Economia

Maioria do banco central dos EUA quer reduzir a "bazuca" já este ano, revelam atas da reunião de julho

A maioria dos membros do comité de política monetária da Reserva Federal norte-americana quer começar a reduzir o ritmo de compra de ativos no mercado ainda este ano, segundo o relato da reunião de 27 e 28 de julho, publicado esta quarta-feira. Mas não lhe quer chamar "aperto" da política monetária

Maioria do banco central dos EUA quer reduzir a "bazuca" já este ano, revelam atas da reunião de julho
Samuel Corum

As atas da reunião de 27 e 28 de julho do comité de política monetária da Reserva Federal (Fed), o banco central dos Estados Unidos, não deixam margem para dúvidas sobre uma opinião que já se tornou maioritária - a de que os estímulos à economia por via do banco central têm de começar a emagrecer.

O mais poderoso banco central do mundo deverá ainda este ano começar a reduzir a "bazuca" monetária - de injeção de liquidez no mercado através da aquisição de ativos, nomeadamente de títulos de dívida pública -, juntando-se às decisões no mesmo sentido já tomadas pelos bancos centrais da Austrália e do Canadá.

"A maioria dos participantes julga que será apropriado começar a reduzir o ritmo de compra de ativos este ano", lê-se nas atas publicadas esta quarta-feira pela Fed. E "alguns" querem mesmo "o mais rápido possível preparar a limitação das compras de ativos".

No entanto, "alguns" dos participantes na reunião sublinharam que tem de se explicar ao mercado que a redução do ritmo de compras de ativos não implica "um aperto na política monetária". Na estratégia de comunicação querem que se distinga a redução do ritmo - que os americanos batizaram de tapering desde os tempos da presidência da Fed por Ben Bernanke - da expressão "aperto" temida nos mercados.

"Alguns" também não querem que se transmita para o mercado a ideia de que o início da redução das compras de ativos significa "o início de um roteiro pré-estabelecido de subida da taxa diretora" que está num intervalo mínimo de 0 a 0,25%. Os mercados só esperam um primeiro agravamento na taxa de referência da Fed na reunião de dezembro do próximo ano, segundo as probabilidades indicadas pelos futuros da taxa diretora no Fed Watch da CME.

Mas, apesar da formação de uma opinião maioritária, "vários" dos banqueiros centrais continuam a pedir "prudência" nas decisões em virtude das "incertezas" que continuam a dominar o horizonte mundial da pandemia e dos impactos na economia.

O debate sobre a inflação

Apesar da pressão maioritária para o começo da redução dos estímulos, o consenso na Fed é que a subida da inflação é "transitória", uma palavra repetida oito vezes nas atas e que Jerome Powell, o presidente do banco central, não se cansa de usar.

As atas destacam que a opinião é que a subida da inflação para níveis muito acima do objetivo de 2% da política monetária se deve a factores que não são persistentes, como os problemas nas cadeias de fornecimento e a escassez de mão-de-obra. Recorde-se que em junho e julho a inflação nos EUA disparou para 5,4% (muito acima dos 2,2% registados em julho na zona euro).

Os defensores do carácter transitório alegam, ainda, que o disparo está concentrado "em certas áreas". Powell já referiu que há uma subida localizada e não "um processo inflacionista". Ele salientou que "as subidas estão limitadas a cerca de um terço do cabaz de preços", refere Marc Chandler, analista em Wall Street e diretor na consultora Bannockburn Global Forex.

No entanto, ainda segundo o relato da reunião, houve participantes que sublinharam que essa subida pode continuar em 2022, pois os problemas referidos na oferta e no mercado laboral podem persistir mais tempo do que se antevê.

A próxima reunião da Fed, a 21 e 22 de setembro, já se realizará após conhecida a inflação de agosto.

Alguns economistas e políticos têm recordado o período batizado de "grande inflação", sobretudo a partir de 1977, quando um surto inflacionista dominou os EUA até 1981. Em 1977, já na presidência democrática de Jimmy Carter, a inflação subiu sistematicamente acima de 6% e chegou a um máximo de 13,3% em 1979.

Em agosto desse ano, Carter chamou o economista Paul Volcker para colocar ordem na inflação, que entraria numa trajetória descendente a partir de 1980 baixando para 3,8% dois anos depois já na presidência de Ronald Reagan. Volcker manter-se-ia à frente da Fed até ao verão de 1987. Entre 1978 e 1981 subiu a taxa diretora do banco central para dois dígitos, chegando a 18% em 1980.