Analisar os prémios de cinema a partir de um ponto de vista banalmente “subjectivo” a nada conduz: quaisquer distinções do género (seja numa pequena cinematografia como a portuguesa, seja nos Óscares de Hollywood) valem pelo modo como reflectem a visão dominante de um determinado colectivo — neste caso, os Prémios Sophia são o resultado das escolhas dos membros da Academia Portuguesa de Cinema.
Os principais vencedores foram “O Último Banho”, de David Bonneville, e “A Metamorfose dos Pássaros”, de Catarina Vasconcelos: melhor filme e melhor documentário, respectivamente, referentes à produção de 2021. O primeiro ganhou ainda nas categorias de argumento original e direcção artística; o segundo venceu nas de realização, montagem e som, recordando-o aqui em baixo através do respectivo trailer. Com a animação como tema de destaque do espectáculo, o realizador e produtor Abi Feijó foi distinguido com um prémio de carreira.
Dito isto, vale a pena chamar a atenção para um “desequilíbrio” estratégico que justifica alguma reflexão. Assim, a realização do espectáculo de atribuição dos Sophia a meio do ano faz com que a maior parte dos filmes já não tenha vida possível nas salas (mesmo se é verdade que vários deles estão disponíveis em plataformas de streaming), Dito de outro modo: para o espectador “médio”, é difícil estabelecer alguma conexão entre a cerimónia e a vida comercial dos filmes (premiados ou não).
Em boa verdade, tal questão é apenas um sintoma de problemas mais gerais de difusão da produção cinematográfica portuguesa. Agora que a Academia Portuguesa de Cinema conseguiu o mais básico — definir-se como uma entidade viva e actuante no espaço do cinema —, seria também útil voltar a enfrentar alguns problemas crónicos. Quais? Desde os contrastes de exibição entre algumas cidades e a “província”, até à escassez financeira que (mal) sustenta o marketing dos próprios filmes.
Os filmes poderão ser “melhores” ou “piores”. E não tenhamos ilusões: irão sempre suscitar visões desencontradas, muitas vezes inconciliáveis. O que, em qualquer caso, não anula a defesa de um princípio muito básico: é importante desenvolver estruturas (entenda-se: investir dinheiro) para que a diversidade do cinema português seja um valor real de um conceito ágil de política cultural. A cerimónia da Academia mostrou, pelo menos, que há matéria criativa para que tal possa acontecer.