Jornada Mundial da Juventude

Afinal quem lidera e quem paga o projeto das Jornadas Mundiais da Juventude?

Opinião

Afinal quem lidera e quem paga o projeto das Jornadas Mundiais da Juventude?
Sociedade de Reabilitação Urbana Lisboa Ocidental

Um evento tão importante como a vinda do Papa a Portugal, que é um chefe de Estado e uma personalidade mundial, e um encontro de pelo menos um milhão e meio de pessoas durante vários dias, grande parte estrangeiros, não pode continuar sem uma liderança clara e numa desorganização total em que cada interveniente fala e age para seu lado.

A polémica pública sobre as Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ) continua a subir de tom por causa do preço de um palco a instalar no Parque Tejo. O valor de 4, 2 milhões de euros para construir um palco por ajuste direto à Mota-Engil é de facto escandaloso, visto na perspetiva de ser um palco de um evento que dura cerca de uma semana.

Mas o escândalo maior não é o preço de um palco e se pode ser reaproveitado ou não. O aspeto mais escandaloso desta história é a evidente desorganização pública total entre todos os intervenientes neste processo e o facto de nenhum ter feito as contas aos custos totais e às receitas previstas. Cada um tomou decisões isoladamente, sem falar com os outros intervenientes, e agora que se começam a conhecer os custos de algumas parcelas do projeto, todos criticam todos e ninguém se entende.

Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, claramente lançado às feras, mostra-se muito agastado com as críticas e os reparos do Presidente da República e muito irritado com tudo e com todos. Marcelo Rebelo de Sousa exalta-se porque diz que não sabia de nada apesar de as fontes da Igreja garantirem que sim. Quem encomendou a obra, o bispo auxiliar de Lisboa Américo Aguiar, presidente da Fundação das JMJ, mostra-se surpreendido e magoado com o custo do palco. Mas de caminho vai revelando outras parcelas de um projeto que tem de ser pago pelo Estado, pela Igreja Católica e pelas autarquias envolvidas. Cada parcela é em si uma fortuna. O valor total ninguém o conhece, muito menos o coordenador nomeado pelo Governo, José Sá Fernandes, que nem sequer é informado regularmente pelos restantes intervenientes nem tem o peso político para o exigir.

Ora as JMJ são um evento que consiste na vinda a Portugal de uma personalidade de projeção mundial, o responsável máximo da Igreja Católica que é também chefe de Estado, e de mais de um milhão de pessoas que vão estar no nosso país pelo menos uma semana. Entre visitantes estrangeiros e participantes nacionais, mais de 1,5 milhões de pessoas vão estar reunidas no Parque Tejo. As receitas para a economia da região e do país no seu conjunto serão de muitas centenas de milhões de euros.

Mas se acontecer alguma coisa ao Papa ou aos participantes, seja em termos de segurança, seja em termos de saúde pública, alimentação ou questões sanitárias, o culpado não vai ser o Presidente da República, nem o bispo auxiliar de Lisboa, nem o presidente da Câmara de Lisboa, nem o de Loures, nem o coordenador nomeado pelo Governo. Quem a opinião pública vai apontar como responsável vai ser o ministro da tutela, seja da área da segurança, o da Administração Interna, seja o da Saúde, seja o das Infraestruturas, seja o da Economia ou das Finanças e, por extensão, o primeiro-ministro.

Quando o projeto das JMJ foi anunciado, ficou previsto nos vários orçamentos do Estado que seriam atribuídas isenções fiscais, e que o mesmo Estado não iria financiar diretamente o evento. Mas afinal, entre custos com a segurança pública, saúde, infraestruturas e outras alíneas, o Estado vai gastar pelo menos 36 milhões de euros, mais do que a Câmara Municipal de Lisboa, que admitiu gastar 35 milhões e muito mais que os 9 milhões a cargo da Câmara Municipal de Loures.

Os gastos totais da Fundação das JMJ, (Igreja Católica), ninguém os conhece, como admitiu o próprio Américo Aguiar.

Estimativas de gastos de 80 milhões de euros só pela Igreja Católica já estão claramente ultrapassadas, como admite o próprio bispo auxiliar de Lisboa. A somar aos 80 milhões de euros a cargo do Governo e das Câmaras Municipais de Lisboa e Loures a conta total já soma mais de 160 milhões de euros!

O representante da Igreja Católica lembrou e bem que na herança deste evento, Loures e Lisboa ficam com uma frente ribeirinha do Tejo renovada, o que é uma mais-valia para o país. Mas como sabemos a Igreja Católica não é um planeador urbanístico nem um organizador de eventos regulares ao ar livre. Os promotores de espetáculos desta natureza terão certamente muito a ganhar com o futuro espaço.

Assim sendo, importa perguntar o que diz o protocolo de colaboração entre as várias entidades envolvidas no projeto. Este protocolo define quem paga o quê e quem recebe quanto? Este protocolo indica quem lidera o projeto? Se o protocolo não prevê quem coordena e quem faz o orçamento global, então tem um erro de base que é necessário corrigir urgentemente.

Quem deve coordenar ou liderar o projeto das JMJ deve ser quem tem peso político – deve ser o ministro das Infraestruturas ou o das Finanças, com assessoria dos outros ministérios também envolvidos, Economia, Saúde, Administração Interna, Negócios Estrangeiros, e acompanhamento do primeiro-ministro, juntando à mesma mesa a Igreja Católica e os Municípios envolvidos. Não deve ser uma (ausente) ministra dos assuntos parlamentares que delegou em quem não tem peso político. E o líder do projeto tem de fazer, com urgência, uma previsão de custos e proveitos clara e objetiva (P&L, sigla inglesa de profits and losses, ou seja, receitas e gastos).

Por outras palavras, tem de ser o Governo a promover urgentemente a elaboração de um orçamento das JMJ que reúna as parcelas e os contributos das partes envolvidas.