Guerra Rússia-Ucrânia

O discurso de Zelensky na Assembleia da República: “Portugal sabe bem o que a ditadura traz”

Veja o discurso completo do Presidente ucraniano na Assembleia da República.

O discurso de Zelensky na Assembleia da República: “Portugal sabe bem o que a ditadura traz”

O Presidente ucraniano discursou esta quinta-feira na Assembleia da República. Numa mensagem curta, Zelensky destacou a violência das forças russas contra a população ucraniana, agradeceu o apoio português à Ucrânia e reforçou o apelo para travar a Rússia de destruir a democracia dos países do leste da Europa. Foi a primeira vez que um Chefe de Estado interveio por vídeo conferência no Parlamento português.

“As fotografias não demonstram tudo o que os habitantes viveram”

Zelensky começou por enumerar as mais recentes descobertas nas cidades que estiveram ocupadas pelos russos, referindo as valas comuns onde são enterrados civis e os episódios de tortura e violações perpetuada contra habitantes ucranianos.

“As fotografias não demonstram tudo o que os habitantes viveram. Os ocupantes mataram as pessoas só para se divertir e também assaltaram as suas habitações. As pessoas foram mortas, foram torturadas, foram violadas nos bunkers onde se escondiam. Eles mataram as pessoas e também dispararam sobre carros identificados como tendo crianças”, descreveu o Chefe de Estado, identificando que, só na região de Kiev, foram mortos pelo menos 1.126 ucranianos, dos quais 40 crianças.

O Presidente ucraniano acusou as forças russas de criar um “inferno” em várias regiões nos arredores de Kiev. Disse ainda que os militares ucranianos estão a lutar pela “sobrevivência” do país e da sua população.

“Estamos a lutar contra as tropas russas não apenas pela nossa independência, mas pela nossa sobrevivência, pelas nossas pessoas, pelos ucranianos, para que não sejam mortos, torturados e violados, para que não sejam capturados pela Rússia”.

Os sucessivos bombardeamentos “destroem habitações e estruturas civis que a cidades têm para sobreviver, para ter indústria alimentar, escolas, universidades e até igrejas estão a ser destruídas”, obrigando a população a fugir.

“Imaginem que toda a população de Portugal tinha de abandonar o país. A nossa população não é refugiados, eles foram obrigados temporariamente a sair e temos esperança que eles consigam voltar em segurança para a nossa Ucrânia. Esperamos que seja em breve, mas não podemos garantir quando.”

Zelensky afirma que a Rússia está a deportar a população ucraniana para zonas remotas, impedindo-os de manter contacto com a sua família. Diz mesmo que estão a ser criados “campos especiais”, onde alguns civis são mortos e as raparigas são violadas.

“Os russos fizeram de Mariupol um inferno”

Zelensky dedicou uma parte do seu discurso a Mariupol – que é “tão grande como Lisboa”. O Presidente ucraniano destaca que esta cidade “está totalmente destruída” e que “não existe uma única habitação que esteja inteira”.

“Durante mais de um mês os russos fizeram da cidade um inferno. Muitas pessoas ficaram sem água, sem meios de habitação, sem alimentação, constantemente a ser bombardeados pelas tropas russas”, conta o Chefe de Estado, acrescentando que a Rússia bombardeou a cidade “de propósito”, sabendo que havia lá pessoas e “não havia lá nenhuma fonte militar”.

O Presidente ucraniano acusa também a Rússia de estar a esconder os crimes de guerra que os militares praticam. Afirma que foram criados “crematórios móveis para poderem destruir os corpos e não pudermos ter provas”. “Este mal é igual ao que foi feito durante a II Guerra Mundial.”

“Nós pedimos coisas simples: armamento para podermos nos defender de forma força para podermos desocupar as nossas cidades das forças russas”, apelou.

Zelensky pediu ainda ao Governo português que apoie as sanções europeias contra a Rússia e que esteja do lado da Ucrânia no processo de adesão à União europeia.

“O vosso povo sabe perfeitamente o que estamos a sentir.”

À semelhança do que tem vindo a acontecer nas intervenções de Zelensky, o Presidente destacou um momento da história de Portugal para apelar ao apoio nesta guerra contra a Rússia: a Revolução dos Cravos.

“Porque é que a Rússia começou essa guerra? Este é o apenas o primeiro passo para conseguir controlar o leste da Europa, para destruir a democracia na Ucrânia”, começou por dizer Zelensky. “O vosso povo, que daqui a nada vai assinalar o aniversário da Revolução do Cravos que vos libertou da ditadura, sabe perfeitamente o que estamos a sentir.”

Para Zelensky, o objetivo da Rússia vai além da Ucrânia. O Presidente alerta que países como a Moldávia, a Geórgia e os países bálticos poderão ser os próximos alvos do regime de Putin. No entanto, acredita que “a Rússia pode ser parada, agora na Ucrânia”.

No final da intervenção, o Chefe de Estado ucraniano deixou um agradecimento ao Governo e ao povo português pelo que têm feito – seja pelo apoio nas sanções, seja pela ajuda humanitária e à população ucraniana. “Eu sei que os nossos povos se compreendem e conhecem muito bem”, acrescentou.

“Vocês estão na parte mais oeste, nós estamos a leste. Contudo as nossas visões são iguais: sabemos que regras devem existir na Europa de uma ponta à outra, os direitos e os valores devem ser iguais sem qualquer ditadura para que toda a pessoa tenha tempo para a felicidade e para a saudade”, rematou, dizendo a palavra “saudade” em português.

O discurso de Zelensky terminou com uma ovação do Parlamento português, onde apenas faltavam os deputados do PCP – que já tinham anunciado que não iriam estar presentes durante a intervenção.

Conflito Rússia-Ucrânia

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