O jornalista Luís Pinheiro de Almeida, responsável por esta seleção, que antecipa uma comemoração maior dos 50 anos do ié-ié português, afirmou à Lusa que tentou "um equilíbrio entre o chamado nacional-cançonetismo e o ié-ié" .
O movimento ié-ié, referiu o responsável, "trouxe uma lufada de ar fresco mas foi abortado pelo serviço militar obrigatório" .
"Eu até costumo dizer que a juventude portuguesa estava mais habituada a ter uma (metralhadora) G3 na mão que uma guitarra, pois o serviço militar obrigatório abortava qualquer projeto de conjunto musical" , disse Luís Pinheiro de Almeida.
O jornalista referiu a brevidade de vários grupos como os Sheiks ou os Ecos, ou o caso dos elementos do Conjunto Académico João Paulo "que de uma só vez foram todos para a tropa" .
Nesta seleção, dos Sheiks surge "Missing you" e "Lonely lost and sad", e do Conjunto Académico João Paulo, "Milena" e "Eu tão só", uma versão de uma canção de Charles Aznavour.
O novo movimento musical levava a fazer paralelos entre artistas ié-ié nacionais e os estrangeiros que o protagonizam.
Assim, os Sheiks, contou Pinheiro de Almeida, eram considerados os Beatles portugueses, os Conchas eram os Everly Brothers e Daniel Bacelar era o Rick Nelson português.
Era difícil o convívio entre os seguidores do novo movimento musical, "chamados os guedelhudos e flausinas" , - onde pontificavam nomes como Daniel Bacelar ou Zeca do Rock - e os fãs de Simone de Oliveira, António Calvário, Trio Odemira: "Odiavam-se!" .
Pinheiro de Almeida contou que "nos começos dos anos 1960, no então Teatro Monumental, em Lisboa, numa matinée em que do cartaz constavam Daniel Bacelar, Zeca do Rock e Madalena Iglésias, o público expulsou a cançonetista, que saiu do palco a chorar" .
Referindo-se à popularidade que estas canções têm hoje junto de um outro público, Luís Pinheiro não adiantou uma razão específica mas apontou pistas: "O factor 'kitsch', a ausência de coisas novas, ou o que há não consegue captar as pessoas" .
O duplo álbum inclui ainda Green Windows, Natércia Barreto com "Óculos de sol", que dá o título à edição, Conjunto Mistério, Grupo 5, Quarteto 1111, Demónios Negros ou Mafalda Sofia.
Esta edição inclui também Marco Paulo a interpretar uma versão de "San Francisco" (de John Philips, popularizada por Scott Mckenzie), assinada por António José, ou as canções vencedoras do Festival RTP da Canção como "O vento mudou" por Eduardo Nascimento (1967), ou "Verão" por Carlos Mendes (1968). Simone de Oliveira interpreta uma versão de Sandy Shaw, "Marionette" ("Puppet on a string" que venceu o Festival da Eurovisão de 1967).
António Calvário interpreta, com Madalena Iglésias "É tão bom amar", um original de Francisco Nicholson e Ferrer Trindade, e a solo uma versão de "Sapore di sale", do italiano Gino Paoli.
Duo Ouro Negro, João Maria Tudella com "Kanimambo" e José Cid completam a lista de nomes de "Óculos de sol".
Luís Pinheiro de Almeida só lamenta não ter sido possível incluir "Era um biquini pequeno à bolinhas amarelas" ou Florbela Queiroz a cantar "Eu sou a mesma", por não terem sido cedidos os direitos de licenciamento.
(Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico)
Com Lusa