Erguida em 1163 e consumida pelas chamas em 2019, a Catedral de Notre-Dame, graças à sua arquitetura, impulsionou uma revolução musical. Agora, depois da sua reconstrução, sente-se que a acústica mudou.
Segundo a BBC, perante a estrutura da Catedral Notre-Dame, com um teto alto, abóbadas, entre outras características arquitetónicas, um grupo de compositores tentou tirar o maior partido da formacomo o som se propaga no interior do edifício.
Introduziram várias linhas de melodia em simultâneo para produzir elaborados arranjos polifónicos, ou motetos (género musical polifónico que surgiu no século XIII).
"Tiveram de descobrir uma forma de cantar lá dentro que se adaptasse à arquitetura", diz Brian Katz, à BBC, especialista em acústica e diretor de investigação do Institut D'Alembert da Universidade de Sorbonne, em França.
No dia 15 de abril de 2019, a "jóia gótica" foi destruída pelas chamas. O telhado da Catedral ardeu e um pináculo da catedral desabou. Cinco anos e meio depois, as portas da Catedral reabriram.
Brian Katz estudou a acústica da Notre-Dame durante mais de uma década e, tendo já visitado a Catedral inúmeras vezes, considera que, depois da reconstrução, algo mudou na maneira como som de propaga no edifício.
"É difícil dizer exatamente o que mudou", adianta Katz.
Na verdade, também houve outros fatores que contribuíram para a mudança da sonoridade na Catedral, já que foi instalado um novo sistema de som e fez-se uma limpeza extensiva dos 8000 tubos do órgão durante os trabalhos de restauro, mas Katz acredita que a forma como o som interage com o tecido do próprio edifício também é subtilmente diferente.
"Isto é muito típico de uma nova sala de concertos, onde a orquestra residente - e o público - precisam de alguns meses para se adaptarem às novas condições. O espaço é como um instrumento, e é preciso familiarizarmo-nos com ele para o aproveitarmos ao máximo", explica.
Segundo a BBC, Katz e a sua equipa de investigação na Universidade de Sorbonne trabalharam em conjunto com os arquitetos e construtores encarregados de restaurar a catedral desde o incêndio, numa tentativa de não perder a acústica única de Notre-Dame, enquanto o edifício era reconstruído.
Apesar das mudanças, a Catedral continua a ser um espaço que proporciona uma experiência única para quem lá atua e para o próprio público.
"Notre-Dame é um dos espaços de atuação mais mágicos do mundo. (...) É claro que existem desafios para coordenar qualquer tipo de atuação ao vivo numa acústica tão reverberante, mas a natureza transcendental da Catedral transforma esse trabalho numa dádiva", diz à BBC Gustavo Dundamel, o maestro venezuelano que dirigiu a Orchestre Philharmonique de Radio France na reabertura de Notre-Dame a 7 de dezembro de 2024 e também noutras ocasiões antes do incêndio.