Há grupos privados na rede social Facebook que promovem práticas caseiras de inseminação artificial. Os utilizadores dizem ser "empurrados" para estes comportamentos de risco por falta de resposta no Serviço Nacional de Saúde. As listas de espera rondam os três anos, mas uma equipa do Hospital de São João, no Porto, está a tentar mudar este cenário.
"O meu maior sonho sempre foi ser mãe. Estando solteira há algum tempo e tendo 28 anos, optei por ser mãe a solo. A Inseminação Artificial feita em clínicas é muito cara. Comecei a perder a esperança de conseguir engravidar antes dos 30. Depois de muito pesquisar, encontrei este grupo. Enviei mensagem aos administradores a agradecer por o terem criado. É a única solução para muitos casais e mães solo. Senti-me logo bem vinda e bem acolhida! Conversei com o Tiago no final de agosto (...) e começamos as tentativas em setembro (...) Este mês recebi a notícia mais desejada. Estou grávida!"
Este relato, contado na primeira pessoa, não tem rosto.
É um entre muitos, publicados em grupos privados de Facebook intitulados "Inseminação Artificial Caseira".
De um lado, mulheres desejosas de serem mães. Do outro, homens disponíveis para doar sémen.
A Entidade Reguladora da Medicina de Reprodução diz não conhecer esta prática de forma tão organizada.
"Mas sabemos que isso acontece (...) isso é ilegal", diz Carla Rodrigues, Presidente do CNPMA.
A par da ilegalidade, está em risco a saúde das mulheres e dos eventuais filhos.
No Facebook, lê-se que o Serviço Nacional de Saúde não responde às necessidades da população.
E os números parecem confirmá-lo.
Casais ou mulheres inférteis esperam mais de três anos para aceder a tratamentos de procriação medicamente assistida.
Muitos passam o limite de idade e são descartados pelo SNS, impedidos de realizar o desejo de ser pai ou mãe.
E quando se está dependente da doação de ovócitos ou de espermatozoides, o tempo de espera é ainda maior.
Em 2018, o Tribunal Constitucional impôs o fim da regra do anonimato dos dadores e previu-se uma descida "a pique" do número de dádivas.
Depois de uma campanha, o número de dádivas aumentou para números superiores aos registados antes da quebra do anonimato.
A dádiva pode ser realizada em três maternidades do SNS ou em clínicas privadas.
Quem doa recebe uma compensação financeira, igual no setor público e no privado.
Ainda assim, as clínicas retêm muito mais dadores do que o Banco Público de Gâmetas.
Em 2022, apenas 3% das dádivas de ovócitos foram feitas no SNS.
Poucos gâmetas, longas listas de espera. É este o cenário no SNS.
Ainda assim, o Centro de Responsabilidade Integrada em Medicina de Reprodução, criado em junho do ano passado, no Hospital de São João,
tem conseguido contrariar esta tendência.
Apesar de depender das doações feitas n o banco público, está "quase a duplicar" a resposta à procriação medicamente assistida.
Esta reorganização da equipa permite fazer, em média, mais 40 ciclos de fertilização in-vitro por mês. A lista de espera para inseminação intrauterina é de três meses.
Para melhorar ainda mais a resposta, é necessário ampliar as instalações, mas a administração do Hospital de São João não se compromete com uma data.