Germano Almeida

Comentador SIC Notícias

Guerra Rússia-Ucrânia

Compreender o conflito (LX): russos escalam nos ataques a estações ferroviárias

Artigo de Germano Almeida, comentador SIC.

Compreender o conflito (LX): russos escalam nos ataques a estações ferroviárias

Cinco pontos para percebermos o que está a acontecer no Leste da Europa – e o que pode mudar na vida de todos nós.

1 – CINCO MORTOS EM ATAQUES CONTRA ESTAÇÕES FERROVIÁRIAS

Pelo menos cinco pessoas morreram e 18 ficaram feridas, esta segunda-feira, em ataques que atingiram estações ferroviárias em Zhmerynka e Kozyatyn. “O inimigo está a tentar atingir infraestruturas críticas”, disse o governador da região de Vinnytsia, num vídeo divulgado no Telegram e citado pela BBC. Os russos escalam, assim, em ataques contra estações ferroviárias, pontos estratégicos na distribuição de armas em território ucraniano.

Entretanto, Kiev diz que falhou acordo de cessar-fogo em Mariupol. “Declaro oficialmente e publicamente que, infelizmente, não há acordo sobre um corredor humanitário a partir de Azovstal hoje”, escreveu a vice-primeira-ministra ucraniana Iryna Vereshchuk na plataforma Telegram, pouco depois de a Rússia anunciar que iria cessar as hostilidades para permitir a saída dos civis. O acordo serviria para estabelecer um corredor humanitário que permitisse retirar os civis escondidos, ao lado de combatentes ucranianos, naquele complexo industrial na cidade do sudeste da Ucrânia.

Em Bryansk, território russo perto da fronteira leste da Ucrânia, surgiram relatos não confirmados de um grande incêndio num depósito de petróleo. O Ministério de Situações de Emergência da Rússia confirmou incêndio num depósito de petróleo na cidade de Bryansk, informou o canal de televisão e a agência de notícias RT apoiados pelo Kremlin, depois de publicações nas redes sociais sugeriram que houve um grande incêndio no depósito. Mariupol, já quase totalmente destruída, continua a ser bombardeada, o que obrigou novamente ao cancelamento do corredor humanitário previsto para este fim-de-semana. Em Kharkiv, a segunda maior cidade do país, Moscovo atacou áreas residenciais. A explosão sentida prova que em Kharkiv os ataques não tiveram apenas como alvo os depósitos de armas. A Rússia garante que atingiu alvos militares com mísseis de alta precisão. Mas na segunda maior cidade da Ucrânia há relatos de civis atingidos e de edifícios de habitação completamente destruídos. Pelo menos duas pessoas morreram e 14 ficaram feridas na sequência de um ataque aéreo este domingo em Kharkiv; foram lançados mais de dois mil mísseis por parte da Rússia e estão a ser investigados 7.882 crimes de guerra. A Rússia estará a planear um referendo encenado em Kherson, cidade no sul da Ucrânia que se encontra ocupada pelos russos desde março, para justificar a ocupação.

2 – “A UCRÂNIA PODE GANHAR ESTA GUERRA”

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, e o secretário de Defesa, Lloyd Austin, encontraram-se com o presidente ucraniano Volodymyr Zelenskiy na Ucrânia.

A dupla usou a primeira visita oficial dos EUA à Ucrânia desde a invasão da Rússia para anunciar o regresso gradual de diplomatas americanos ao país e a indicação de um novo embaixador. Blinken e Austin prometeram uma nova assistência no valor de 713 milhões dólares para o governo de Zelensky e países da região, onde a invasão da Rússia levantou temores de novas agressões de Moscovo. O general Austin foi claro: “A Ucrânia pode ganhar esta guerra se tiver o material certo”. Zelensky agradeceu no Twitter: “Dois meses de resistência nacional heróica da Ucrânia à agressão russa se passaram. Sou grato ao Presidente dos Estados Unidos e ao povo americano pela liderança no apoio à Ucrânia. Hoje o povo ucraniano está unido e forte, e a amizade e companheirismo entre os Estados Unidos e Ucrânia estão mais fortes do que nunca”. Austin viajará para a Alemanha, onde receberá colegas de mais de 20 nações e o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, na base aérea dos EUA em Ramstein, para discutir as necessidades de defesa da Ucrânia.

