A Fraude

Hoje na SIC

Depois da Fraude

Em 2013, a SIC exibiu quatro episódios sobre o escândalo BPN. Num esforço de descodificação da fraude, fizemos a história do banco, criado em 1998, por José Oliveira Costa, um antigo secretário de Estado de Cavaco Silva, um homem simples, de família humilde, natural do distrito de Aveiro. Sobre Oliveira Costa já tudo se escreveu; já tudo se disse. É o rosto de uma história que está a deixar profundas marcas num país a viver em asfixia financeira. Não será, certamente, o único. Os processos judiciais associados ao BPN sucedem-se, destapando outros protagonistas. Seguem ao ritmo lento da justiça. O processo principal começou em dezembro de 2010, há quatro anos. Envolve 15 arguidos. Ouviu 300 testemunhas. E está para durar. Há outros três processos, igualmente relevantes, em estado de maturação judicial avançado. Mas os inquéritos prosseguem. A história completa do BPN, provavelmente, nunca chegará ao fim.

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Haverá certamente um antes e um depois do BPN. O peso da fraude foi de tal forma intenso que o país assumiu que episódio semelhante não voltaria a acontecer.

O que nos faz regressar ao BPN, quando o assunto já cheira a mofo, tendo sido empurrado para o arquivo das notícias, é a imensa história que ainda está por contar e que deve ser contada; porque nos serve do prólogo ao caso BES; porque o BPN é uma espécie de oráculo: tudo o que já sabemos que aconteceu com o BPN parece estar a acontecer com o BES. À medida que a história do BES se revela, revemos o nosso maior pesadelo. A vivermos, ainda, a ressaca do BPN, descemos mais fundo.

Oliveira Costa, ao contrário dos protagonistas do BES, era homem sem berço. Construiu um império de barro que sucumbiu peça a peça. Influenciou políticos, influenciou políticas, apoiou empresas, futebol. Tudo isso, aos poucos, se vai conhecendo. A história do BES vale muitas décadas. O BES não foi um fôlego sôfrego, mas uma influência que ultrapassou regimes, políticas, políticos. A esses conquistou-os, empregou-os, lançou-lhes cenouras e anestesiou-os. E o barro transformou-se em cimento nacional.

Não poderíamos partir para o BES sem ficarmos a conhecer a fundo alguns dos prováveis obreiros do escândalo BPN. Há um ano abrimos o ângulo; nas duas grandes reportagens que agora apresentamos, viajamos no detalhe.

No primeiro episódio, a Herança, vamos conhecer a Parvalorem, o universo de empresas do Estado que está a gerir os ativos tóxicos que a nacionalização do banco despejou na carteira dos contribuintes.

Pela primeira vez, desde que foi criada, em 2010, a Parvalorem abriu a porta a uma equipa de televisão. Este universo de empresas gere uma carteira de dívidas de difícil cobrança, no montante de 4,5 mil milhões de euros e, como se fosse tudo farinha do mesmo saco, integra as 3 centenas de trabalhadores que o BIC não contratou, quando comprou o BPN.

No Segundo episódio, a Cobrança, assistimos aos resultados da nova estratégia de recuperação e ficamos a conhecer, em detalhe, alguns dos principais devedores do BPN. O relato traduz a história do próprio banco: distribuiu avultados empréstimos sem cuidar das garantias. Numa sucessão de casos quase caricatural ficamos a perceber como se endividaram figuras próximas do antigo homem forte do BPN e da SLN, José Oliveira Costa. Da lista das personagens escolhidas fazem parte, entre outros, Ricardo Oliveira, Aprígio Santos, Joaquim Coimbra, Emídio Catum e Domingos Duarte Lima.

Pedro Coelho

 

OS PROTAGONISTAS

Trabalhadores:

Ana Quental, 63 anos, 39 anos de banca, 13 de BPN. Reformada há ano e meio, era diretora adjunta no BPN, com ordenado líquido superior a três mil euros líquidos. Recebe uma pensão inferior a 900 euros, um terço do que deveria receber. Explicação: foi funcionária do BPN.

Ricardo Gonçalves. Ativo membro da comissão de trabalhadores da Parvalorem. Contesta a integração na empresa dos trabalhadores do BPN que o BIC não quis. A Parvalorem gere ativos tóxicos, não deveria, no entender de Ricardo Gonçalves, gerir pessoas.

António Marafona, funcionário da Parvalorem no Porto. Mudou do BES para o BPN, alimentando o sonho de chegar a gerente; o sonho perdeu-se no alvoroço da nacionalização. Marafona deteta na Parvalorem sinais de uma empresa doente.

Manuel Moreira, gerente do BPN, abriu as agências no distrito de Bragança. Está em casa, sem funções, há mais de dois anos, e a receber o salário por inteiro.

Devedores:

Ricardo Oliveira chegou a ser um dos maiores acionistas da SLN Valor, empresa do universo SLN/BPN. A Parvalorem reclama uma dívida de 32 milhões de euros, que o empresário contesta. Oliveira é arguido num processo, associado ao BPN, cujo julgamento começa no próximo dia 6 de janeiro. O Ministério Público deu ordem de arresto à coleção de Mercedes que Ricardo Oliveira fez em tempo relâmpago. Em setembro de 2013 foi leiloada em bloco. O Ministério Público desconfiou da liquidação total. Apanhou a receita de 12 milhões de euros e as 9 viaturas que não foram vendidas.

Os irmãos Cavaco, empreendedores imobiliários algarvios, financiavam-se como queriam no BPN. Obras faraónicas, como a da Marina de Albufeira, abriram um buraco de 71 milhões de euros no banco. A empresa está em processo de recuperação, apoiado pela Parvalorem.

Domingos Duarte Lima é arguido no processo Homeland, um fundo imobiliário constituído com dinheiro do BPN. O fundo, de que o ex-líder parlamentar do PSD era um dos principais responsáveis, quis urbanizar um terreno em Oeiras onde nem um tijolo foi plantado. O terreno era a única garantia de um empréstimo superior a 40 milhões de euros. Duarte Lima é igualmente responsável por uma divida pessoal de 6 milhões de euros.

Aprígio Santos, construtor civil empreendedor imobiliário e homem do futebol, deve 600 milhões de euros à banca, 150 milhões ao BPN. Hipotecou por cinco vezes um prédio de 3,5 milhões de euros como garantia de empréstimos avultados do BCP e do BPN. O prédio, numa das zonas mais nobres de Lisboa, está abandonado. Resta a relojoaria de Vítor Salgado.