Cientistas nos Estados Unidos conseguiram, pela primeira vez, produzir numa reação de fusão nuclear mais energia que a que foi consumida.
Segundo o jornal britânico Financial Times, a reação produziu 2,5 megajoules de energia face aos 2,1 megajoules usados para alimentar os lasers que serviram para bombardear isótopos de hidrogénio mantidos num estado de plasma sobreaquecido com o intuito de fundi-los em hélio, libertando um neutrão e energia limpa, ou seja, livre de carbono.
A experiência, que constitui um avanço no uso da tecnologia de fusão nuclear para produzir energia limpa, barata e quase ilimitada, foi feita no Laboratório Nacional Lawrence Livermore, especialista em investigação nuclear.
Em fevereiro, investigadores europeus, incluindo portugueses, anunciaram que tinham atingido de forma sustentada um recorde de energia de fusão num teste que visava preparar a operacionalização do maior reator de fusão nuclear experimental do mundo, em construção em França.
No teste, feito em finais do ano passado e que durou cinco segundos, foi obtido um valor recorde de 59 megajoules de energia de fusão sustentada no dispositivo de fusão Joint European Torus (JET), o maior do género no mundo, a funcionar no Reino Unido.
O processo de fusão - o oposto da fissão de átomos pesados, normalmente de urânio, em que assenta a energia nuclear atual - consiste em juntar átomos de elementos leves, como o hidrogénio, a altas temperaturas, formando hélio e libertando uma enorme quantidade de energia na forma de calor. As reações de fusão são geradas por estrelas como o Sol.
A tecnologia de fissão nuclear, que gera resíduos altamente radioativos, apenas produz 10% da energia mundial, muito menos do que o carvão e o gás - combustíveis fósseis com forte impacto no ambiente.
Os Estados Unidos são um dos parceiros, a par da União Europeia, da China ou do Japão, do reator de fusão nuclear experimental em construção em França, que será a "antecâmara" da futura central energética europeia de demonstração de fusão, em estudo e com a qual se pretende testar a produção de eletricidade de uma forma limpa e segura.
Em março, em declarações à Lusa, o investigador Eduardo Alves, que participa no projeto do reator experimental, admitiu que a energia produzida por fusão nuclear poderá estar ao alcance em 40 a 50 anos.
Fusão nuclear é “um dos mais impressionantes feitos científicos do século XXI”
Esta conquista científica está a ser celebrada por membros da comunidade científica e não só. O Presidente norte-americano, Joe Biden, classificou este avanço como um bom exemplo da importância em continuar a investir na investigação.
“Vejam o que se passa no Departamento de energia e na frente nuclear. Há tantas boas notícias no horizonte”, avança a Casa Branca.
A Secretária da Energia, Jennifer Granholm, sublinhou a importância que este avanço poderá ter no futuro da energia limpa e também na defesa nacional. Considerou a ignição para a fusão nuclear como “um dos mais impressionantes feitos científicos do século XXI”.
“A ignição permite-nos replicar pela primeira vez certas condições que só se veem nas estrelas e no sol”, acrescentando que “este marco move-nos um passo significativamente mais perto da possibilidade de haver fusão nuclear carbono-zero abundante para dar energia à nossa sociedade”.
A produção de energia através da fusão nuclear está ainda longe de se tornar uma realidade, no entanto, os investigadores considera que o avanço é, por si só, bastante significativo. Como se fosse “um sinal de partida” para a corrida que já tem uma meta definida, apesar de ainda longínqua.
De acordo com o professor Dennis Whyte, diretor do Plasma Science and Fusion Center no Massachusetts Institute of Technology (MIT), a comunidade científica deveria “estar empenhada em disponibilizar sistemas de energia de fusão para enfrentar as alterações climáticas e a segurança energética.
Kim Budil, diretor do Livermore Lab, lembra que existem “muitos obstáculos significativos” para a utilização da tecnologia de fusão nuclear num contexto comercial. Os avanços têm sido alcançados recentemente fazem com que a possibilidade de ter energia oriunda da fusão nuclear a dar energias às habitações poderá ter sido antecipada em várias décadas.
A investigação para o desenvolvimento de energia através da fusão nuclear – o mesmo processo que ocorre no núcleo do Sol – já decorre há décadas, tendo sido investidos milhares de milhões de dólares neste projeto.