Economia

Em Davos, Lagarde não cede à inflação e FMI diz que as políticas não podem ser iguais em todo o lado

Num painel realizado esta sexta-feira no Fórum Económico Mundial, Christine Lagarde, do BCE, voltou a demarcar-se da política monetária norte-americana e Kristalina Georgieva, do FMI, avisou para os malefícios da subida dos juros pela Fed.

Em Davos, Lagarde não cede à inflação e FMI diz que as políticas não podem ser iguais em todo o lado

“Não podemos ter as mesmas políticas em todo o lado” em 2022, avisou Kristalina Georgieva, a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), num painel de debate realizado esta sexta-feira em Davos pelo Fórum Económico Mundial. A economista búlgara referia-se à política de saúde face à pandemia (86 países ainda estão abaixo da meta de 40% de vacinados contra a covid-19) e às políticas económicas e monetárias. Nomeadamente em relação à inflação, com níveis bem diferentes do Brasil aos Estados Unidos, à zona euro, à China ou ao Japão, Georgieva enfatizou que a abordagem “tem de ser específica”.

Dentro dessas “especificidades”, a diretora-geral do FMI alertou para o impacto que vão ter as subidas da taxa diretora da Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed) – os mercados de futuros apontam para quatro subidas – sobretudo nas economias emergentes com níveis de dívida elevada denominada em dólares. A subida das taxas pela Fed “vai deitar água fria” na recuperação de “65% de economias com stresse de dívida ou à beira dele”. E deixou o conselho: “Precisam de estender as maturidades da dívida”.

A ‘deixa’ da especificidade foi, logo, agarrada por Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE) para repetir, uma vez mais, que o curso na zona euro não é idêntico ao dos EUA. “Não estamos a mover-nos à mesma velocidade do que os EUA”, enfatizou, para depois detalhar: “Não registamos uma situação de procura excessiva, que nos EUA está já 30% acima dos níveis anteriores à pandemia. Não vivemos no mercado de trabalho um movimento como o da ‘grande demissão’ [um despeça-se a si próprio para procurar melhores empregos] nos EUA.  Não vemos um movimento de espiral na subida dos salários. Não vamos ter um nível de subida da inflação como nos EUA”.

Lagarde reafirmou, por isso, a estratégia de “paciência”, em que já foram dados alguns passos de aperto monetário, mas sem pressas: o programa especial criado para dar liquidez ao combate à pandemia (conhecido pela sigla PEPP) vai ser descontinuado em março e até final do ano o volume de aquisição mensal de ativos vai cair substancialmente.

Também o governador do Banco do Japão, Haruiko Kuroda, apanhou a mesma carruagem no debate desta sexta-feira em Davos. No Japão a inflação continuará a ser das mais baixas entre as economias desenvolvidas (com as projeções do banco a apontarem para 1,1% este ano e no próximo), bem longe do objetivo de 2%, e apesar de uma aceleração no crescimento em 2022 (3,8% face a 2,8% em 2021). “A nossa situação é completamente diferente da dos Estados Unidos e mesmo da zona euro. Nós temos de continuar a nossa política monetária de estímulos nos próximos tempos”, concluiu.

Dentro da “diversidade” que vai dominar 2022 – nas palavras da diretora geral do FMI -, mas em uma direção completamente diferente vai o Brasil, disse Paulo Guedes, o ministro da Economia de Bolsonaro, no painel em Davos. “Fomos o primeiro país a remover a política expansionista em 2021 logo que a economia começou a crescer”, enfatizou, para destacar o aperto na política orçamental (austeridade) e na política monetária.

Guedes adiantou que as contas públicas brasileiras deverão passar de um défice de 13,4% do PIB em 2020 para um pequeno excedente em 2021 e o rácio da dívida pública no PIB deverá ficar em 80% em vez dos 100% previstos pelas organizações internacionais. O Banco Central do Brasil, por seu lado, subiu seis vezes a taxa diretora Selic de 2% para 9,25% no final do ano passado. Foi um dos líderes do movimento de 50 bancos centrais que subiram, em 2021, as taxas diretoras, a esmagadora maioria em economias emergentes que sofreram disparos de inflação. No Brasil, a inflação atingiu 10,7% em novembro e desceu para 10% em dezembro.