Inteligência Artificial

Uma luz sobre o futuro

Filósofo e historiador francês, Alexis de Tocqueville deixou na primeira metade do século XIX, na obra "Da Democracia na América", uma simples e brilhante linha de pensamento: "Quando o passado não ilumina o futuro, o espírito vive em trevas." E pode (e deve) ser este um excelente ponto de partido para uma breve reflexão sobre um tema que tem vindo a ganhar cada vez mais peso e parece estar em quase tudo o que nos rodeia: a Inteligência Artificial.

Uma luz sobre o futuro
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Antes de se perceber o que temos, seguimos até um dos pontos de partida. Estamos em 1950, cinco anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, num Mundo que se tenta recuperar das cinzas e num contexto de reorganização geopolítica.
É neste ano que o britânico Alan Turing, matemático e cientista de computação, decisivo nos bastidores da vitória dos aliados, cria um teste para determinar se um computador tem ou a não a capacidade para pensar como um Ser Humano. Ainda hoje, mais de sete décadas depois, é uma das principais referências quando se fala de Inteligência Artificial. Nada disto existe sem Turing e Turing está no meio de tudo isto.
Morreu a 7 de junho de 1954, supostamente depois de ter comido uma maçã com cianeto.
Um caderno do matemático britânico e pioneiro da ciência da computação Alan Turing, decifrador de códigos da Segunda Guerra Mundial, é exibido durante um leilão em Hong Kong
Kin Cheung

Simbiose entre o Homem e a máquina

Seis anos depois, o norte-americano Joseph C. R. Licklider assina um documento extraordinário (é preciso não esquecer o mundo em que nos encontramos nesta década, de corrida espacial, na divisão entre URSS e EUA): "Man-Computer Symbiosis". É proposta uma simbiose entre o Homem e a máquina, computadores com capacidade para tomarem decisões, equipados com mecanismos que permitissem a resolução de problemas complexos.

Licklider publicou a sua obra de referência Man Computer Symbiosis. A ideia principal era permitir aos homens e computadores cooperarem na tomada de decisões e controlarem situações complexas sem uma dependência inflexível de programas predeterminados.

É nesta década que surgem estes pequenos filmes.

Sendo que, a verdade do que existia, do que era este mundo, passava por algo assim, visto desta forma.

Já no final da década de 60, Licklider, determinante no surgimento da Internet, em 1969, publica um outro importante documento: "The Computer as a Communication Device". E esta é uma das primeiras frases: "In a few years, men will be able to communicate more effectively through a machine than face to face."

Depois da teoria, começa a chegar a prática. As primeiras ligações entre computadores; os protocolos, que permitem que diferentes máquinas consigam "dialogar"; o correio eletrónico, a World Wide Web, as Redes Sociais, e por aí fora.

O computador no bolso

O início do novo século fica marcado pelo digital, que tira da casa de cada um o computador que passa a ficar no bolso, ou na mão de todos. Ao longo destas décadas, toda a forma que vamos comunicando começa a mudar.

As redes sociais aproximam e também afastam; começam a circular milhares de milhões de conteúdos; é alimentada a desinformação a uma escala nunca antes vista; surgem novas tarefas e novas profissões, nasce uma nova geração marcada pela dimensão binária da realidade.

É com base em dois elementos que a Inteligência Artificial, ao longo de mais de 70 anos, depois de vários avanços e recuos, acaba por ter agora uma outra dimensão e começa a ganhar um novo ritmo: ao longo das últimas duas décadas foram criadas gigantes bases de dados (com grande parte do mundo a navegar no online, vão sendo registadas todas as pegadas, entre escolhas e interesses, fotos e vídeos, músicas e textos) e a velocidade dos computadores disparou.

A Inteligência Artificial já anda à nossa volta

Desde novembro de 2022 que começou a falar-se cada vez mais de Inteligência Artificial. E há aqui um motivo: o Chat GPT. Mudou tudo ainda que seja uma parte do todo. A Inteligência Artificial, em certa medida, já anda à nossa volta, na otimização de uma pesquisa ou na estrada, quando ligamos as apps que nos ajudam a fugir aos engarrafamentos. Estão nos tradutores de texto, mas também nos emails, com a capacidade de filtrar o trigo do joio, e eliminar potenciais vírus e fraudes. Mas também estão na Saúde, na Educação ou no Desporto. Estão nos modelos de linguagem que permitem resolver problemas com uma teórica maior eficácia na resposta.

Entre os perigos e os desafios está o desemprego. Ainda há dias a diretora-geral do FMI veio dizer que a Inteligência Artificial poderá afetar 40 por cento dos empregos em todo o Mundo. Sendo certo que ao longo dos últimos 200 anos, desde a Revolução Industrial, foram mais as profissões que surgiram do que aquelas que desapareceram. Ainda há agricultura e até na indústria, nestes dois importantes terrenos da economia, também aqui anda a Inteligência Artificial.

O Homem pode não ser substituído, poderá ser auxiliado. Terá, em muitos dos casos de se adaptar, sendo este um desafio enorme. Há quem já tenha comparado a atual revolução ao momento em que o Homem descobriu o fogo. Será?

Quase nenhum teórico se arrisca a dizer como será o futuro daqui a cinco ou dez ou 100 anos. Há quem defenda que os riscos têm de ser bem geridos, tendo em conta os enviesamentos de algumas das máquinas, o cuidado que é preciso ter quando tudo isto é aplicado na Justiça ou no mercado de trabalho. Há pilares que devem manter o controlo, unicamente, do Homem. E até aqui se levantam questões. E uma delas, talvez a maior de todas, passa pela consciência, se a máquina a terá, se a irá atingir.

É necessário criar um terreno assente numa legislação sólida e é também necessário perceber um ponto que se vem tornando consensual: quem ficar para trás neste campo, fica atrasado e para segundo plano na corrida por uma posição privilegiada em termos económicos. Para já, a corrida tem sido feita entre EUA e China. Para já. Quanto a receios, tudo o que implica o futuro, parece-me, inclui sempre uma dimensão de fascínio e outra de algum medo. E ainda aqui andamos.

Podemos não saber o futuro, mas conhecemos o passado. Ainda que alguns, entre os mais brilhantes, tentem adivinhar como será. Em 1982, Isaac Asimov, apresentado como o grande futurista na época, deixava uma reflexão, verdadeiramente, extraordinária:

Como será o futuro? Amanhã saberemos e assim será dia após dia. E para terminar, nada como uma sugestão com quase um século. De Fritz Lang, Metropolis:

Como será o futuro? Amanhã saberemos e assim será dia após dia. Podemos não saber o futuro, mas conhecemos o passado. Ainda que alguns, entre os mais brilhantes, tentem adivinhar como será.