Mundo

Opinião

Sexagenário improvável: Barack Obama, o ex-Presidente eternamente jovem

Barack Hussein Obama faz esta quarta-feira, 4 de agosto, 60 anos – mas não parece. A imagem de “new kid in the town” valeu-lhe, durante muito tempo, a fama de novato na alta política de Washington. E ele soube explorá-la convenientemente.

Sexagenário improvável: Barack Obama, o ex-Presidente eternamente jovem
Jim Young

Nascido em Honolulu, Havai (sim, mesmo, e não no Quénia, como o patético movimento “birther”, por 2010/2011, na altura empurrado pela notoriedade de um magnata apresentador de “reality show” de nome Donald Trump, insistiam em fazer crer), Barack Obama ficará para a História dos Estados Unidos como o primeiro Presidente negro – algo simplesmente notável, se olharmos para um país que continua ter setores profundamente racistas e para uma percentagem global de 12% de negros (significativo em número absoluto, mas muito atrás da percentagem de latinos, sobretudo).

É justo rotular Obama como “o primeiro Presidente negro da América”, mas ele está longe de ser apenas isso. Já tinha sido um dos primeiros negros a chegar ao Senado (o quinto em toda a história dos EUA, terceiro desde a Reconstrução).

É também um dos mais jovens presidentes da história americana (e isso faz dele, hoje que chega aos 60, uma espécie de “ex-presidente eternamente jovem”, no imaginário de parte dos americanos). Tomou posse para o primeiro mandato a 27 de janeiro de 2009, tinha apenas 47 anos e 169 dias. Só Theodore Roosevelt (42 anos, 322 dias), John F. Kennedy (43 anos, 236 dias), Bill Clinton (46 anos, 154 dias) e Ulysses Grant (46 anos, 236 dias) eram mais jovens em momento homólogo.

UM PRESIDENTE ÚNICO (E NÃO SÓ POR SER NEGRO)

Chegou à Casa Branca em período particularmente difícil: no pico da Depressão pós crise 2008, com uma Economia a derrocar, o emprego a esvair-se e um sentimento de grande perturbação na sociedade americana também pelo modo como a Guerra do Iraque não parecia ter solução e decorria de um erro em forma de grande mentira por parte da Administração Bush filho.

Obama apareceu como a jovem figura vinda de fora, sem os vícios do “business as usual”, com um discurso que juntava poder retórico, com esperança e puxava pelos melhores instintos de cada um.

Em plena crise, quando tudo parecia desmoronar-se, Barack conseguiu construir uma mensagem de construção pela positiva. Foi em 2008, passaram 13 anos – mas em alguns aspetos já parece há uma eternidade.

Depois de uma ultrapassagem épica nas primárias democratas (partiu 40 pontos atrás da superfavorita Hillary Clinton), Obama vencia a eleição geral com 53% do voto popular e 365 Grandes Eleitores (muito acima dos 270 necessários para atingir a Casa Branca).

Partiu do centro-esquerda do Partido Democrata, mas depois do duelo com Hillary soube, com especial mestria, pacificar os dois campos (o mais progressista e radical e o mais moderado e institucional), beneficiando de forte mobilização das diferentes “tendas” democratas.

Há quem garanta que, com o exercício da Presidência, foi-se moderando e posicionando cada vez mais ao centro. Há quem, no polo oposto, insista em ver nele um “perigoso socialista” que tentou, da Casa Branca, desvirtuar os princípios da sociedade capitalista por excelência.

Não me revejo em qualquer dos extremos: sempre vi em Obama um pragmático com um discurso inspirador, numa constante batalha interior entre bater-se pelas ideias fundamentais, sem medo de abdicar de alguns acessórios – mas nunca caindo nos excessos voluntaristas dos radicais.

Barack Obama é, e sempre foi, acima de tudo, um homem decente, de valores e princípios, juntando a esse dado essencial uma vestimenta de “rock star”, numa mistura de capacidade retórica com uma voz confiável.

