Economia

Advogados violam sigilo profissional se revelarem planeamento fiscal dos clientes?

No espaço de quatro anos, Maria Lúcia Amaral só enviou quatro diplomas para o Tribunal Constitucional.

Advogados violam sigilo profissional se revelarem planeamento fiscal dos clientes?

A Provedora de Justiça pediu ao Tribunal Constitucional que avalie as regras que obrigam as empresas e seus consultores a comunicarem ao Fisco os esquemas de planeamento fiscal agressivo. Em causa está o sigilo profissional dos advogados que, tal como a lei está redigida, violará direitos fundamentais da classe profissional.

As regras que pretendem prevenir o planeamento fiscal agressivo já existiam em Portugal desde 2009 (embora com parcos resultados), mas acabaram por saltar para a agenda europeia depois de escândalos como os Panamá Papers, os Paradise Papers e os Lux Leaks, terem exposto a participação ativa das consultoras e assessores em esquemas de fuga aos impostos e de identificação dos beneficiários efetivos dos negócios.

A diretiva europeia, conhecida como DAC VI, foi transposta para Portugal no ano passado (lei 26/2020), e, genericamente, obriga as empresas que adotem determinado tipo de esquemas de planeamento fiscal (tipificados na legislação) a comunicarem-nos ao Fisco.

A obrigação de comunicação está do lado das empresas mas, no limite, se elas não fizerem a comunicação em tempo devido, o ónus acaba por recair sobre os seus consultores fiscais, quem quer que eles sejam. Ora, para Maria Lúcia Amaral, esta regra acaba por apanhar também, de forma desproporcionada, os advogados que estão legalmente protegidos pelo sigilo profissional.

Num comunicado esta segunda-feira divulgado, a Provedora de Justiça considera que, ao não especificar as situações que estão salvaguardadas pelo sigilo, a lei não mostra “qualquer preocupação de estabelecer um equilíbrio entre as finalidades de interesse público de transparência e combate à evasão e elisão fiscal e os direitos fundamentais que protegem especialmente o segredo profissional do advogado”.

A diretiva europeia esteve em discussão pública em 2019 e, logo de início, suscitou duras críticas por parte dos advogados, para quem o dever de sigilo não poderia ser posto em causa. Na versão final, o Governo acabou por fazer recair o dever de comunicação sobretudo sobre quem aplica as regras (as empresas ou entidades) e deixar aos consultores, contabilistas e advogados apenas as obrigações, de forma subsidiária.

Até ao momento não se sabe quantos esquemas de planeamento fiscal agressivo já foram comunicados às Finanças, à luz destas regras criadas a nível europeu sobretudo para facilitar a troca de dados a nível transfronteiriço. Sabe-se, contudo que as regras anteriores, que desde 2009 se aplicaram apenas a nível interno, foram nos últimos anos ignoradas pelos seus destinatários e pouco ou nada fiscalizadas pela Autoridade Tributária.