Ricardo Araújo Pereira pôs o dedo na ferida: durante os últimos dois anos usámos e abusámos da palavra “guerra” como metáfora para o combate à pandemia e agora que a “guerra” passou de fática a factual… não temos palavra(s).
Perante as imagens que nos chegam todos os dias (em bom rigor, a todos os instantes – o que é uma diferença assinalável em relação à forma como outras “guerras” recentes nos chegaram) do que se passa nas ruas de cidades cuja existência desconhecíamos até aqui (Kharkiv, Lviv, Irpin, Mariupol, Mykolaiv, Sumy) ficamos efetivamente sem palavras: se era “guerra” o que o mundo no seu todo travava contra um vírus desconhecido, o que chamar à inimaginável, desumana, estúpida e porém racional invasão da Ucrânia pela Rússia? E essa não é a única palavra que nos falta.
O que dizer de um país europeu que, em pleno século XXI, rasga tratados, viola as mais elementares regras do Direito Internacional e entra por outro país europeu adentro, matando civis, destruindo cidades, pondo fim numa hora a décadas de paz num continente?
O que pensar de uma União Europeia que, ainda que por uma vez una, se revela mais uma vez falha na resposta (e, sobretudo, na capacidade de antecipação) a uma ofensiva que desafia os valores fundadores dessa mesma União?
E aqui chegados, ao inimaginável cenário em que “Russians” (a canção de Sting de 1985 sobre o significado para a humanidade de uma guerra nuclear) volta a fazer sentido, com que armas se pode/deve enfrentar um homem que se perpetua no poder sem olhar a meios e que, fria e calculadamente, usa a nação vizinha como montra das suas ambições de poder e da sua total ausência de escrúpulos e princípios para as concretizar? Não consigo mesmo encontrar palavras.