O correspondente da SIC no Médio Oriente Henrique Cymerman conseguiu falar com duas reféns libertadas nos últimos meses pelo Hamas. As próprias relatam os abusos que sofreram, mas têm receio de revelar tudo porque dizem que isso pode custar a vida aos reféns ainda prisioneiros em Gaza. Sentiram a libertação como se estivessem a voltar do inferno, mas assumem que não são capazes de retomar a vida normal enquanto houver reféns em cativeiro.
As mulheres que estiveram em cativeiro depois de serem sequestradas nas suas casas a 7 de outubro de 2023, no kibutz Nir Oz, começam agora a falar sobre o que lhes foi feito, embora temam colocar em risco os seus companheiros que continuam sequestrados em Gaza. Algumas confessam que, no dia da sua libertação, foram ameaçadas diretamente: se falassem demais, os seus homens pagariam o preço.
Ilana, de 31 anos, nasceu no México e veio viver para o kibutz Nir Oz, onde trabalhava como agricultora e pasteleira.
Nessa manhã negra, separaram-na do seu namorado, Matan Zangauker, puxaram-lhe os cabelos, agrediram-na, colocaram-lhe um saco plástico na cabeça e levaram-na numa mota entre dois homens do Hamas.
"A meio do caminho foi quando começaram a tocar-me. Foi aí que perdi os sentidos. Nesse momento, o meu corpo parece que disse: 'até aqui'. Física e mentalmente, não aguentava mais. Não queria estar consciente para continuar a sofrer", conta.
Quase ao mesmo tempo, noutro ponto do kibutz, Arbel Yehud, de 29 anos, outra das reféns libertada, e o seu companheiro nos últimos cinco anos, David Cunio, viram militantes do Hamas entrar em casa e abrir fogo.
Arbel, que foi separada do namorado David e vestida como uma mulher palestiniana, esteve sequestrada sozinha durante mais de 16 meses. Estava nas mãos da Jihad Islâmica, um grupo mais pequeno, próximo do Hamas. Esconderam-na no seio de uma família, num campo de refugiados no sul de Gaza. Um dos guardas trouxe a mulher e o bebé, e pediram a Arbel que cuidasse dele.