O projeto de lei deu entrada na Assembleia da República a 6 de dezembro de 2019, mas já vinha a ser discutido desde que André Ventura se desvinculou do PSD para fundar o Chega, que ganhou um assento parlamentar nas eleições de outubro. A proposta, que se tornou uma das principais bandeiras do partido, estava agendada para ser discutida pelos deputados no Parlamento a 28 de fevereiro, mas o Presidente da Assembleia da República decidiu que o projeto não será debatido em plenário, por não preencher os requisitos "do ponto de vista constitucional".
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Em que consiste o projeto de lei do Chega?
O projeto de lei tem como objetivo agravar as penas para crimes sexuais contra menores, bem como introduzir a pena acessória de castração química. Acabou por ser submetido na Assembleia da República, mesmo apesar de suscitar dúvidas jurídicas sobre a sua constitucionalidade, e foi levado à Comissão de Assuntos Consitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sob a seguinte designação:
"Agravação das molduras penais privativas de liberdade para as condutas que configurem os crimes de abuso sexual de crianças, abuso sexual de menores dependentes e atos sexuais com adolescentes e criação da pena acessória de castração química"
Acrescenta-se ainda que, para o efeito, não seria necessário o consentimento do condenado, como acontece em vários países em que a castração química é legal.
Proposta inconstitucional?
A maior dúvida levantada até ao momento é a constitucionalidade da medida - que podia nem chegar a ser discutida no Parlamento caso Ferro Rodrigues não tivesse considerado que o texto não versa apenas a castração química, mas também outras medidas, como o agravamento das molduras penais para agressores sexuais.
A dúvida do Presidente da Assembleia da República foi a mesma da Comissão de Assuntos Consitucionais. Porém, os deputados acabaram por decidir que o projeto podia ser debatido em plenário, apesar da alegada violação da Constituição. Também os partidos com assento parlamentar fizeram saber a sua posição em relação a esta discussão. É considera por todos inconstitucional.
No parecer do Conselho Superior da Magistratura, solicitado pela Comissão, pode ler-se que as formas de punição que impliquem a agressão ao corpo ou ofensa da integridade física da pessoa são "violadoras da dignidade", um argumento utilizado também pelo parecer da comissão à qual o projeto de lei parece "não resistir ao crivo do juízo de inconstitucionalidade".
O Chega já acusou o presidente da Assembleia da República e os partidos, com exceção do CDS, de quererem dificultar o debate sobre a castração química. A acusação surgiu na sequência de um pedido feito por Ferro Rodrigues para que a Comissão de Assuntos Constitucionais faça um esclarecimento adicional sobre a proposta do partido.
Que outros problemas suscita?
O projeto em questão não define o período mínimo e máximo de duração do tratamento, nem o momento em que deve ser iniciado. Segundo o parecer do Conselho Superior da Magistratura (CSM), é o mesmo que dizer que a "proposta não regula a duração do tratamento".
Para além desta falha, o CSM considera discutível a eficácia do tratamento em casos da reincidência de abusos.
"Cessando o tratamento hormonal o agressor recupera o seu desejo sexual, elevando o risco de reincidência. (...) Acresce que, como é sabido, a simples falta de ereção pode não obstar a que determinado tipo de agressor sexual cometa outras formas de abuso, designadamente através de objetos", apontou a Conselho no parecer.
A Comissão de Assuntos Consitucionais pediu também pareceres ao Conselho Superior do Ministério Público, à Ordem dos Advogados, à Ordem dos Farmacêuticos e à Ordem dos Médicos.
O que é a castração química?
É um processo distinto da castração física, que envolve a mutilação dos genitais. Consiste na toma de medicamentos hormonais, que reduzem o nível de testosterona e inibem o desejo sexual durante um determinado período de tempo.
Apesar de ser um processo reversível, o tratamento tem efeitos colaterais entre os quais se destacam: fadiga, queda de cabelo, desenvolvimento de diabetes, problemas respiratórios, depressão, trombose, hipertensão, problemas na circulação sanguínea, aumento do colesterol, aumento das mamas (ginecomastia).
Em que países é legal?
Foi aplicada pela primeira vez em 1952, no Reino Unido, quando um cientista, punido por homossexualidade - na altura considerada uma doença - preferiu a castração química em vez de uma pena de prisão. Em consequência, perdeu algumas capacidades cognitivas e entrou em depressão, acabando por morrer passados dois anos.
Contudo, foi a partir da legalização na Califórnia que a medida se começou a tornar mais popular. Seguiram-se outros estados, como a Flórida, a Geórgia, Iowa, Louisiana, Montana, Orgen, Alabama e Wisconsin. Nos EUA, a castração é aplicada quando os agressores reincidem. Já noutros países, como o Reino Unido, Israel, França, a aplicação da castração química depende do consentimento do acusado.
A Polónia foi o primeiro país europeu a aprovar legislação em relação a esta matéria. Apesar de não falar especificamente de castração química, está prevista a medicação para a redução de impulsos sexuais. Na Rússia e na Coreia do Sul a castração química também é legal.
Verifica-se, portanto, que a castração química é aplicada como medida de tratamento, prevenção ou pena, em diversos países e discutida em outros, como é o caso do México, Colômbia, Brasil, Áustria e agora Portugal.