3 – “A ÚNICA FORMA DE PRESERVAR A PAZ É PREPARAR-NOS PARA A GUERRA”

Peter Dutton, ministro da Defesa da Austrália, comparou a guerra na Ucrânia com a década de 1930.

O governante australiano alertou ainda para o aumento do risco que a China representa no Pacífico. “A única maneira de preservar a paz é preparar para a guerra e ser forte como um país, não se acobardar, não ficar de joelhos e ser fraco. Essa é a realidade. Fingir que nada está a acontecer, não dizer nada, isso não é do nosso interesse de longo prazo e devemos ser muito honestos sobre isso. Temos no Presidente Putin neste momento alguém que está disposto a matar mulheres e crianças. Isso está a acontecer no ano de 2022. É uma repetição, em parte, do que aconteceu na década de 1930”.

4 – RÚSSIA EXPULSA 40 DIPLOMATAS ALEMÃES EM RESPOSTA A DECISÃO “ABERTAMENTE HOSTIL”

A Rússia anunciou a expulsão de 40 diplomatas alemães, como medida de retaliação a uma decisão semelhante tomada pela Alemanha na sequência da guerra na Ucrânia. O embaixador alemão em Moscovo, convocado para o Ministério das Relações Exteriores da Rússia, recebeu a informação de que “40 funcionários das missões diplomáticas alemãs na Rússia foram declarados ‘persona non grata’”, indicou a diplomacia russa em um comunicado de imprensa. O comunicado salienta que se trata de uma “resposta simétrica” a uma decisão semelhante e “abertamente hostil” do governo alemão, tomada a 4 de abril. Nas últimas semanas, muitos países europeus, incluindo Alemanha, França, Itália e Espanha, expulsaram dezenas de diplomatas russos. Moscovo prometeu responder a cada uma dessas medidas e, entretanto, já expulsou da Rússia dezenas de diplomatas ocidentais.

5 – VITÓRIA CLARA DE MACRON FOI ALÍVIO PARA A EUROPA E TRAVA CAMINHO EXTREMISTA E ILIBERAL

Foi um triunfo da França, da Europa, de Democracia e da Liberdade. Macron perdeu dois milhões de votos em relação à segunda volta de 2017 e Marine subiu de 34 para 42%, mas o essencial é perceber que o eleitorado francês voltou a escolher, de forma inequívoca, um Presidente da democracia liberal, profundamente europeísta, globalista e multilateralista e barrou o acesso ao Eliseu de uma candidata com apoio descarado, sobretudo financeiro, de Vladimir Putin e que, por muito que tenha agora suavizado o discurso, sempre teve um projeto nacionalista, soberanista, anti europeu e anti globalização, que projetou durante muitos anos um discurso próximo do discurso de ódio, xenófobo e anti-imigração. Eram dois mundos que estavam em confronto na segunda volta: não devemos ignorar os 42% que preferiram a opção identitária, mais fechada e egoísta, mas devemos sobretudo destacar que a opção mais aberta e virada para o mundo tenha vencido claramente. Macron soube, da primeira para a segunda volta, focar-se mais nas preocupações internas e não só na agenda externa e internacional, onde ele é mais forte.

O mais relevante é que a França sai mais forte no posicionamento de querer liderar a frente europeia na gestão da guerra e na travagem à agressão russa. A grande inquietação é a de saber quem virá em 2027: Macron nessa altura terá 49 anos e dois mandatos presidenciais cumpridos – provavelmente tentará assumir-se como o “senhor Europa”. Mas quem poderá sucedê-lo daqui a cinco anos? Com 42%, Marine parte como favorita, embora haja sempre a possibilidade de surgir uma figura que, tal como fez Macron, consiga agregar o centro, a esquerda e a direita clássica. Mas o risco está lá e será cada vez difícil travar a ameaça da extrema-direita, que é cada vez mais real.