O ÚLTIMO PRESIDENTE ANTES DA GRANDE POLARIZAÇÃO

Terá sido o último momento antes da Grande Polarização: com um discurso apelativo e inspirador, Obama não explorava uma via demagógica agressiva contra os adversários – e isso valeu-lhe fortes votações em setores independentes e mesmo tradicionalmente republicanos (venceu em redutos como a Carolina do Norte, o Indiana ou a Virgínia, até lá apontados como reservado aos republicanos).

Uma das chaves do sucesso eleitoral de Barack Obama foi o conseguir fazer a “quadratura do círculo” entre assumir a condição de negro (inelutável num país como os EUA) mas não radicalizar o discurso com isso. Só assim foi possível obter votações impressionantes em estados com mais de 90% de brancos e muito rurais, como o Iowa.

Na Casa Branca teve que dar prioridade máxima à recuperação económica. Demorou, porque a queda tinha sido brutal – mas por meados de 2010 o emprego começou a voltar aos poucos e o crescimento económico a aparecer contínuo, ainda que não galopante.

Foi o arranque da fase mais longa e positiva da história da Economia americana: entre o início da recuperação, em 2010, e a pandemia, em março de 2020 – já com Trump há três anos no poder, os EUA conheceram uma década consecutiva de crescimento e criação de emprego.

OITO ANOS DE SUCESSO QUE QUE HISTÓRIA FARÁ A JUSTIÇA DE RECONHECER

Salvou a indústria automóvel do Midwest, lançou as bases da Nova Economia, promoveu o Acordo de Paris e o Acordo Nuclear do Irão.

Foi reeleito em 2012, com menos folga que em 2008 mas ainda assim de forma clara – é o único Presidente a obter duas votações acima dos 50% do voto popular desde Reagan. Conseguiu aprovar a maior reforma da saúde em meio século, desde a Grande Sociedade do Presidente Johnson.

A História fará a devida justiça à Presidência Obama. É uma questão de tempo e de distanciamento, que a espuma destes dias agitados ainda não permite.

Correu tudo bem? Claro que não.

A oposição feroz dos republicanos levou a vários momentos de paralisação legislativa.

O ambiente mediático e político foi-se agravando e mostrou-se cada vez mais feroz e agressivo, a roçar o insultuoso (aparecendo disparates como o que acima mencionei do “birtherism”).

Barack primeiro foi reagindo com a sua lendária “coolness”, com sentido de humor. Mas atingiu o ponto de saturação e acedeu a revelar o seu certificado de nascimento, para pôr fim à palhaçada. Ainda hoje não consigo dizer se fez bem ou mal. Será que é prudente responder a quem está de má e sabe que está a caluniar?

Depois de alguns anos a limitar-se a ter 40 e poucos por cento de aprovação, abandonou a Casa Branca a 20 de janeiro de 2017 com índices de aprovação próximos dos 60%, numa grande prova de que a maioria da América não se revê na deriva populista do seu sucessor, Donald Trump.

Na hora de passar o testemunho, Obama não se conteve e profetizou que Trump seria “apenas um intervalo, uma vírgula”.

Quatro anos depois, os eleitores norte-americanos deram-lhe razão. Mais uma vez.

Jonathan Ernst

EVENTO “COVID-COMPLIANT” PARA FESTEJAR A DATA

Barack Obama assinalará a data com uma festa em Martha’s Vineyard, devidamente acautelada com um restrito protocolo COVID. Fontes familiares, citadas pela CNN, referem que o ex-Presidente revela especial preocupação com o crescimento da variante delta nos EUA.

A festa será feita em espaço exterior, no próximo fim-de-semana, e seguirá as normas impostas pelo CDC, o Centro de Prevenção e Controlo de Doenças dos EUA. Martha's Vineyard, situada em Dukes County, estado do Massachussets, é neste momento apontadada pelo CDC como tendo “transmissão moderada” de Covid-19, sendo que a recomendação para uso de máscaras mesmo pelos vacinados, em espaços fechados, está cingido a zonas com transmissão elevada.

A PÁGINA DE GERMANO ALMEIDA NA SIC NOTÍCIAS