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Morte de criança em Setúbal: Jéssica “viveu tão pouco” que demora no processo de proteção “foi muito tempo para ela”

Ana Rita Duarte Campos, advogada de Direito Penal, em entrevista na SIC Notícias.

Morte de criança em Setúbal: Jéssica “viveu tão pouco” que demora no processo de proteção “foi muito tempo para ela”
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A advogada de Direito Penal, Ana Rita Duarte Campos, defende que “não podemos lamentar o desaparecimento de uma criança e não olhar para aquilo” que tem de ser mudado nos sistemas de proteção das crianças.

“O tempo das crianças, infelizmente, é um tempo que, para elas, mesmo as mais pequeninas, como a Jéssica, é muito longo. Mas é muito curto para as respostas que temos”, começou por dizer a advogada, na SIC Notícias, referindo-se aos tempos de resposta.

“Eu espero que haja uma investigação e que haja uma resposta. Não traz a Jéssica de volta, não apaga o que se passou, mas pode ajudar-nos a melhorar enquanto sociedade“, continuou.

Usando as palavras de Luís Neves, diretor nacional da Polícia Judiciária, Ana Rita Campos disse que a sociedade tem de perceber que “todas as vidas humanas valem o mesmo”.

“Nós e o Estado temos uma obrigação de proteger as crianças que têm o infortúnio de vir ao mundo em circunstâncias que permitem desfechos destes”, disse Ana Rita Campos.

Relativamente ao facto de Jéssica estar sinalizada pela CPCJ desde o primeiro mês de vida, a advogada considera “inadmissível”.

“Tem de se perceber porque é que não houve uma decisão, fosse ela qual fosse, ao longo destes três anos”, atirou.

“Os processos de promoção e proteção são urgentes, passam à frente do expediente de qualquer tribunal”, explicou, acrescentado que “até podia ter havido uma decisão que mantivesse a criança com a mãe”, mas que esta tinha de ser fundamentada e que “tinha de haver uma análise sobre a situação concreta a que a criança estava exposta”.

“No caso da Jéssica, ela viveu tão pouco, que foi muito tempo para ela”, disse.

De acordo com a advogada, “o grande problema neste tipo de casos” é que é suposto “preservar a família natural e, portanto, presume-se que quem nasce numa determinada família, em determinadas condições, nasce em condições de dever ficar com a sua família natural enquanto não se autonomizar como cidadão”.

“Nas situações em que não é assim é que prevalece o outro princípio, que é o princípio da proteção por parte do Estado destas crianças, através da institucionalização e da adoção”, disse Ana Rita Campos.

“Nós não podemos lamentar o desaparecimento de uma criança e não olhar para aquilo que temos de alterar neste sistema todo, que passa na proteção das crianças que estão com as próprias famílias até às que estão institucionalizadas e que são adotadas”, afirmou.

“Fora da comoção, (…) que se perceba que isto tem de ser uma prioridade para o Governo”, concluiu.

Relativamente às possíveis medidas de coação, “no pior cenário, está em causa um crime de homicídio qualificado [até 25 anos de prisão] ou um crime de ofensas à integridade física qualificado agravado pelo resultado [até 16 anos de prisão]“, sendo que na primeira opção tem de “haver intenção de matar”. Além disso, podem ainda estar em causa crimes de rapto e extorsão.

Já a mulher mais nova pode enfrentar um crime de omissão de auxílio, coautoria ou cumplicidade – auxílio moral ou material.

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