Ataque no Centro Ismaili

Psiquiatras contestam condenação de Abdul Bashir a pena máxima de prisão

Grupo de psiquiatras assina manifesto contra a decisão do tribunal que considerou imputável Abdul Bashir, condenado a 25 anos de prisão pelo homicídio de duas mulheres no Centro Ismaili, em Lisboa. Os especialistas alertam para a desvalorização de um diagnóstico clínico de esquizofrenia.

Abdul Bashir, afegão que atacou Centro Ismaili
Abdul Bashir, afegão que atacou Centro Ismaili
SIC Notícias

Um grupo de 32 psiquiatras enviou um manifesto à Ordem dos Médicos sobre a decisão judicial que considerou imputável o homem que confessou ter matado, em 2023, duas mulheres no Centro Ismaili, em Lisboa.

No documento a que a Lusa teve acesso, o grupo de psiquiatras assume "perplexidade e preocupação" e considera que o tribunal que condenou Abdul Bashir à pena máxima de prisão, fixada em 25 anos, desconsiderou o parecer médico-legal feito por especialistas em psiquiatria forense e o testemunho de um psiquiatra em sede de julgamento, que identificaram um diagnóstico de esquizofrenia.

Além da perícia pedida a psiquiatras forenses, o tribunal solicitou também uma avaliação a um psicólogo forense e concluiu que as "perícias realizadas não são unânimes", tendo o psicólogo forense considerado que "não viu nada que sustentasse um diagnóstico de esquizofrenia".

Perante esta análise, o coletivo optou por considerar que Abdul Bashir é imputável e, por isso, terá de cumprir pena numa prisão, por oposição ao regime de internamento, caso fosse considerado inimputável.

Psiquiatras contestam decisão judicial que ignorou diagnóstico de esquizofrenia

O manifesto foi enviado para a Ordem dos Médicos esta quarta-feira e o grupo de psiquiatria considera que o tribunal "ignorou um diagnóstico médico, apoiando-se num parecer de psicólogo forense que não pode fazer diagnósticos médicos, nem os contestar e que, portanto, extravasou a sua competência".

"Negar esse direito [à saúde], num contexto onde a esquizofrenia foi diagnosticada e documentada, significa abdicar do princípio da dignidade da pessoa humana", sublinham os psiquiatras.

No documento é ainda feito um apelo para uma urgente reflexão pública "sobre os riscos de uma justiça desinformada e impermeável à ciência" e é sublinhado que as perícias psiquiátricas não servem para atenuar as penas, mas sim para garantir tratamento e "que a responsabilidade penal se aplica apenas quando é possível exigir responsabilidade pessoal".

Tribunal diz que Abdul Bashir agiu com consciência e recusa internamento

O Ministério Público tinha defendido que Abdul Bashir, de 30 anos, é inimputável e pedido que este fosse internado, e não preso, por um mínimo de três anos. No entanto, o tribunal decidiu que o homem "atuou deliberadamente" e recusou a inimputabilidade.

"O arguido não tinha qualquer doença que no momento da prática dos factos lhe condicionasse a sua vontade ou que o fizesse não perceber o que era certo ou errado e, por isso mesmo, [o tribunal] entendeu que era imputável", disse a presidente do coletivo de juízes durante a leitura do acórdão.

O crime remonta a 28 de março de 2023 e as vítimas foram duas mulheres, de 24 e 49 anos, que trabalhavam no serviço de apoio aos refugiados do Centro Ismaili.

No total, o cidadão afegão foi considerado culpado de sete dos 11 crimes de que estava acusado: dois de homicídio agravado, três de homicídio na forma tentada, um de resistência e coação sobre funcionário e um de detenção de arma proibida.