A 28 de Outubro deste ano Mark Zuckerberg anunciava que o Facebook mudava de nome para Meta. Iria manter os nomes das suas três conhecidas apps, Facebook, Instagram e Whatsapp mas o nome Meta indicava que a empresa queria trazer a metaverse para a realidade do dia-a-dia, ajudando as pessoas a conectarem-se, a formarem comunidades e a gerar oportunidades de negócio num mundo virtual em 3D muito semelhante para o nosso cérebro com o mundo real.
Neste dia o conceito da metaverse ganhou uma notoriedade global e para, milhões de pessoas, foi a primeira vez que se tomou consciência de que não seria uma utopia nem sequer uma realidade imensamente distante.
O termo metaverse aparece em 1992 no romance de ficção científica Snow Crash onde os humanos interagem através de avatares. A metaverse será um espaço coletivo e virtual, constituído pela soma da realidade virtual com a realidade aumentada, criando toda uma nova internet. Nessa nova internet poderemos projetarmo-nos virtualmente para locais, reais ou virtuais, o que potencia coisas tão fantásticas como, para alguns, perigosas.
Podemos começar por refletir na possibilidade de nos conectarmos criando no nosso cérebro uma ideia muito próxima da presença física real. Através de óculos de realidade virtual poderemos ter a sensação de estarmos a interagir com pessoas que estão muito distantes, mas com quem gostaríamos de estar e numa forma muito mais rica, em termos de emoções e sensações, do que conseguimos hoje através de uma vídeo chamada.
Se pensarmos em pessoas que estão impossibilitadas de estar com os seus entes queridos, por questões de saúde, por motivos profissionais ou porque não têm recursos ou tempo para se encontrarem, ficamos imediatamente entusiasmados com essa possibilidade.
Ao mesmo tempo vimos, com menos simpatia, a adoção dessa forma de conviver como um substituto mais conveniente mas com grandes riscos para a forma como os seres humanos sempre interagiram.
O impacto que o teletrabalho forçado que todos protagonizámos nos trouxe deu-nos uma ideia de que interagir profissionalmente de calções e havaianas tinha tanto de cómodo como de estranhamente diferente no longo prazo. Não precisamos de ser psicólogos para entender que levar essa possibilidade ao extremo de nos projetarmos fisicamente sem ser através de nós próprios mas por avatares, tem tanto de tentador como de assustador. Poderemos ser fisicamente como quisermos e estar onde desejamos, embora não o sejamos de facto nem estejamos realmente lá.
Ao mesmo tempo iremos conviver nos locais que corresponderão aos nossos ideais de espaços, rodeados de avatares lindos e bem dispostos e todos eles a pensarem da mesma forma que nós. Nestes momentos de “convívio” poderemos estar impecáveis e apenas projetarmos as características de que mais nos orgulhamos.
O mundo fantasioso do Instagram em que todos são apenas felizes e bem dispostos e que nos deixa a ideia de que todos os outros têm vidas muito mais divertidas que as nossas, será uma pequeno desvio à realidade, quando comparado com o que se pode antecipar.
Adicionalmente a possibilidade de sermos todos parecidos uns com outros nestas novas comunidades virtuais, já não apenas nos posts, nos tweets e nas selfies, dificilmente nos acrescentará tolerância. Hoje quando viajamos e somos surpreendidos com as virtudes de diferentes culturas, que passamos a entender e a aceitar porque nos misturamos com elas, entendemos que a diferença, que primeiro estranhamos, depois nos acrescenta. Neste mundo virtual, já atualmente percebemos que não há espaço para o esforço que necessitamos de desenvolver para ouvir, ou ler, quem pensa de forma diferente de nós.
E se o mundo virtual em 3D nos parecerá o mundo real, iremos para aí transportar todas as características, boas e más, que a nossa sociedade hoje tem. A economia que se avizinha, potenciando o direito à propriedade e à posse com a tecnologia de blockchain e a certificação que os NFT permitem, será imensa.
Não é por acaso que o Facebook, agora Meta, vê aqui uma enorme oportunidade de geração de negócio. Terrenos virtuais, como já houve no distante Second Life da primeira década deste século, roupas virtuais como a que os nossos filhos já compram para as suas personagens de gaming, os concertos de música no Fortnite como os de Travis Scott ou de Marshmello que atingiu uma audiência de mais de 10 milhões de pessoas, serão uma realidade tão evidentemente poderosa quanto confusa pelo menos para quem nasceu no século XX.
A metaverse, com aquilo que conseguimos antecipar, irá oferecer um mundo de oportunidades e conveniências fantásticas mas também poderá encerrar uma alineação que poderá tornar-nos numa sociedade esquizofrénica.
É fácil acreditarmos que a atração de podermos viver vidas virtuais como as de James Bond irá vingar, mas também fica evidente que para isso vamos ter que conseguir ter poder de compra suficiente para os hotéis, os fatos e o Aston Martin, todos virtuais mas certamente caros.
Todo este poder será imenso e poderá impactar a sociedade para o bem ou para o mal. A história, infelizmente, já nos mostrou exemplos em que o poder e o conhecimento são usados a favor de uma humanidade melhor ou para lhe infligir grande males.
Quando pensamos nas controvérsias que envolvem hoje o Facebook, ficamos apreensivos com a ideia de que o interesse económico dos seus acionistas nem sempre estará alinhado com a utilização de todo este poder a favor do bem. Mas vamos acreditar que seremos capazes de aproveitar tudo o que esta nova internet irá potenciar e limitar os seus eventuais efeitos negativos.