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"O ódio racial está muito mais visível online", diz fundadora do Afrolink

A fundadora da plataforma digital Afrolink, Paula Cardoso, acusa as pessoas que acreditam poder dizer tudo ao abrigo da liberdade de expressão de minimizarem o impacto desse discurso de ódio nos outros.

Paula Cardoso Afrolink
Paula Cardoso Afrolink
Reprodução/Instagram Afrolink.pt

A criadora do projeto Afrolink, um site onde se encontram profissionais africanos e afrodescendentes residentes em Portugal, confessa que nunca foi alvo de discurso de ódio, mas sofre de racismo desde que se lembra e isso “tem um impacto tremendo a todos os níveis”.

“Por mais que nós estejamos preparados para lidar com estas formas de violência, não deixa de doer e não deixa de ter impacto em nós, porque somos seres humanos. O trauma tem este poder”, conta à agência Lusa.

Paula Cardoso salienta, em entrevista à Lusa, que “o ódio racial está muito mais visível online”, sobretudo quando são “partilhadas notícias que envolvem pessoas negras, questões raciais, ou contextos migratórios”, mas não descarta a ideia que o discurso do ódio presencial também existe, apesar de acontecer de forma mais subtil.

“Já ouvi muitas vezes dizerem que não há racismo em Portugal e eu nem consigo entrar em diálogo com essas pessoas que negam a minha existência, porque é disso que se trata”, menciona, revoltada. “Se uma pessoa me diz que não há racismo neste país, está a mudar tudo aquilo que tem sido a minha vivência, uma vivência marcada justamente pela existência do racismo”, lamenta a ativista, lembrando todos os episódios negativos que já vivenciou desde que veio de Moçambique aos três anos de idade.

Nos últimos dois anos já denunciou várias situações de racismo à Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR), no entanto, diz após as queixas, recebeu o comprovativo, mas nunca teve qualquer tipo de resposta.

Contactada pela agência Lusa, a CICDR, que funciona junto do Alto Comissariado para as Migrações, explica que “tem por missão prevenir e combater a discriminação racial e sancionar a prática de atos discriminatórios em razão da origem racial e étnica, cor, nacionalidade, ascendência e território de origem, em matéria de acesso a bens e serviços, educação, cultura, saúde, apoios sociais e habitação”.

Segundo o último relatório anual divulgado pela CICDR, em 2021 receberam 408 participações, queixas e denúncias, das quais 96 referiam-se a situações que aconteceram nos meios de comunicação social e na internet, um valor que representa quase um quarto das situações reportadas.

Paula Cardoso acredita que é necessário existirem “medidas de reparação”, mas para isso “tem de existir o reconhecimento de que estas experiências de racismo são violência, e isso vem com a educação”, conclui.