Opinião

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A ideia mais disparatada (e perigosa) que já ouvi sobre árbitros

Voltemos ao mesmo: a vontade de ceder à mudança, sabe-se lá devido a que tipo de pressões ou influências, leva algumas pessoas a posições radicais, que mais não são do que verdadeiros tiros nos pés.

A ideia mais disparatada (e perigosa) que já ouvi sobre árbitros
Ben Stansall

A vontade de provar que somos capazes de inovar, de cortar com o passado e recomeçar do zero pode levar-nos a excessos que nem sempre beneficiam aquilo que, na verdade, queremos construir.

Quando a ânsia de mudar é demasiada, as emoções tendem a tomar conta da razão e raramente se consegue produzir mais e melhor do que o foi feito até então.
A grande lição a retirar aqui parece-me clara: nem sempre o legado que herdámos é mau. Nem sempre o que está feito é para jogar fora. Às vezes é bom e só precisa de ajuste, de novas dinâmicas e de alguma pessoalização.
Quem não tiver visão e inteligência para perceber isso, dificilmente criará algo de fantástico.
Vem esta reflexão a propósito de notícias recentes que davam conta que a Federação Ucraniana de Futebol - por proposta de Kateryna Monzul, a Presidente da sua Comissão de Arbitragem - decidiu testar a implementação de uma medida radical na arbitragem profissional do seu país.
Em breve e antes do início dos jogos, os árbitros serão sujeitos a testes de polígrafo, vulgo detetores de mentiras. A ideia é "diminuir o número de reclamações e evitar focos de corrupção desportiva".
Tenho que vos confessar, para mim esta é provavelmente a ideia mais disparatada, para não dizer ridícula, que já ouvi falar em relação a árbitros e arbitragem.
Mais: é também uma ideia extremamente perigosa, porque faz recair sobre os juízes de topo ucranianos a suspeita de que, por defeito, são desonestos, cabendo-lhes provar o contrário.
Mesmo contextualizando a questão - a Ucrânia é um país em guerra, sob forte pressão e há muito que vê neste tipo de testes uma forma fidedigna, quase comum, de apurar a verdade -, a verdade é que a mensagem que isto passa para o exterior é péssima, porque é instigadora de desconfianças. Espero sinceramente que UEFA e FIFA não permitam que esta loucura avance.
Quanto a mim, a solução é muito simples: se a estrutura da arbitragem ucraniana não confia na honestidade dos seus árbitros, que os suspenda de imediato, inicie inquérito rigoroso, chegue a conclusões rápidas e tome decisões em conformidade. Além disso, que entregue o(s) caso(s) suspeito(s) à justiça para que esta, apesar dos seus atuais constrangimentos, faça o seu trabalho.
Mas as propostas irreverentes não ficaram por aí: foi também aprovada a designação dos árbitros por sorteio, ou seja, tal como noutros tempos por cá, os árbitros passarão a ser escolhidos... ao acaso.
O argumento? Privilegiar a integridade do processo (eu acho que é apenas o reconhecimento de que não se confia em quem nomeia) e igualdade: todos os que estão no topo estão aptos de igual modo.
Ora esta é a maior de todas as mentiras e só quem não gere pessoas e equipas é que é capaz de a subscrever. Isso seria o mesmo que dizer que um plantel de 24 ou 25 jogadores tem todo a mesma qualidade, portanto mais valia sortear o onze inicial do que confiar no treinador para o fazer.
Tal como é óbvio que o "detetor de mentiras" é uma aberração sem paralelo, também é óbvio que os árbitros não são todos iguais. Têm idades, perfis, personalidades, experiências, momentos de forma e competências totalmente distintas.
Cabe a quem nomeia - e essa tem que ser uma pessoa/equipa em quem se confie em pleno - a escolha daqueles que, a cada instante, são os mais aptos para determinado jogo, em função das suas caraterísticas, histórico, importância, etc.
Esvaziar essa vertente é tentar tratar como igual o que humana e naturalmente é desigual.
Voltemos ao mesmo: a vontade de ceder à mudança, sabe-se lá devido a que tipo de pressões ou influências, leva algumas pessoas a posições radicais, que mais não são do que verdadeiros tiros nos pés.
Que a sensatez prevaleça na mente dessas pessoas de bem, que de facto vivem um momento terrível na sua história. Um momento que conta com a solidariedade de qualquer pessoa equilibrada, íntegra e bondosa.