Opinião

Um bota-abaixo épico, com direito a ironia refinada e a sarcasmo de algibeira

Aceitei o convite do Luís Aguilar para participar no "Ontem já era Tarde", podcast em vídeo e áudio que estreou há pouco tempo no site da SIC Notícias. Confesso que tinha uma pequena esperança que desta vez (só desta vez) houvesse alguma sensibilidade em relação ao tema, porque a conversa foi de facto genuína.

Um bota-abaixo épico, com direito a ironia refinada e a sarcasmo de algibeira
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Confesso que a conversa foi agradável e desprendida. Falámos sobre a minha carreira e sobre jogos memoráveis (pelas melhores e piores razões). Falámos de histórias divertidas e de histórias perigosas. Falámos de jogadores, treinadores, viagens e aventuras. No fundo, falámos de tudo um pouco, sempre com a leveza e descontração de quem recua no tempo e recorda uma vida cheia de momentos inesquecíveis.

Mas o que me leva a chamar este assunto ao artigo de hoje não é a promoção do programa, mas a generalidade dos comentários a que deu azo quando foi partilhado nas redes sociais do canal.

Confesso que tinha uma pequena esperança que desta vez (só desta vez) houvesse alguma sensibilidade em relação ao tema, porque a conversa foi de facto genuína. Pensei que os assuntos que se discutiram pudessem ajudar a limpar um pouco o ambiente e a contribuir para um discurso mais arejado em relação a árbitros e arbitragens.

Esqueçam lá isso.

Quase tudo o que li ali foi ofensivo e insultuoso. Estamos a falar de centenas de comentários, cada um pior que o outro. Terá havido um ou dois que focaram no teor da conversa em si, mas apenas isso. Tudo o resto foi um bota-abaixo épico, com direito a ironia refinada e a sarcasmo de algibeira. Penáltis marcados há vinte anos, lances discutíveis de há dez, tudo amplificado à memória parcial. Tudo distorcido ou carregado de exagero, mentira e ódio.

Mas o que é que se passa com esta gente? Que propensão é esta para a violência gratuita?

O futebol perturba algumas pessoas e todos sabemos disso, mas há quem seja francamente doente e essas topam-se bem: novos ou velhos, com ou sem estudos, da cidade ou da aldeia, do litoral ou interior... se mete bola e clubismo, é uma miséria que dá dó.

É surreal o que certas pessoas conseguem dizer publicamente, quando escondidas atrás de um teclado. Isso acontece porque sabem que dificilmente pagarão o preço que pagariam se o fizessem olhos nos olhos, com gente à volta.

Com o tempo - são 25 anos disto, em 50 de vida - aprendi a perceber que nem sempre é azia ou frustração pontual. Nem sempre é uma reação infeliz com arrependimento imediato. Pelo contrário. É quase sempre má-fé e má educação.

Alguém que se dá ao trabalho de escrever tantas barbaridades apenas para saciar a sua dor, tem que ser muito infeliz e sofrer de problemas de caráter.

Mas é como é. Deixemo-nos de romantismos. Esta é a representação geral das pessoas, das suas mentes tacanhas e almas perturbadas.

Podemos ficar aqui a chorar, estupefactos com a capacidade de cada um ser marginal virtual ou podemos continuar a trabalhar no sentido de evitar que as próximas gerações sigam as pisadas de quem lhes deu a vida.

Eu escolho a segunda hipótese, pois claro.

Venha o próximo "podcast".


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