Uma segurança do recinto garante que “nunca viu nada assim”. É a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), pela primeira vez em Portugal.
A imensidão do espaço, imponente, aliada ao silêncio sagrado que se costuma sentir, mesmo em dias de romaria, são os cartões de visita de Fátima e convidam à meditação. A própria sinalização que envolve o Santuário alerta para a necessidade de silêncio - aqui, é uma regra de ouro. Mas desta vez foi quebrada.
Nas vésperas da receção ao Papa, o longo asfalto até à Basílica é preenchido por grupos de peregrinos, para já maioritariamente de Espanha, Itália e regiões do sul dos Estados Unidos da América, que cantam, tocam guitarra, pandeiretas e organizam danças de roda a que muitos portugueses se vão juntando.
"Esta alegria chama mais gente à Igreja"
Maria Martins, pombalense de 82 anos, e Maria do Carmo, de Vouzela, com 73 anos, trouxeram cadeiras e vão pernoitar à frente da Capela das Aparições para guardar um lugar com vista privilegiada para a passagem do Papa Francisco. Explicam-nos que as equipas de segurança têm pedido aos jovens mais animados para que se afastem deste local, onde decorrem orações, mas vêem com bons olhos “esta nova forma de estar”.
“Há quem não goste do barulho das guitarras e da confusão, mas eu acho bem. Esta alegria chama mais gente à Igreja, mais jovens”, atira Maria Martins. “Queríamos ir a Lisboa”, desabafa Maria do Carmo, “mas era muita confusão”. “Vemos o Papa aqui. Este Papa é muito mais aberto, até já permite que mulheres divorciadas recebam a comunhão. Está a mudar a Igreja”, remata.
Quer esta informalidade em Fátima seja já sinal das mudanças que o Papa está a tentar imprimir ou apenas circunstancial pela ocasião desta JMJ, o que é certo é que as horas que antecedem a visita de Francisco são muito mais de “gospel” do que de “música clássica”.
O italiano Daniele, do grupo Cammino Neocatecumenale, que veio de Cagliari, Itália, reconhece uma imagem de Fátima com "peregrinos a chegar de velas acesas, lágrimas nos olhos e a caminhar de joelhos", mas também que “há várias formas de viver a fé e Cristo”.
“Este é o nosso carisma”:
No centro do recinto, um grupo de Granada, Espanha, organiza uma roda à volta da qual se vão juntando cada vez mais pessoas, que acompanham as músicas tradicionais com palmas e ensaiam uma coreografia. Noutra zona, um grupo de norte-americanos canta e dança ao som de djambés e guitarras: querem “espalhar a boa nova” do amor de Deus, conta Erick Cardoso, de 20 anos.
Ao mesmo tempo, na passadeira de mármore fazem-se promessas de joelhos e na Capela das Aparições, já lotada, está prestes a começar uma oração conjunta, envolvida num ambiente mais reverente. Esta diversidade cultural, mas sobretudo de estados de espírito, surpreende mas não choca quem já é visitante habitual do Santuário.
É o espírito que se sente no local: há uma tolerância sorridente para com o entusiasmo dos jovens, o que certamente explica o alívio de regras, que até permite que se jogue à bola no local sagrado. Será esta a Igreja onde “cabem todos, todos, todos” de que falava Papa Francisco na quinta-feira, na Cerimónia de Acolhimento no Parque Eduardo VII?
As arruadas de jovens com bandeiras às costas vieram testar a pacatez de Fátima. Mas este sábado, quando o líder da Igreja Católica atravessar de papamóvel a capital religiosa de Portugal, serão homens e mulheres portuguesas, um pouco menos jovens, a acenar-lhe nas primeiras filas.
Conheça o percurso que o Papa vai fazer em Fátima e as recomendações para os peregrinos.
