Desporto

Atleta norte-americana acusa treinador de assédio sexual: um dos episódios aconteceu em Lisboa

A atleta na sua obra descreve um "mundo secreto" na corrida profissional e diz publicamente, pela primeira vez, que ela é a mulher por detrás das alegações de agressão sexual que levaram o seu antigo treinador, Alberto Salazar, a ser banido do desporto para o resto da vida em 2021.

Kara Goucher
Kara Goucher
Don Ryan

Kara Goucher, uma das mais rápidas atletas femininas norte-americanas de longa distância da história, esteve no programa Good Morning America, da ABC News e apresentou a autobiografia intitulada The Longest Race: Inside the Secret World of Abuse, Doping, and Deception on Nike's Elite Running Team.

A atleta na sua obra descreve um "mundo secreto" na corrida profissional e diz publicamente, pela primeira vez, que ela é a mulher por detrás das alegações de agressão sexual que levaram o seu antigo treinador, Alberto Salazar, a ser banido do desporto para o resto da vida em 2021.

"Alberto Salazar era muito, muito poderoso. Ele era uma lenda. Ganhou a Maratona de Boston. Ganhou a Maratona de Nova Iorque três anos seguidos", disse Goucher, que acrescentou que, à medida que o conhecia, gostava mais dele.

Goucher contou que enquanto fazia grandes progressos com Salazar e tinha alguns dos melhores tempos, acreditava que o treinador fazia algo, a seu ver, incomum: Salazar massajava os seus atletas.

"Nunca tinha visto um treinador a massajar um atleta", disse ela. "E pensei: é o Alberto. Ele é tão dedicado, até está disposto a dar massagens aos seus atletas".

A atleta denunciou uma série de casos de assédio sexual, tendo o primeiro ocorrido em Itália, quando o treinador a abordou de forma imprópria, durante uma massagem.

"Ele estava a dar-me uma massagem pós-treino e pré-corrida, a que chamamos de 'descarga'. Para ser sincera, simplesmente, congelei. Pensei 'É impossível que ele me esteja a tocar desta maneira. Estou a imaginar. Ele é só um mau massagista'", afirmou.

Um episódio voltou a repetir-se, anos mais tarde, quando viajaram para Portugal, para correr na meia-maratona de Lisboa: "Ele ia fazer-me uma massagem. Foi a mesma situação, na qual senti que o dedo estava a ir para onde não devia. Fiquei muito desconfortável".

"Senti-me envergonhada com aquilo. Também senti que talvez tivesse sido só um erro (...). Sinceramente, deixa-me um pouco triste, porque sei quanto ele adora [a modalidade]. Penso que isto é toda a vida dele. Mas, no final, não devia estar a treinar", completou.

Goucher deixou Projecto da Nike em 2011 e nunca falou sobre as alegadas agressões até ser interrogada por advogados da Agência Anti-Doping dos EUA numa investigação contra Salazar por uso de doping.

Em 2019, o treinador foi suspenso por quatro anos pela agência por uso de doping, alegações que foram negadas pelo treinador.

Em 2021, o Centro norte-americano de SafeSport um organismo do Governo que protege os atletas profissionais de abuso sexual, proibiu Salazar de praticar a modalidade a nível olímpico por “má conduta sexual”.

Em declarações à ABC News, a Nike disse que:

"A má conduta sexual não tem lugar no desporto ou na sociedade e é algo contra o qual nos opomos veementemente.... Alberto já não é treinador contratado, e fechámos o Projeto Oregon há vários anos... O Sr. Salazar não se envolveu em qualquer doping dos seus atletas e verificou-se que nenhum atleta do Projeto Oregon violou as regras".

No livro, a atleta conclui que "o seu poder não está nas suas pernas, mas na sua voz".