Coronavírus

Polémica com vacinas. “Nós fomos surpreendidos em março, não fomos surpreendidos agora”

Daniel Torres Gonçalves explica o contexto penal que podem ser aplicados aos casos de desvio de vacinação contra a covid-19.

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Perante as denúncias de casos em que as doses de vacina contra a covid-19 foi administrada a pessoas que não faziam parte dos grupos prioritários, Daniel Torres Gonçalves, advogado e presidente da Associação Portuguesa de Direito e Medicina, considera que é necessário saber qual a responsabilidade do Estado no cumprimento do plano de vacinação.

“Vamos ter de perceber se a culpa esteve no momento da execução do plano de vacinação ou se esteve no momento do planeamento do plano de vacinação. Porque nós podemos não conseguir apontar diretamente um momento, uma pessoa que tenha falhado, podemos ter aqui um conjunto de falhas ao longo do processo que tenha resultado nisto. E podemos ter aquilo que se chama a falta do serviço”, explica o advogado na Edição da Tarde.

Em causa poderão estar dois crimes: peculato de uso ou falsas declarações. “Se estivermos a discutir a utilização abusiva de um bem que tinha valor para a comunidade, se chegarmos à conclusão que este bem – as doses da vacina – foram utilizadas para fins alheios àqueles que estavam destinados podemos estar perante um crime de peculato de uso” que tem um enquadramento criminal que pode ir até um ano de prisão.

Por outro lado, em referência ao caso da mulher do administrador do hospital Narciso Ferreira, em Vila Nova de Famalicão, que foi declarada como sendo médica, o advogado considera que, a confirmar-se, este caso poderá ser entendido como “um crime de falsas declarações para a obtenção da vacina”, o que é também “punível com a mesma moldura penal até um ano”.

Daniel Torres Gonçalves questiona se os cidadãos consideram que se deve "esperar que o Estado atue de uma forma mais capaz, mais cabal" em relação ao cumprimento do plano de vacinas decretado pela task force. Perante essa resposta - que o próprio considera afirmativa - defende a importância de exigir às entidades do Estado que atuem com transparência, mostrando que estão a cumprir o programa a que se propõem.

“Nós temos de exigir das elites políticas a capacidade de materializar aquilo a que nos propomos enquanto comunidade. É muito fácil nós preparamos comunicados e prepararmos, no caso, a lista de prioridade se depois não termos a capacidade de a concretizarmos. Nós fomos surpreendidos em março, não fomos surpreendidos agora”, afirma ainda o advogado.