Os incêndios que têm consumido milhares de hectares na última semana continuam a ser uma 'dor de cabeça' para a Proteção Civil. Ponte da Barca pediu ao Governo que acionasse o Mecanismo Europeu de Proteção Civil, mas o geógrafo António Bento-Gonçalves considera que, antes de essa hipótese ser levantada, há outra opção que “seria sensata” neste contexto.
Em declarações à SIC Notícias, o geógrafo e presidente da Associação Portuguesa de Geógrafos, considera que, "nesta fase talvez ainda não se justifique" o pedido do autarca social-democrata de Ponte da Barca, mas poderia fazer sentido "acionar o acordo bilateral com Espanha".
"Parece-me que seria sensato, portanto, não seria necessário um Mecanismo Europeu de Proteção Civil, mas temos acordos bilaterais com Marrocos e Espanha, por exemplo, e no caso de Ponte da Barca poderia ter sido acionado o de Espanha", afirma o especialista.
Quanto aos incêndios, que têm sido mais frequentes a norte do país, o geógrafo da Universidade do Minho destaca que "enquanto não invertermos as malfeitorias que todos os governos fizeram ao mundo rural nos últimos 100 anos (...) em que tudo se tirou às pessoas sem lhes dar qualquer tipo de compensação e sem lhes dar alternativas", este cenário será sempre mais provável. Isto devido "à taxa de crescimento de vegetação a que assistimos no inverno".
Na sua perspetiva, era necessário "apoiar seriamente e honestamente quem cuida da terra" e há várias maneiras de o fazer, nomeadamente, "reforçar os organismos que podem apoiar estas populações" para que tenham "apoio técnico e científico para poderem ter alternativas ao eucalipto ou ao abandono total dos matos".
"Enquanto tivermos a quantidade de combustível que temos, sempre que houver uma onda de calor, obviamente (...) temos potencial para situações como a de Arouca e Ponte da Barca", sublinha.
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Combate melhorou em Portugal desde 2003, mas é preciso mais
Bento-Gonçalves também aponta pontos positivos dos dispositivos de combate nos últimos anos, destacando que “se houve coisa que melhorou em Portugal desde 2003, especialmente a partir de 2003 com as catástrofes de 2003, 2005, 2013 e 2017 foi o combate”, ainda que aponte coisas a melhorar.
Questionado sobre os pedidos de especialização em incêndio florestal, Bento-Gonçalves admite que “se deveria profissionalizar pelo menos uma parte substancial destes combatentes”. Esta profissionalização permitiria que “pudessem não só combater no verão, mas também pudessem ser, na realidade, bombeiros sapadores”.
“Ou seja, [os bombeiros] trabalhariam muito no inverno para fazer uma coisa que agora permitiria um combate mais eficaz”, considera.
No entanto, e apesar desta ser uma hipótese para melhorar a situação de Portugal no que diz respeito aos incêndios, há também que olhar para dois aspetos imutáveis: o clima e a urografia.
Nesse sentido, o que se poderia mudar era “a educação das pessoas”, nomeadamente na “comunicação social, dos cientistas para comunicar melhor, dos políticos, para legislarem melhor” porque a “maioria da legislação que saiu nos últimos anos não é uma legislação que esteja apoiada em estudos científicos”. Bento-Gonçalves dá como exemplo da lei dos solos “que pode ser altamente potenciadora de mais problemas” e "não está minimamente articulada".