Alterações Climáticas

Análise

"Estamos a entrar num novo paradigma climático"

Duarte Costa, especialista em alterações climáticas, realça a "sucessão de recordes" negativos e critica a postura dos líderes políticos em relação à crise climática. "Fico pasmo quando num Conselho de Estado se fala zero sobre isso".

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António Guterres tem sido das vozes mais ativas nos alertas sobre a emergência climática. Depois de diversos alertas, afirma que o colapso do clima já começou. Duarte Costa, especialista em alterações climáticas, diz que “não é preciso ser um cientista para concordar” com o secretário-geral das Nações Unidas.

“É impossível não concordar. Os cientistas têm documentado uma sucessão de eventos que quebram todos os recordes. Este mês de agosto só não foi o mais quente desde sempre, pois o anterior, em julho, foi o mais quente”, realça Duarte Costa.

No final de setembro, a ONU alertou que o mundo está “mais perto do que em qualquer outro momento deste século da catástrofe global”. Pois, como realça Duarte Costa, há “indicativos de que estamos a entrar num novo paradigma climático”, em que temos “novos eventos extremos e fenómenos que nos causam mais impactos”.

Ainda vamos a tempo?

Os recordes (negativos) são batidos e os alertas multiplicam-se. Mas, afinal, ainda vamos a tempo de reverter esta situação?

“Vamos sim. Do ponto de vista da ciência climática, isto é nada”, frisa Duarte Costa, alegando que, apesar disso, “estamos no linear do ponto de vista dos sistemas humanos”.

“Sempre foi dito pela ciência que 1.5 graus de aquecimento global era o máximo que poderíamos a aguentar. A partir daí são mudanças irreversíveis no sistema planetário, não só climático (...) A trajetória que nós estamos dá uma probabilidade de ultrapassarmos este 1.5%.Estamos a ver que para nós, hoje já é demasiado e está a causar demasiados danos, mas isto é só o início do que poderá acontecer se não travarmos este processo”.

Para isso, no entanto, “são necessárias políticas rigorosas e ambiciosas”. O especialista dá, como exemplo, acordos globais e vinculativos para “parar novos investimentos que coloquem mais combustíveis fósseis nas economias”, lembrando a necessidade dos países, inclusive Portugal, de “descarbonizar em todas as frentes”.

“Descarbonizar não é só garantir que temos um planeta onde é possível viver, é garantir por exemplo que as pessoas possam não gastar tanto dinheiro com combustíveis e possam andar de bicicleta e transporte público, ou tenham uma casa mais eficiente do ponto de vista energético e com isso gastem menos dinheiro com contas”.

“Fico pasmo quando num Conselho de Estado não se fala disso”

Decorreu esta terça-feira a segunda parte do Conselho de Estado, em que António Costa manteve-se em silêncio durante a análise sobre a situação económica e social do país. No entanto, apesar do pouco que sabe, o tema das alterações climáticas não parece ter estado em cima da mesa.

“Fico pasmo quando há um Conselho de Estado, com tantas altas figuras do país, e se fala zero sobre a crise climática. (…) Os nossos líderes políticos não estão atentos a esses problemas”, considera Duarte Costa.