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"Sou quem toma as decisões difíceis": português comanda a sonda que vai a Júpiter

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Equipa da ESA na sala de controlo em Darmstadt, Alemanha. Bruno Sousa é o quarto a contar da esquerda.
Equipa da ESA na sala de controlo em Darmstadt, Alemanha. Bruno Sousa é o quarto a contar da esquerda.
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Entrevista ao engenheiro aerospacial Bruno Sousa que está aos comandos da missão JUICE da Agência Espacial Europeia lançada esta sexta-feira.

À segunda tentativa, a Agência Espacial Europeia (ESA) lançou com sucesso a sonda que irá estudar Júpiter e três das suas maiores luas - Ganimedes, Calisto e Europa, com a ambiciosa tarefa de descobrir se albergam condições para a existência de vida.

A missão JUICE - Jupiter Icy Moons Explorer, Explorador das Luas Geladas de Júpiter - conta com projetos de várias empresas, cientistas e especialistas portugueses e tem na sala de controlo de missões um português como diretor de operações de voo.

Numa entrevista por e-mail a poucas horas da hora marcada para o primeiro lançamento, o engenheiro aerospacial Bruno Sousa explicou o seu papel nesta missão.

“Tenho de garantir o sucesso da missão”

Bruno Sousa é um dos diretores de voo desta missão, responsável por assegurar que tudo corre conforme planeado, assiste ao lançamento e garante que o engenho entrará depois “na fase de cruzeiro”, em suma, é "quem tem de tomar as decisões difíceis”.

“O meu trabalho como um dos diretores de voo consiste em coordenar as várias equipas envolvidas na operação, quando há problemas guiar os peritos técnicos a encontrar o curso de ação correto e tomar as decisões difíceis, além de garantir que os recursos necessários estão disponíveis para garantir o sucesso da missão”, explicou à SIC Notícias.

No controlo de missão da ESA em Darmstadt, Alemanha, a equipa que levará JUICE até Júpiter. Bruno Sousa é o primeiro à esquerda na primeira fila.
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Está na ESA há já 20 anos e a experiência acumulada dá-lhe a “bagagem” necessária para liderar e motivar as equipas.

“O meu trabalho também é liderar as pessoas na equipa, ajudá-las e motivá-las quando precisam, mantê-las focadas nas tarefas e evitar que se cometam erros”.

E foco é o que será preciso para seguir todos os passos da sonda que tem uma missão ambiciosa e uma longa viagem pela frente. Uma viagem de 8 anos até ao maior planeta do sistema solar em busca de sinais de vida nas geladas luas do gigante gasoso.

“O principal objectivo é estudar Júpiter fazendo observações detalhadas do gigante gasoso e das três luas que se sabe terem oceanos. A ideia é caracterizar as luas como objectos planetários mas também como possíveis habitats que podem acolher vida. Vai também estudar o complexo ambiente de Júpiter em profundidade para caracterizar como arquétipo para se saber como se comportam gigantes gasosos pelo Universo a fora”.

“Luas-oceanos” com mais água que a Terra

Desde a missão da sonda da NASA Galileo (1995-2003), passando pelas observações do telescópio espacial Hubble que já se sabe que há água em estado líquido (elemento essencial para a vida) em três das luas de Júpiter. Porquê ir agora?

“Há uma janela de oportunidade de fazer observações complementares com outras duas missões americanas: Juno, que já se encontra em órbita de Júpiter, e Europa Clipper que vai visitar a lua Europa mais de perto”.

A presença de água nas luas de Júpiter foi uma grande descoberta feita com dados da sonda Galileo que chegou a Júpiter em 1995 e detetou a presença de gigantescos oceanos líquidos sob as camadas geladas de três luas: Calisto, Europa e Ganimedes. A quarta grande Lua de Júpiter, Io, é vulcânica.

Em 2013, o Telescópio Espacial Hubble descobriu géiseres na Lua Europa, ao pé dos quais existiriam sais, em particular carbonatos, e subsequentes análises aos dados do Hubble revelaram a existência de vapor de água em Europa e em Ganimedes.

Estas características sugerem que existe um ambiente estável, outra condição para que surja vida, mas mais ainda, que tal vida subsista e que ainda permaneça.

“JUICE vai focar-se mais nas luas Calisto e Ganimedes. Estas luas com oceanos que contêm mais água líquida do que na Terra, e Ganimedes em particular com o seu campo magnético – semelhante ao da Terra – são os melhores candidatos a conterem habitats viáveis à existência de vida – e essa é uma das perguntas fundamentais que se quer responder”.

De Vénus a Júpiter em 20 anos, passando por Mercúrio e pelo Sol

Bruno Sousa chegou à ESA em 2003, como consultor com a firma Deimos Engenharia, uma das empresas portuguesas que participam na missão JUICE. Fabricaram também componentes para o satélite a LusoSpace, Active Space Technologies, e FHP - Frezite High Performance e o LIP - Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas.

“A minha primeira missão foi a Vénus Express em 2005, fiz também parte da equipa de controlo no lançamento e na chegada a Vénus, e trabalhei 7 anos nessa missão. Depois de uma passagem pelo Solar Orbiter, tornei-me chefe de operações da missão Cluster (que estuda a magnetosfera terrestre), e atualmente a minha unidade de operações é responsável por operar Cluster, Solar Orbiter (estuda o Sol de bem perto) e Bepi Colombo (que vai a caminho de Mercúrio)”.

Onde é que o Bruno vai estar no lançamento e como vai acompanhar a missão? Depois do lançamento continua a acompanhar a sonda?

“Vou estar na sala de controlo da JUICE em Darmstadt, na Alemanha, a reportar em direto para a ESA TV os eventos principais do lançamento. Logo que a sonda tenha desdobrado os painéis solares vou para casa dormir para voltar à meia-noite para o meu segundo turno como diretor de voo, que vai durar até às 10 da manhã do dia seguinte”.

E serão muitos ainda os turnos até que a sonda europeia chegue sequer próximo do seu objetivo.

Após uma viagem de oito anos, chegará junto de Júpiter, de Europa, Ganimedes e Calisto em julho de 2031, fará 35 voos de aproximação às luas geladas e alcançará Ganimedes em dezembro de 2034.

Se tudo correr bem, será a primeira vez que um satélite artificial orbitará uma lua de outro planeta.

Os primeiros dados científicas deverão chegar à Terra em 2032 e a missão tem fim previsto em setembro de 2035, quando a sonda se despenhar na superfície de Ganimedes.

Banda sonora para acompanhar uma viagem até ao maior planeta do Sistema Solar.

[Artigo atualizado às 13:16 de 14 de abril, após o lançamento bem sucedido da missão JUICE]

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