Cultura

Glauber Rocha, aqui e agora

Glauber Rocha (1939-1981): não é possível compreender o Cinema Novo brasileiro sem passar pela sua herança
Glauber Rocha (1939-1981): não é possível compreender o Cinema Novo brasileiro sem passar pela sua herança

Foi um dos nomes centrais do movimento do Cinema Novo brasileiro: agora, podemos redescobri-lo nas salas portuguesas através de seis longas-metragens em cópias restauradas.

Glauber Rocha (1939-1981) não será propriamente um desconhecido de muitos cinéfilos portugueses, mas é um facto que já há algum tempo não havia uma oportunidade de revisitação da sua obra como aquela que, agora, é proposta pela Nitrato Filmes, para já com exibições em salas do Porto (Trindade) e Lisboa (Nimas).

A saber: nada mais nada menos que seis títulos da sua ficção (mais de metade…), em cópias restauradas, incluindo a trilogia de filmes que o afirmou no contexto das “novas vagas” dos anos 60 — “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964), “Terra em Transe” (1967) e “António das Mortes” (1969), este último distinguido em Cannes com o prémio de realização (recordamos aqui em baixo o respectivo trailer francês).

Como os outros autores do Cinema Novo brasileiro (Nelson Pereira dos Santos, Joaquim Pedro de Andrade, Carlos Diegues, etc.), Glauber Rocha procurou reflectir as convulsões históricas do seu país, ao mesmo tempo discutindo e reinventando as narrativas da sua abordagem. “Barravento” (1962), a primeira longa-metragem, também incluída nesta galeria de reposições, pode servir de exemplo modelar de tal atitude: um retrato de um pobre aldeia piscatória em que a crueza das condições materiais se cruza com um imaginário, profundamente místico, de raiz africana.

O ciclo completa-se com “O Leão de Sete Cabeças” (1970), coprodução Brasil/Itália/França que, a partir de cenários africanos, propõe um mapa surreal sobre a geopolítica da época, e “A Idade da Terra” (1980), uma parábola filosófica, assumidamente experimental, sobre a identidade brasileira, tendo como protagonistas quatro “reencarnações” da figura de Cristo.

Em resumo: a redescoberta da obra de Glauber Rocha, aqui e agora, projecta-nos num tempo em que, nos mais variados contextos geográficos e culturais, o cinema discutia os poderes e limites das suas linguagens — a sua herança persiste através de um misto de exigência moral e ousadia formal.