Todos os dias, cinco pontos para percebermos o que está a acontecer no Leste da Europa – e o que pode mudar na vida de todos nós.
1 – MUDANÇA DRAMÁTICA. É o fim dos acordos de Minsk e é, certamente, um momento de escalada dramática no risco de guerra em maior dimensão entre Rússia e Ucrânia. É uma violação grosseira do Direito Internacional – porque a Ucrânia é um país com fronteiras definidas e a sua integridade territorial e a soberania das suas escolhas devem ser preservadas e respeitadas. E MOSTRA, claramente, que o objetivo de Putin em toda esta crise é o de projetar ambições imperiais, recuperar e restaurar o espaço pós-soviético, exibido, com todas as letras, quando há horas elaborou uma reescrita da História, em tom de aula, ao ressuscitar o conceito de Novorossya – NOVA Rússia, um espaço pós-soviético onde Putin inclui o Donbass que está neste preciso momento a ocupar; a Crimeia que anexou em 2014 e outros territórios do sul da Ucrânia.
2 – UM ATAQUE À UCRÂNIA COMO ELA EXISTIA. Embora para já se tenha ficado, nos atos, pelo Donbass, no fundo o que o Presidente Putin quis dizer foi que entende a Ucrânia como um espaço natural da Rússia e não a vê com uma soberania integral à parte do espaço russo. E isso, é preciso explicar, vai ao encontro do que escreveu recentemente num ensaio em que assumiu: “Estou cada vez mais convencido de que a Ucrânia não precisa do Donbass”. Putin pôs em causa a Ucrânia como ela até agora existiu. Considerou que a Ucrânia moderna só existe em terras russas. E isso tem, no cenário atual, consequências tremendas.
3 – A CONDENAÇÃO INTERNACIONAL. A Rússia foi fortemente condenada no Conselho de Segurança da ONU, após Putin ordenar o avanço de tropas no leste da Ucrânia. O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, apelou a fortes sanções como a única maneira de impedir o escalar da invasão russa. Embaixador da Ucrânia na ONU: Toda a ONU está “sob ataque” pelas ações da Rússia: “Hoje todos os membros das Nações Unidas estão sob ataque”, disse Sergiy Kyslytsya. “As fronteiras internacionalmente reconhecidas da Ucrânia foram e permanecerão imutáveis, independentemente de quaisquer ações e declarações da federação russa.
Zelensky ontem aos ucranianos: “Não devemos nada a ninguém e não daremos nada a ninguém. Estamos na nossa terra, não temos medo de nada e de ninguém, não devemos nada a ninguém e não vamos dar nada a ninguém. Estamos confiantes”. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, conversou com o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, por telefone, antes da viagem de Kuleba a Washington, DC, esta terça-feira. Na ligação, Blinken “observou nossa resposta rápida” à decisão da Rússia de reconhecer as regiões pró-Moscovo no leste da Ucrânia, disse um comunicado do porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price. Kuleba reúne-se com Blinken em Washington e depois segue para Nova Iorque amanhã, quarta, para discursar na ONU, de acordo com o site oficial do ministro das Relações Exteriores ucraniano.
A Estónia e a Letónia condenaram o movimento da Rússia de reconhecer as regiões pró-Moscovo da Ucrânia. “Moscovo não leva a diplomacia a sério”, considerou o presidente da Estónia, Alar Karis. O Ministério das Relações Exteriores de Taiwan expressou “profundo pesar e condenação” à Rússia. A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Joanne Ou, disse que as ações da Rússia violaram a Carta das Nações Unidas e prejudicaram os esforços da comunidade internacional para buscar uma solução pacífica para a crise.
4 – O QUE RÚSSIA E UCRÂNIA QUEREM? A Rússia de Putin quer a garantia que a Ucrânia não entra na NATO; mas quer mais – pretende ter garantias de que a expansão da NATO a leste é travada; pretende o congelamento da infraestrutura militar nas antigas repúblicas da URSS, não só na Ucrânia; a retirada dos mísseis de médio e longo alcance na Europa e ainda o fim da ajuda militar à Ucrânia. Numa análise mais alargada, Putin desejará, ao provocar instabilidade e minar a confiança nas instituições de Kiev, uma possível mudança política para um governo pró-russo na Ucrânia. Já a Ucrânia tem razões objetivas para se sentir ameaçada na sua soberania e integridade territoriais, não só de agora mas desde 2014; Kiev fez o pedido de entrada na NATO já em 2008; a Ucrânia tem desde 2019 inscrita na sua Constituição a entrada na NATO como “objetivo” e “caminho”. Sucede que essa não é uma decisão da Ucrânia – terá que ser uma proposta aceite por unanimidade pelos membros da NATO. Para já, a Ucrânia será vista pela aliança atlântica, no máximo, como uma parceira.
5 – E OS EUA? Uma guerra em larga escala seria desastrosa: Biden não vai querer americanos mortos na Europa; por isso no máximo reforça ajuda militar e financeira à Ucrânia e acentuará sanções à Rússia. Mas a guerra na Europa seria o fim da estratégia de política externa de Biden, que se foca quase em absoluto na contenção da China. Um regresso à frente leste da Europa mudaria tudo em Washington.