Não é claro se a intenção é quebrar contratos, mas certa é já a decisão de exigir a partir desta quinta-feira aos países “hostis”, como os Estados-membros da União Europeia (UE), o pagamento em rublos do gás russo. O anúncio foi feito pelo próprio Presidente Vladimir Putin e pode ser alargado a outras exportações como petróleo, fertilizantes, metais, entre outros. Quem ganhe e perde com esta decisão?
Foi num reunião do Governo que Vladimir Putin anunciou que tomou “a decisão de implementar um conjunto de medidas para mudar o pagamento do nosso gás entregue a países hostis para rublos, e para renunciar em todas as moedas de liquidação que tenham sido comprometidas“.
Ao chanceler alemão e ao primeiro-ministro italiano, o Presidente russo assegurou que esta decisão “não vai agravar as condições estabelecidas nos contratos para as empresas europeias que importam gás russo” e terá mesmo garantido a Scholz que os pagamentos da Europa no próximo mês “continuarão a ser em euros e transferidos, como de costume, para o Gazprom Bank, que não está sujeito a sanções” e que tratará da conversão em rublos.
Mas por que motivo terá o líder russo tomado esta decisão? Com a invasão da Ucrânia, a valorização da moeda russa caiu a pique e, por consequência, passou a entrar menos dinheiro no país através das exportações. Além disso, alguns analistas, citados pelo The Guardian, especulam que quer os dólares, quer os euros são menos úteis a Moscovo.
A juntar a este facto, não chegou o Banco Central russo comprar rublos para sustentar a moeda. Com a proibição de aceder ao sistema de pagamentos SWIFT, o Banco Central ficou impossibilitado de fazer investimentos em dólares e euros para comprar rublos.
Decisão de Putin pode resultar (ou não)
Se o Kremlin insistir que os contratos atuais em euros e dólares sejam alterados para rublos arrisca incorrer numa violação dos protocolos internacionais. A Alemanha diz estar preparada para racionar o fornecimento de energia em vez de pagar pelo gás em rublos, o que deve levar a maior economia da UE à recessão. Mas também a Rússia pode sair a perder agravando ainda mais o declínio económico do país.
Quem são os ditos países “hostis”?
A lista é extensa e inclui todos aqueles que aplicaram sanções à Rússia devido à invasão da Ucrânia. Além dos Estados Unidos e dos 27 Estados-membros da UE, da lista faz ainda parte o Reino Unido, Japão Canadá, Noruega, Singapura, Coreia do Sul e a Suíça. Sendo que tanto os EUA como a Noruega não importam gás russo.
Qual é o peso do gás russo na UE?
A União Europeia foi, em 2020, o principal parceiro comercial da Rússia que foi, por sua vez, o quinto maior parceiro comercial da UE. Porém, é o gás russo que assume a maior parcela destas importações europeias pagas em euros, dólares ou libras.
A título de exemplo, 58% das vendas de gás natural da Gazprom para a Europa e outros países foram liquidadas em euros. Já os dólares americanos representaram cerca de 39% das vendas brutas e a libra cerca de 3%. No início deste mês, o centro de estudos económicos Bruegel, de Bruxelas, indicava que ao preço atual do gás, a Europa estava a gastar 660 milhões de euros por dia nas suas importações provenientes da Rússia.
Rublo a recuperar e sanções a fracassar?
A moeda russa está a recuperar das quedas que sofreu depois das sanções, aplicadas pelos EUA e pelos europeus, e graças às medidas financeiras extremas aplicadas pelo Presidente Putin. O Banco Central russo subiu a taxa de juro para 20% e foram impostos estritos controlos de capitais aos que procuram trocar rublos por dólares ou euros.
Putin pode não conseguir sustentar esta defesa monetária, à medida que os efeitos das sanções se façam sentir na economia russa, mas a recuperação do rublo pode ser um sinal de que as sanções ocidentais não estão a ser tão poderosas quanto os aliados da Ucrânia estavam a contar.
O rublo estava a ser transacionado a 85 por dólar, praticamente ao mesmo nível em que transacionava antes de invadir a Ucrânia, há um mês.
Em 7 de março chegou a transacionar a 150 rublos por dólar, quando se especulou com a eventual proibição pelo governo de Joe Biden de importações do petróleo e gás russo.
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