Como bem sabemos, as curtas-metragens desapareceram da programação regular das salas de cinema — as pouquíssimas excepções apenas confirmam a regra. Ao mesmo tempo, importa não menosprezar o facto de algumas plataformas de streaming incluirem nos seus catálogos filmes de pequena duração que, de facto, merecem ser descobertos.
Eis um belo exemplo, que pode ser uma rima interessante com a estreia de “Restos do Vento”, novo filme de Tiago Guedes. Assim, em 2014, Tiago Guedes esteve presente no Indielisboa com “Coro dos Amantes”, uma pequena grande proeza de pouco mais de 20 minutos, tendo como base uma peça de Tiago Rodrigues.
A sinopse é tão breve quanto insuficiente: um casal em evidente crise de comunicação vive a angústia de uma urgência que obriga a mulher a ser tratada num hospital… De facto, as “peripécias” não bastam para condensar o que acontece, quanto mais não seja porque o que acontece é eminentemente cinematográfico.
Tirando o melhor partido do seu talentoso par de intérpretes — Isabel Abreu e Gonçalo Waddington —, Tiago Guedes elabora uma narrativa de estranha e envolvente musicalidade (dimensão que a palavra “coro”, no título, certamente sugere). A intensidade dos tempos da acção e, em particular, o frequente tratamento do ecrã em duas zonas autónomas vão criando uma ambiência peculiar: o cinema, arte por excelência do visível, pode aproximar-se daquilo que já pertence ao invisível — tudo acontecendo num exercício coral a que, naturalmente, o espectador também pertence.