Germano Almeida

Comentador SIC Notícias

Eleições nos EUA

DIA D-88: Trump, acossado, aceita três debates

Opinião de Germano Almeida. O recente aviso do Presidente Joe Biden quanto ao que poderá acontecer após a eleição ("não acredito numa transferência pacífica do poder") reforçou receios em relação ao que Trump possa incitar junto da sua base, caso volte a perder.
DIA D-88: Trump, acossado, aceita três debates
Joe Raedle

1 – TRUMP SENTE QUE TEM MESMO DE VIRAR O JOGO

Primeiro disse que não debatia com Kamala (para mostrar que ainda a via como vice do ticket adversário). Depois, quando se apercebeu da recuperação rápida da nova adversária democrata, até lançou o desejo de "múltiplos debates".

Quando apareceu a data de 4 de setembro com a FOX News, atirou que seria o único duelo televisivo com Harris. Mas, afinal, Trump aceitou três debates: esse da FOX mais o da ABC a 10 de setembro -- que já estava fechado quando o candidato ainda era Joe Biden -- e um terceiro a 25 de setembro, na NBC.

Serão três momentos muito importantes para ajudar a definir uma corrida que está tecnicamente empatada e arrisca assim ficar até, pelo menos, o final dos três debates. A menos que a Convenção de Chicago corra particularmente aos democratas e Harris surja na ronda de três debates como clara favorita.

Por enquanto, a luta está mesmo 50/50. Tudo pode acontecer. Acossado, depois de ter achado que já tinha a presidência garantida, Donald Trump ainda procura um novo registo para enfrentar a rival. A escolha de Tim Walz levou Donald e o seu parceiro JD Vance a aumentar o tom de acusação contra o ticket democrata, rotulando Kamala e Tim de "perigosos radiciais extremistas de esquerda". Só que não.

Joe Raedle

2 – NÃO FOI O APOCALIPSE. MAS FOI MAIS GRAVE DO QUE MUITOS IMAGINARAM

O recente aviso do Presidente Joe Biden quanto ao que poderá acontecer após a eleição ("não acredito numa transferência pacífica do poder") reforçou receios em relação ao que Trump possa incitar junto da sua base, caso volte a perder. No dia seguinte à vitória choque de Donald Trump, a 9 de novembro de 2016, Barack Obama, citado num artigo de David Remnick na “New Yorker”, apontava. Isto não é o apocalipse. Não acredito numa visão apocalíptica – pelo menos até que chegue o apocalipse.” Os quatro anos que se seguiram, de facto, não mostraram o apocalipse. Mas talvez tenha sido mais grave do que muitos imaginaram.

Timothy Garton Ash, professor em Oxford, nota: “As pessoas pensam que Trump é estúpido, mas ele não é nada estúpido. Há cinco anos ainda falava a linguagem típica de um investidor de Wall Street, com formação académica. Agora fala a linguagem de quem nem completou a educação básica. É assim que consegue que alguém num bar, ouvindo vagamente a TV, exclame: “Olha, aquilo sou eu a falar.”

Governar pelo Twitter não era a ideia que tínhamos do modo de atuação de um Presidente dos EUA. E muito menos seria a forma truculenta, demagógica e mentirosa como Trump se tem comportado em momentos chave da sua presidência. O prestígio e a autoridade do cargo político mais influente do mundo estão em perigo. Sim, o sistema tem pesos e verificações que garantem contrapoderes e limitam tentações autoritárias – e isso também funcionou em momentos cruciais. Mas não nos enganemos: quem marca a agenda é o Presidente. Mesmo Obama, com tanta oposição republicana e nos media afetos à direita, foi o ‘pivot’. A via obamiana de pensar que “só é o fim do mundo quando chegar o fim do mundo” pode ser aconselhável do ponto de vista anímico. Mas o olhar da sua mulher, Michelle, terá sido mais cirúrgica, quando, dias antes da eleição, declarou de forma profética: Isto vai ser sobre quem vai votar mas também muito sobre quem não vai votar”.

Hillary que o diga: ao não mobilizar mais negros na Carolina do Norte e mais mulheres no Midwest permitiu, há oito anos, que o absurdo se tornasse real. Martins Amis identificara a perplexidade: “Na corrida de 2016, nunca pareceu existir correlação objetiva da retórica com a realidade. A economia estava bem. Os rendimentos da classe média até aumentavam um pouco desde a crise. Não é como se isto fosse a República de Weimar. Não vivemos no meio de ruínas decadentes, caos, anarquia. Havia um programa relativamente liberal e cauteloso e de repente confrontamo-nos com este hiato cor-de-laranja e artificialmente bronzeado. É difícil ver nisto uma reação à realidade. O que parece é um divórcio da realidade."

Stephen King, escritor americano especialista em contos de terror, já nos tinha avisado: “Os monstros são reais e os fantasmas são reais também. Vivem dentro de nós e, às vezes, vencem”. Biden, em 2020, travou o pior. Conseguirá Kamala repetir o feito em 2024?

Alex Wong

UMA INTERROGAÇÃO: Vão os democratas da ala esquerda, que em 2016 não se mobilizaram de forma maciça na eleição geral depois de Hillary se ter imposto a Sanders na nomeação, mas acorreram às urnas em 2020 para eleger Biden, voltar a correr o risco de, por omissão, contribuírem para nova eleição de Trump em 2024? Ou será que a escolha de Tim Walz para vice de Kamala ajudará a uma mobilização idêntica há quatro anos?

UM ESTADO: Arizona

  • Resultado em 2020: Biden 49,4%-Trump 49,1%
  • Resultado em 2016: Trump 48,1%-Hillary 44,6%
  • Resultado em 2012: Romney 53,5%-Obama 44,5%
  • Resultado em 2008: McCain 53,4%-Obama 44,9%
  • Resultado em 2004: Bush 54,8%-Kerry 44,3%

-- O Arizona tem 7 milhões de habitantes: 54% brancos, 32% hispânicos, 5% negros, 4% asiáticos; 50,3% mulheres // 14.º maior estado em população // 28.º em riqueza

VALE 11 VOTOS NO COLÉGIO ELEITORAL

UMA SONDAGEM:

VOTO NACIONAL POPULAR -- Trump 48 / Kamala 46
(CNBC/Change Research, 31 julho-4 agosto)