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Será a vaga de calor no sul da Ásia mais um sinal das alterações climáticas?

O World Weather Attribution concluiu que se o aquecimento global aumentar, as vagas de calor como a registada na Índia e no Paquistão podem vir a ocorrer uma vez a cada cinco anos. Veja o vídeo.

Será a vaga de calor no sul da Ásia mais um sinal das alterações climáticas?

A devastadora onda de calor que atingiu a Índia e o Paquistão nos últimos meses terá sido causada pelas alterações climáticas, referiu esta segunda-feira um grupo internacional de cientistas, que vê este fenómeno a aumentar no futuro. O World Weather Attribution analisou dados climáticos dos últimos 70 anos desta região do globo e concluiu que, se o aquecimento global aumentar para 2 graus centigrados, estas vagas de calor podem vir a ocorrer com mais frequência. Os especialistas admitem que possam ocorrer até uma vez a cada cinco anos.

De acordo com o World Weather Attribution, uma onda de calor como esta, que dura muito tempo e afeta uma área geográfica enorme, ainda é rara, ou seja, um evento único num século. No entanto, o aquecimento de 1,2 graus centígrados à escala global desde os níveis pré-industriais, devido às alterações climáticas causadas pelo homem, tornou este fenómeno 30 vezes mais provável.

Se o aquecimento global aumentar para 2 graus centígrados, estas vagas de calor podem ocorrer duas vezes num século, ou até uma vez a cada cinco anos, alertou Arpita Mondal, cientista do clima do Instituto Indiano de Tecnologia em Mumbai e que participou no estudo.

“Este é um sinal do que está para acontecer”, sublinhou Arpita Mondal.

De resto, estes resultados são conservadores, depois do United Kingdom Met Office (Met Office) ter indicado, na semana passada, que a onda de calor foi 100 vezes mais provável devido às alterações climáticas e que estas temperaturas deverão correr a cada três anos.

A análise do World Weather Attribution é diferente, pois tenta calcular como aspetos específicos da onda de calor, como a duração e a região impactada, foram tornados mais prováveis ​​pelo aquecimento global.

“O resultado real provavelmente está em algum lugar entre o nosso e o resultado do Met Office (Reino Unido) de quanto as mudanças climáticas aumentaram este evento”, explicou Friederike Otto, cientista do Imperial College de Londres, que também fez parte do estudo.

Mais concreta, porém, é a devastação que a onda de calor causou. A Índia teve o março mais quente desde que há registos (1901) e abril foi o mais quente já registado no Paquistão e em partes da Índia.

Os efeitos foram em cascata e generalizados: um glaciar ‘rebentou’ no Paquistão, causando inundações e o calor precoce queimou as colheitas de trigo na Índia, forçando o país a proibir as exportações para países que sofrem com a escassez de alimentos devido à invasão russa da Ucrânia.

Também foi registado um aumento precoce na necessidade de eletricidade na Índia, que teve efeitos nas reservas de carvão, resultando numa grave escassez de energia que afetou milhões.

Há ainda o impacto na saúde humana, sendo que pelo menos 90 pessoas morreram nos dois países devido a este fenómeno, embora o registo de óbitos seja insuficiente naquelas regiões e o número real possa ser superior.

O sul da Ásia é o mais afetado pelo stress térmico, de acordo com uma análise da agência Associated Press (AP) de um conjunto de dados publicado pela escola climática da Universidade de Columbia, Estados Unidos.

Só a Índia abriga mais de um terço da população mundial que vive em áreas onde o calor extremo está a aumentar.

Especialistas alertam para a necessidade de adptação aos impactos nocivos das alterações climáticas

Os especialistas são unânimes a alertar que a onda de calor ressalta a necessidade do mundo de não apenas combater as alterações climáticas, reduzindo as emissões de gases de efeito de estufa, mas também de se adaptar aos seus impactos nocivos o mais rápido possível.

Crianças e idosos estão mais expostos a estes fenómenos, mas o seu impacto também é muito maior para os pobres que podem não ter acesso a refrigeração ou água e muitas vezes vivem em favelas lotadas que são mais quentes do que bairros mais ricos e arborizados.

Algumas cidades indianas estão a tentar encontrar soluções. Ahmedabad (Índia ocidental) foi a primeira do sul da Ásia a projetar um plano de ondas de calor para a sua população, superior a 8,4 milhões em 2013.

O plano inclui um sistema de alerta precoce que diz aos profissionais de saúde e residentes para se prepararem para as ondas de calor, capacita as administrações a manter os parques abertos para que as pessoas possam estar à sombra e fornece informações às escolas para que possam ajustar os seus horários.

A cidade também tem procurado ‘esfriar’ os telhados, ao experimentar vários materiais que absorvem o calor de forma diferente.

No entanto, a maioria das cidades indianas está menos preparada para as ondas de calor e o governo federal da Índia está atualmente a trabalhar com 130 cidades e 23 estados mais propensos ao fenómeno, para desenvolver planos semelhantes.

Com Lusa