Sebastião Bugalho

Comentador SIC Notícias

Eleições Legislativas

A missão (quase) impossível de Pedro Nuno

Um ano, quatro meses e uma semana depois de quase ser demitido por decidir a localização do novo aeroporto sozinho, dez meses e nove dias depois de se demitir pelo envolvimento na indemnização ilegal de uma administradora da TAP, menos de meio ano após regressar ao Parlamento e menos de 30 dias depois de se estrear como comentador na SIC Notícias, Pedro Nuno Santos viu o Governo de que fez parte desde o primeiro dia ‒ mas não até ao último ‒ cair perante a operação Influencer.
A missão (quase) impossível de Pedro Nuno
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Alinhado com as intenções de António Costa, o já ex-governante não se oporia a que outro homem que não ele assumisse as rédeas da maioria absoluta após a demissão do primeiro-ministro, a 7 de novembro, sendo improvável que concordassem na duração de tal solução. A nega que o Presidente da República deu à hipótese, dissolvendo a Assembleia e anunciado eleições, impediu a divergência mas obrigou-o a avançar para algo que, ao fim de nove anos de expectativas, havia tornado inevitável: ser secretário-geral do Partido Socialista.

Enfrentando um ex-colega de Governo na disputa interna (José Luís Carneiro), sairia confortavelmente por cima, com carta branca de Costa para “fazer diferente” e o compromisso em congresso de dar “um novo impulso”, encerrando “um capítulo” de quase uma década.

Três meses mais tarde, à porta das eleições, não é claro que o “novo impulso” tenha surtido efeito ou que a perceção de fiel legatário do costismo lhe seja associada. Para o bem e para o mal, concordando ou discordando, Pedro Nuno Santos parece chegar ao final da campanha eleitoral, não como o híbrido que ensaiou ser ‒ meio herdeiro, meio ele próprio ‒, mas como alguém que ficou a meio de uma ponte, sem saber exatamente que lugar encontraria na outra margem. Não que o resultado não possa ser sorridente, mais ou menos distante do projetado em sondagem, mas pelo facto de o seu posicionamento como candidato a primeiro-ministro nunca ter sido exatamente claro ao longo do tempo.

Da posição sobre o Chega (uma aquando das regionais nos Açores, outra no debate com Montenegro), a sucessivos avanços e recuos acerca da governabilidade, de uma defesa exacerbada dos feitos dos governos de Costa a um programa ‒ e a uma linguagem ‒ menos consensuais do que o do seu antecessor, Pedro Nuno foi de momentos de invejável carisma a episódios de flagrante frustração. De símbolo de futuro à esquerda a recorrente nostálgico dos tempos troika, Pedro Nuno gastou mais latim a louvar os anos de Costa e a criticar os de Passos do que a mostrar como seriam os seus se lá chegasse. E é complicado convencer alguém assim.

Se o processo judicial que vitimou o seu antigo Governo tivesse sido tema durante a campanha eleitoral ‒ ou bandeira da sua ‒, um mau resultado poderia ser atribuído a António Costa e à falta de critério com que constituiu o seu gabinete. Mas sem qualquer partido a puxar pelas questões judiciais ‒ à exceção do Chega ‒ e com Pedro Nuno Santos a recusar dramatizar a interrupção da legislatura, rejeitando comentar “casos concretos”, será mais difícil ter o dito caso concreto como bode expiatório, num cenário de resultado vacilante.

Num papel em que políticos experimentados como Fernando Nogueira em 1995 e Ferro Rodrigues em 2002 não conseguiram triunfar, o seu trabalho era conseguir um milagre ‒ e muitos acreditaram nele ‒ ou perder por pouco, coisa que, ao dia de hoje, está na margem de erro. Tendo entre os 30% e os 32% com que Costa perdeu para Passos, em 2015, ninguém lhe poderá cobrar nada. Acima disso, ganharia um lugarzinho na galeria de figurões do Rato. Mas abaixo dos 28% que Sócrates teve em plena crise, após pedir um resgaste financeiro, deixaria o jovem turco à beira do deserto.

Diante de uma missão quase impossível, fez o melhor que pôde, num calendário que não lhe permitiu construir boa notoriedade na televisão nem ganhar distância dos deslizes da maioria absoluta, que também foram seus. Este domingo choverá a nuvem que o líder do PS carrega em cima da cabeça há já uns dias. Mas a tempestade não será só para ele. Nem foi, verdade seja dita, da sua inteira autoria.