João Rosado

Comentador SIC Notícias

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Opinião

Vítor Bruno até ao fim

Opinião de João Rosado. André Villas-Boas só tem uma solução face ao impensável naufrágio na Madeira.
Vítor Bruno até ao fim
PAULO NOVAIS

Se o futebol estivesse sempre de mãos dadas com o passado, o FC Porto ainda estaria em 2024. No espaço de uma semana, coincidindo com a passagem de ano, os dragões passaram de uma equipa prometedora, em paz com o treinador e favorita à liderança do campeonato a um grupo excursionista que foi à Madeira apenas com uma única determinação, ou seja, despedir-se da candidatura ao título.

Por muito dolorosa que tenha sido há oito dias a eliminação da final da Taça da Liga, nada fazia prever a falta de profissionalismo denunciada perante um Nacional que parecia estar a defrontar um emblema do quarto escalão, qual jogo da Taça de Portugal, prova, de resto, que já foi abandonada quer por Tiago Margarido quer por Vítor Bruno.

Longe do fulgor na Liga Europa e apesar de ter vencido a Supertaça, o onze portista sabia, assim, que tinha de esgotar as fichas no desafio que faltava completar para ficar definida a primeira volta da Liga Betclic.

GREGORIO CUNHA

Em contraciclo com as quatro vitórias e zero golos sofridos nos encontros que antecederam a meia-final perdida em Leria ante o Sporting, o FC Porto que (não) se exibiu na primeira parte do duelo com os insulares mostrou uma vulgaridade e uma apatia que envergonham a história do clube e desmentem os sinais de recuperação lançados para o universo a partir do empate em Bruxelas com o Anderlecht.

Os triunfos frente a Midtjylland (2-0), Estrela da Amadora (2-0), Moreirense (3-0) e Boavista (4-0), abrilhantados pela confirmação do talento do adolescente Rodrigo Mora, faziam crer que os rivais diretos tinham algo que aprender com o ano zero de André Villas-Boas (AVB) e Vítor Bruno.

E tudo isso parece agora uma grande mentira e tudo passa a ser equacionável no que diz respeito ao grau de cumplicidade entre treinador e jogadores.

Mais do que um problema para o antigo adjunto de Sérgio Conceição, é sobretudo um (enorme) problema para o presidente. Por um lado, porque não pode despedir o técnico que está a um ponto do topo da tabela. Quando decidiu avançar para a promoção do profissional que durante 13 anos esteve na sombra do atual “allenatore” do Milan, Villas-Boas sabia que estava a fazer uma aposta nos limites e cuja “paternidade” teria sempre de assumir, mesmo nas circunstâncias mais difíceis, ou melhor, a começar pelas circunstâncias mais difíceis.

MANUEL FERNANDO ARAUJO

Até na condição de ex-treinador, o sucessor de Pinto da Costa tinha a perfeita consciência de que o convite e o aliciamento a Vítor Bruno exigiam de ambos uma dose suplementar de coragem e um pacto de sangue que não pode ser desfeito sob pena de AVB tratar o mister que tanto o encantou como se fosse o João Pereira lá da Invicta.

Recados de luxo, caixote de lixo

André e Vítor ou Vítor e André, conforme se quiser, estão umbilicalmente ligados a um projeto e a uma ideia de reestruturação que vai para além dos resultados, conforme se pode ler na mensagem presidencial dada à estampa na última edição da revista Dragões e na qual se preconiza um ambicioso modelo de governação. “Em 2025 queremos mais do que títulos, queremos consolidar o FC Porto como um exemplo de gestão, paixão e compromisso com um futuro radioso”, escreveu Villas-Boas num texto com recados de luxo para um balneário (“aos jogadores pedimos que entrem em campo com a garra e o coração que nos caracterizam”) que depressa e com a maior desfaçatez os enviou para o caixote do lixo.

Sem autoridade moral para prescindir dos serviços de Vítor Bruno, o responsável máximo do FCP também reconhecerá que aguardar pelo pedido de demissão do seu funcionário é aguardar pelo milagre da transfiguração. Pelo que demonstra, pelo que discursa, pela postura e lastro que inclusive deixou na qualidade de n.º2, o coimbrão não indicia ser um homem capaz de atirar a toalha ao chão e desistir das vincadas convicções. Vista do exterior, é uma questão de caráter e não deixa de ser uma questão que merece um enquadramento especial à luz da emancipação declarada à revelia do próprio Sérgio Conceição no contexto Porto.

Sérgio Conceição
AC Milan

Na prática, o candidato que goleou o histórico Jorge Nuno nas urnas só tem uma solução para fazer respeitar os pergaminhos da instituição e corresponder aos milhares de votos de confiança recebidos nas eleições de abril. Tem de inventar dinheiro, tem de descobrir parcerias, de entrar em jogos de cedências, em suma, está forçado a uma acrobacia financeira para conseguir algum encaixe que lhe permita injetar no mercado de janeiro uma dose de insuspeita qualidade no plantel.

Como é óbvio, não se tratará de uma tarefa exclusiva do presidente. Jorge Costa e Andoni Zubizarreta têm de fazer uso das respetivas competências no sentido de apetrechar a equipa com reforços acima de qualquer suspeita e capazes de emprestar referências à altura da melindrosa missão de resgate emocional e performativo.

Sem passar por cima da conveniência em encontrar alternativas de peso a Mora e Samu, o FC Porto precisa, com a máxima urgência, de reforçar de uma vez por todas um eixo defensivo que não beneficiou na plenitude dos ingressos de Nehuén Pérez e Tiago Djaló.

Claro que a aquisição de um renomado defesa-central é quase tão dispendiosa como a de um goleador de créditos firmados e de certeza que na SAD azul e branca não faltará quem chame a atenção para tal. Mas o preço a pagar por uma época fracassada e... pela eventual contratação de um novo treinador com outros níveis de exigência salarial e de recrutamento pode traduzir a despesa proibida.

Se o futebol estivesse sempre de mãos dadas com o passado, o FC Porto ainda hoje estaria em 2024, em abril de 2024, a meter na Liga os papéis do novo contrato de um presidente no balneário e de um treinador dentro de campo.

Pepê
FERNANDO VELUDO

Já era conhecido por Pepe quando há muitos anos mostrou a sua determinação na ilha da Madeira.