográfico, indissociável de uma genuína atitude jornalística de investigação, sobre a Segunda Guerra Mundial em França e, mais especificamente, sobre a ocupação alemã e as formas de colaboração do governo de Vichy com o invasor.
Através de uma combinação didáctica de materiais de arquivo e entrevistas actuais (reflectindo, como é óbvio, pontos de vista de finais da década de 1960), “Tristeza e Compaixão” dá-nos conta de uma conjuntura de enorme complexidade em que descobrimos tanto a acção da Resistência Francesa como os comportamentos dos colaboracionistas — descobrindo também as tensões e interrogações associadas a tais memórias.
Como curiosidade, refira-se que um dos mais recentes inquéritos internacionais sobre a história dos documentários foi feito em 2014, pela revista “Sight & Sound”, do British Film Institute. Votaram programadores, realizadores e críticos de todo o mundo (num total de 340 personalidades). Na lista dos 50 melhores documentários de todos os tempos, “Tristeza e Compaixão” surgia em 11º lugar; o primeiro lugar pertencia a “O Homem da Câmara de Filmar” (URSS, 1929), de Dziga Vertov.