A família do ativista palestiniano Nizar Banat, morto sob detenção em junho de 2021 após ter sido alegadamente espancado por forças de segurança palestinianas, disse esta quinta-feira que pediu ao Tribunal Penal Internacional (TPI) para investigar a morte.
Nizar Banat, 43 anos, conhecido pelos seus vídeos nas redes sociais onde criticava a Autoridade Nacional Palestiniana e o presidente Mahmud Abbas, que acusava de corrupção, foi preso pelas forças de segurança palestinianas e encontrado morto horas mais tarde.
Na autópsia ao corpo do ativista, o médico legista Samir Abu Zarour detetou vestígios de golpes na cabeça, no peito, no pescoço, nas pernas e nas mãos.
Nizar Banat tinha uma forte presença nas redes sociais, com as suas publicações na rede social Facebook a alcançarem os cerca de 114.000 seguidores.
"Era um candidato a deputado muito popular para as eleições legislativas de 2021, canceladas arbitrariamente em abril de 2021 por Abbas", indica o documento apresentado ao TPI pelo advogado da família, Hakan Camuz.
"O Tribunal Penal Internacional é a nossa única esperança", declarou Ghassan Banat, irmão do militante, perante a instância judicial internacional com sede em Haia, nos Países Baixos.
"Chegou o momento de prestar justiça ao mártir Nizar Banat, após a Autoridade [Palestiniana] não ter conseguido garantir justiça durante mais de um ano e meio", acrescentou.
Qualquer pessoa ou grupo pode apresentar uma queixa junto do procurador do TPI para solicitar um inquérito. A instância jurisdicional internacional decide de seguida sobre a eventual abertura de um inquérito.Esta é a primeira vez que um palestiniano apresenta uma queixa contra outros palestinianos no TPI, segundo sublinhou Hakan Camuz.
"Exigimos justiça para um homem que apenas dizia a verdade ao poder", afirmou o causídico, em declarações feitas junto do edifício-sede do tribunal.
TPI abriu inquérito em 2021
O TPI abriu um inquérito em 2021 sobre presumíveis crimes nos territórios palestinianos desde a guerra de Gaza de 2014, uma iniciativa rejeitada por Israel e saudada pelos palestinianos.
Os documentos apresentados pela família ao procurador do TPI, Karim Khan, não acusam diretamente Mahmud Abbas, mas antes sete outros altos responsáveis da Autoridade Nacional Palestiniana na Cisjordânia, ocupada por Israel.
Ativista foi torturado “em oito ocasiões diferentes”
Ainda segundo os documentos, e nos anos anteriores à sua morte, o ativista palestiniano "foi preso e torturado pela Autoridade Nacional Palestiniana em oito ocasiões diferentes", assinalando-se ainda que durante os meses que antecederam o seu assassinato, ele e a sua família receberam ameaças e ataques, e a sua casa foi atacada com balas e granadas.
"A Autoridade Nacional Palestiniana] sempre foi considerada como uma proteção contra os crimes de Israel dirigidos aos palestinianos. Lamentavelmente, sob a liderança de Mahmud Abbas, a Autoridade Palestiniana converteu-se em outro opressor do povo palestiniano, tanto como Israel", acrescentou o advogado da família.
Após o anúncio da morte do ativista, decorreram diversas manifestações que exigiam a demissão de Abbas e justiça para o opositor interno, em particular na cidade de Ramallah junto à sede da Autoridade Nacional Palestiniana, que por vezes degeneraram em confrontos com a polícia.
Um tribunal local indiciou 14 membros das forças de segurança palestinianas que foram libertados sobre caução em meados de 2022, apesar dos protestos da família do ativista.
"Quando vimos que essas 14 pessoas foram libertadas sem sabermos o motivo, compreendemos que o regime da Autoridade Palestiniana, a sua polícia, os seus serviços de segurança, tinham mais autoridade que o tribunal, que estavam acima da justiça", assinalou Ghassan Banat.
"Por isso, decidimos trazer a causa para a arena internacional", precisou.
Numa sondagem realizada em 2021 pelo Centro de Pesquisa Palestiniano sobre a Política e as Sondagens (PCPSR), o principal organismo do género nos territórios palestinianos, 63% dos palestinianos questionados consideraram a morte de Nizar Banat "uma medida deliberada ordenada pelos ramos político e securitário" da Autoridade Nacional Palestiniana.
Banat “desafiava Mahmud Khan”
"[Nizar Banat] desafiava Mahmud Abbas e dizia a verdade sobre a situação real da Autoridade Palestiniana, um regime corrupto e autoritário (...) foi por isso que Mahmud Abbas ordenou a sua morte", denunciou o irmão do ativista, também em declarações junto da sede do TPI.
O procurador do TPI, o britânico Karim Khan, planeia visitar os territórios palestinianos em 2023, no âmbito da investigação sobre alegados crimes de guerra na Palestina cometidos pelas forças israelitas e por membros do movimento islamita Hamas e outros grupos armados, apesar de Israel não ter ratificado o estatuto de Roma, fundador do TPI.
Recentemente, a estação televisiva Al Jazeera submeteu perante o TPI outro 'dossiê' no qual acusa o exército israelita de ter morto de forma deliberada uma repórter do canal, Shireen Abu Akleh, em maio passado, na Cisjordânia ocupada.