O secretário-geral da UGT considerou hoje "preocupantes" os dados do estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos que indicam que a maioria das pessoas em situação de pobreza trabalha e pede ao Governo que aposte na qualificação.
Em declarações à agência Lusa, Carlos Silva disse que as conclusões do estudo não o surpreenderam em alguns aspetos.
"Este problema tem sido abordado pela UGT e até temos vindo a informar o Governo sobre isso. Demos nota de que há muitos trabalhadores que trabalham e são pobres, ou seja, não conseguem ultrapassar o limiar da pobreza, mesmo estando empregados. O estudo vem confirmar este dado", disse.
O estudo "Pobreza em Portugal -- Trajetos e Quotidianos", promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, indica que um quinto da população portuguesa é pobre e a maior parte das pessoas em situação de pobreza trabalha, sendo que a maioria dos trabalhadores nessa condição tem vínculos laborais sem termo.
-
Os 4 perfis de pobreza em Portugal: reformados, precários, desempregados e trabalhadores
-
Pobreza em Portugal: os "novos pobres" e os que regressam a cenários vulneráveis
"Este estudo dá um dado, esse sim novo para mim, ou seja, que não há novos pobres. São acima de tudo pessoas que estão neste limiar e muitos na pobreza. São pessoas que já eram pobres, perderam o emprego que depois recuperaram e voltaram a perder. Há aqui uma intermitência como o estudo revela entre muitos dos que trabalham", destacou.
De acordo com Carlos Silva, são pessoas frágeis, mais vulneráveis e que o estudo aponta como tendo baixas qualificações.
"Por isso, a UGT e os parceiros sociais têm insistido que as qualificações em Portugal deveriam ser uma aposta prioritária do Governo", disse.
Para Carlos Silva, a questão da precariedade não é a essencial, mas também um problema, sobretudo resultante da política de baixos salários.
"Há trabalhadores que têm vínculos com 10, 15 e 20 anos, com contratos sem termo que são pobres. É uma matéria que tem a ver com uma política de baixos salários em Portugal", realçou.
Esta situação, segundo o secretário-geral da UGT, foi agravada com a situação de pandemia de covid-19.
"O governo devia olhar para este estudo com muita atenção e sobretudo numa altura em que a pandemia veio agravar a questão, embora o estudo revele que as pessoas mais frágeis continuam frágeis. Por isso, a UGT continua a insistir nos apoios sociais e ficámos satisfeitos com o facto de estes terem sido aprovados no parlamento e tenham de ser aplicados. Muitos dos trabalhadores que vão bater à porta do Estado são pessoas que estão neste universo que o estudo aponta", disse.
No entendimento de Carlos Silva, o Governo deve estar atento aos sinais que a sociedade vai dando.
"Este estudo é um sinal preocupante e deverá ter uma prioridade no acompanhamento e na reflexão por parte do governo e de todos nós", concluiu.
O documento hoje apresentado, promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e coordenado por Fernando Diogo, professor de Sociologia na Universidade dos Açores, resulta da observação dos últimos dados disponíveis do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR), relativos a 2018, aliada à realização de uma análise qualitativa baseada em "91 entrevistas aprofundadas por todo o país".
Em declarações à agência Lusa, Fernando Diogo salientou que o estudo identificou "quatro perfis de pobreza em Portugal, que são uma novidade: os reformados (27,5%), os precários (26,6%), os desempregados (13%) e os trabalhadores (32,9%)".
A análise conclui que um terço dos pobres são trabalhadores. Juntando-lhes os precários, percebe-se que mais de metade das pessoas em situação de pobreza trabalha, o que significa que "ter um emprego seguro não é suficiente para sair de uma situação de pobreza", ressalva o documento.