Cultura

Sessão de Cinema: “Ser ou Não Ser”

É um das obras-primas do humor de Ernst Lubitsch e também uma referência central na galeria de filmes de Hollywood que, em 1942, reflectiram os tempos conturbados da Segunda Guerra Mundial.

Carole Lombard no centro do palco, ou o sentido crítico e o humor do cinema de Ernst Lubitsch
Carole Lombard no centro do palco, ou o sentido crítico e o humor do cinema de Ernst Lubitsch

Muitas vezes se esquece que, em Hollywood, o período clássico do chamado “filme de guerra” está longe de ser um mero arquivo de memórias da Segunda Guerra Mundial. Em boa verdade, durante o próprio conflito, os respectivos títulos desempenharam também um papel, de uma só vez social e emocional, de mobilização dos espectadores (a começar pelos americanos) contra a ameaça nazi. Estreado em novembro de 1942, “Casablanca” é, obviamente, uma referência nuclear nesse processo, mas graças ao streaming vale a pena ver ou rever “Ser ou Não Ser”, de Ernst Lubitsch, lançado ainda antes, a 19 de fevereiro do mesmo ano.

Convém não esquecer que estamos perante o trabalho de um mestre alemão que realizou grande parte da sua obra nos EUA — Lubitsch nasceu em Berlim, em 1892, e faleceu em 1947, em Los Angeles. O mínimo que se pode dizer é que “Ser ou Não Ser” reflectia a actualidade da guerra de forma directa e concisa. Que é como quem diz: tudo se passa em Varsóvia, ocupada pelos nazis (a invasão da Polónia pelo exército de Adolf Hitler, a 1 de setembro de 1939, dera início ao conflito).

Filme de guerra, “Ser ou Não Ser” é-o num sentido pouco comum, já que, à boa maneira de Lubitsch, tudo acontece num registo de contagiante comédia, a meio caminho entre o romantismo e a farsa. No seu centro está o casal Joseph e Maria Tura — respectivamente Jack Benny e Carole Lombard —, estrelas de uma companhia de teatro de Varsóvia que, apesar da ocupação alemã, estão a trabalhar numa peça satírica intitulada… “Gestapo”.

Lubitsch encena tudo isso com a subtileza dramática, e também o humor mordaz, de quem sabe expor as evidências e as máscaras do poder, sem nunca ignorar as contradições humanas que contaminam o seu funcionamento. Nesta perspectiva, “Ser ou Não Ser” é um filme tão sagaz na percepção do tempo em que foi produzido como intemporal na sua dimensão de parábola política.

Grande sucesso de 1942, nomeado para o Óscar de melhor música, “Ser ou Não Ser” foi também um filme lançado sob o signo da tragédia: poucas semanas antes da estreia, a 16 de janeiro de 1942, Carole Lombard morreu num acidente de avião — contava 33 anos.

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