Geração 70

Isabel Abreu: “Chegámos a uma altura em que trabalhar não é suficiente para viver”

Com pequenos teatros à porta do supermercado da aldeia conseguiu a tão desejada Barbie que a mãe odiava. Na altura, a mãe chamava-lhe “teatreira”. Hoje, Isabel Abreu é atriz, feminista e assume-se “uma mulher em luta” que se desiludiu com a geringonça. Sem tabus, fala sobre o “caos social” que “todos” estamos a viver.

Isabel Abreu: “Chegámos a uma altura em que trabalhar não é suficiente para viver”
SIC

Os avós maternos eram de Arronches, o avô pertencia aos serviços cartográficos do exército e vigiava a fronteira entre Portugal e Espanha. A família deixou a terra alentejana e foi para Almada. Os pais conheceram-se na Faculdade de Medicina e regressaram novamente ao Alentejo para “ajudar na criação do centro de saúde de Arronches e do Hospital de Portalegre”.

Não gostava da pré-primária e entrou para a escola primária antes do tempo. “Foi por favor e porque era filha dos médicos de Arronches.” Nasceu depois do 25 de Abril, mas o Estado Novo nunca saiu da escola onde estudou.

“A sala de aula estava dividida pela fila dos burros, dos médios e dos bons." A professora era austera e por vezes usava a “joaninha”, recorda. “Quando a joaninha saía todos podíamos apanhar ou não. Eu tinha medo”.

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A “teatreira” à porta do supermercado

Sempre quis representar e fazer cinema. Ainda criança era carinhosamente tratada pela mãe por “teatreira”. Recorda os teatros que fazia à porta do supermercado da aldeia para conseguir a boneca que tanto desejava. “A minha mãe odiava a Barbie, disse-me sempre que não a comprava. Odiava aquele estereótipo.”

Depois de terminar o secundário, em Portalegre, entrou no Conservatório, em Lisboa. Mais tarde, já com 29 anos, regressou a Arronches. Mas não para sempre. “Tinha a minha vida cá. Era muito, muito duro viver lá e trabalhar em Lisboa diariamente.”

A miúda tímida e calada deu lugar à atriz que luta pelos direitos das mulheres e com orgulho na carreira que construiu. Durante a conversa, fala sobre a infância no Alentejo e sobre as inseguranças que a acompanham até hoje.

“Chegámos a uma altura em que trabalhar não é suficiente para viver”

Politicamente assume que está na luta. Fala sobre o “caos social” que “todos” vivemos, sobre o ordenado que “não chega para as despesas” e sobre a vida que “não fica difícil, mas impossível.”

“Chegámos a uma altura em que trabalhar não é suficiente para viver.” Assumidamente de esquerda e mais próxima do Bloco de Esquerda, confessa que “adora” Mariana Mortágua mas foi uma “desilusão” ver o partido governar ao lado do PS.

“Geração 70“ é uma conversa solta com os protagonistas de hoje que nasceram na década de 70. A geração que está aos comandos do país ou a caminho. Aqui falamos de expectativas e frustrações. De sonhos concretizados e dos que se perderam.

Um retrato na primeira pessoa sobre a indelével passagem do tempo, uma viagem dos anos 70 até aos nossos dias conduzida por Bernardo Ferrão.