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Quem são os judeus sefarditas e porque podem pedir nacionalidade portuguesa?

Quem são os judeus sefarditas e porque podem pedir nacionalidade portuguesa?

Em 2021, Roman Abramovich passou a ter nacionalidade portuguesa por ser judeu sefardita. Conheça a história desta comunidade que fez de Portugal a sua casa durante séculos.

O termo sefarditas ganhou notoriedade com a polémica sobre a atribuição de nacionalidade portuguesa ao oligarca russo Roman Abramovich. Em 2021, o multimilionário passou a ser luso-russo ao abrigo de uma lei que permite aos descendentes de sefarditas pedir nacionalidade portuguesa. Quem são os judeus sefarditas?

A definição pode ser simples, mas a história é complexa. Um sefardita é um descendente da comunidade de judeus que vivia na Península Ibérica, que em hebreu se diz “Sefarad”. Falam um dialeto chamado Ladino – que resulta da mistura de hebreu, português e espanhol arcaicos, árabe, entre outras línguas– e mantêm tradições ligadas aos países onde viviam.

Estas comunidades prosperaram em Portugal e Espanha durante vários séculos, até terem sido expulsas nos séculos XIV e XV. Os seus descendentes estão espalhados por vários pontos do mundo. Muitos continuam a considerar a Península Ibérica como a sua terra.

O mais antigo registo de presença de judeus na Península Ibérica data do século III, uma altura em que o império romano dominava a maior parte da Europa e norte de África. Com a queda de Roma, os judeus ficaram à mercê dos visigodos que, dependendo do líderes, ora perseguiam ora protegiam as comunidades. Com a chegada dos árabes passou a haver uma maior prosperidade para os sefarditas, uma vez que os califas peninsulares protegiam-nos e atribuíam-lhes cargos importantes.

A prosperidade manteve-se no território que entretanto foi decretado como Portugal. O conhecimento dos judeus foi útil aos primeiros Reis portugueses, que queriam conquistar as cidades dominadas pelos mouros. Também na era dos descobrimentos, esta comunidade destacou-se pelo domínio da ciência e da matemática.

A paz terminou em 1492, quando os Rei Fernando II de Aragão e a Rainha Isabel de Castela – conhecidos como os Reis Católicos – decretaram a expulsão dos judeus de Espanha. Inicialmente, procuraram refúgio em Portugal, no entanto, poucos anos depois, o Rei D. Manuel, instado pelo acordo feito aquando do casamento com a princesa Isabel de Espanha, acabou por também decretar a proibição do judaísmo em território português. As comunidades tinham duas opções: ou se convertiam ao cristianismo ou abandonavam o país – a maioria optou por deixar Portugal.

Os que optaram por ficar, decidiram aceitar a conversão, mas, em segredo, mantinham as suas tradições, crenças e práticas religiosas. A tensão entre os cristãos-novos e os cristãos – baseada na desconfiança –tornou-se mais intensa num país onde o antissemitismo não tinha grande expressão. Esta situação acabou por culminar no Massacre de Lisboa, em 1506.

A comunidade cristã celebrava as Pascoela – nome dado ao domingo depois da Páscoa – quando foi vista luz estranha que iluminava o crucifixo do Convento de São Domingos. A comunidade exaltou por estar perante uma luz milagrosa, até que um alegado cristão-novo terá dito que essa luz era apenas um reflexo de uma candeia. Essa afirmação causou revolta entre os católicos que o agrediram e pregaram a uma cruz. A situação causou revolta da população contra os cristãos-novos e, nos três dias seguintes, mais de quatro mil pessoas foram mortas.

Os sefarditas que se recusaram a converter à religião católica acabaram por ser mortos na fogueira, principalmente as mulheres que eram responsáveis pela educação das crianças na fé judaica. A inquisição perseguia e julgava os hereges. Em 1989, Mário Soares, antigo Presidente da República, pediu desculpa “em nome de Portugal” às vítimas desta perseguição; em 2004, o Papa João Paulo II pediu também desculpa pelos julgamentos da inquisição.

Apesar de D. Manuel ter dado apenas duas hipóteses, houve que seguisse por uma terceira via: um conjunto de judeus decidiu isolar-se completamente e, assim, manter as suas tradições e vivências inalteradas. A esta comunidade foi dado o nome de “marranos” – numa alusão à proibição de comer carne de porco. A cidade de Belmonte foi um dos locais escolhidos por este grupo de judeus. Durante séculos, a comunidade manteve-se em segredo e só na década de 1970 é que reconheceram perante Israel a sua religião.

A proibição de judeus na Península Ibérica fez com que os sefarditas estejam espalhados pelo mundo. São descendentes dos que fugiram para o norte de África, para o antigo império Otomano (atualmente a região da Turquia), ou dos que preferiram ir para Amesterdão ou para a América. Séculos depois, continuam a manter a ligação a Portugal e Espanha que lhes foi transmitida. Muitos guardam até as chaves das casas que habitavam antes da expulsão.

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