Ontem Já Era Tarde

António Raminhos: “Fui para o aeroporto e fingi que era um jogador contratado pelo Benfica. As pessoas vieram pedir-me autógrafos”

António Raminhos começou a sua carreira como jornalista desportivo. Trabalhou alguns anos no jornal A Capital até que este acabou por fechar as portas. Foi aí que pensou em dedicar-se exclusivamente ao humor.

Loading...

Num dos seus primeiros trabalhos na nova área, para a revista J, pensou em fazer-se passar por um jogador acabado de chegar a Portugal.

“Alguns amigos meus fingiram que eram jornalistas. Os meus sobrinhos, com uns 11 ou 12 anos na altura, eram putos que iam pedir autógrafos. Fui para a rampa das chegadas, vestido à jogador, com o crucifixo, o boné, a roupa do estilo.”

Quando começou a descer e os supostos jornalistas se aproximaram, Raminhos ficou surpreendido com o efeito de contágio nas restantes pessoas.

“Um senhor mais velho perguntou a um dos meus amigos que estava a fazer de jornalista quem era eu. E ele responde: ‘Um central que vem para o Benfica.’ E o homem assim: ‘Ah, já sei quem é.’

Nestas coisas tu vês que o futebol é muito engraçado e um fenómeno de massas.”

“Cheguei a insultar adeptos do FC Porto à saída de um jogo e vi que não queria ser aquela pessoa”

Raminhos vive intensamente os jogos do Benfica. Vai ao Estádio da Luz e acompanha a equipa em vários jogos fora, incluindo nas deslocações ao estrangeiro. Embora admita que continua a sofrer com as derrotas, diz que a fase de adepto mais intolerante foi-lhe passando com os anos.

“Hoje a doença é mais positiva. Tinha aquilo que acontece com muitos adeptos. Insultava e era agressivo com outras pessoas, sobretudo na fase da adolescência.”

Começou a mudar a sua postura e a relação com adeptos de outros clubes depois de um episódio que o marcou: “Depois de um Benfica-FC Porto, em que o Benfica ganhou, quando devia ter uns 14 anos, tive uma atitude de puto estúpido. Depois do jogo, eu e uns amigos começámos a insultar umas pessoas do FC Porto. Houve um momento em que olhei para a cara daquelas pessoas e vi medo. Percebi que não queria ser aquela pessoa e nunca mais fiz isso.”

Quando Raminhos ficou sem reação ao ver Aimar

António Raminhos tem Pablo Aimar como um dos seus ídolos no Benfica: “Quando Aimar jogava no Benfica, eu fazia algumas coisas para a BTV. Há um dia que vou no elevador com vários representantes do Benfica. Um deles era o Ricardo Lemos, que faz a ligação aos jogadores, e uma pessoa, tal como eu, também muito alta.”

É nesse momento que Raminhos fica sem reação ao ver uma das suas referências. “Vamos todos no elevador e eu sinto uma presença mais abaixo. Olhei e era o Pablo Aimar. Ele olha para mim e diz: “Hola, qué tal? Fiquei completamente atrapalhado, nem consegui dizer nada. Parecia um puto. Queria tirar uma foto com ele e perdi uma oportunidade.”

“Sérgio Conceição é um tipo solidário e preocupado com os outros. Mas precisa de ter mais calma. Aquilo faz-lhe mal.”

Além de todo o trabalho realizado na área da comédia, António Raminhos também mostra grande interesse pelas atividades realizadas na saúde mental e tem um podcast – Somos Todos Malucos – sobre a temática. O humorista nunca escondeu as suas próprias batalhas e tudo aquilo que tem feito para manter o seu equilíbrio.

Olhando para o futebol lembra os casos de vários jogadores com potencial que precisavam de acompanhamento: “O Fábio Paím, por exemplo.” Mas também há treinadores que necessitavam de alguma ajuda na parte da inteligência emocional: “O Sérgio Conceição”, afirma sem hesitar. “Conheci-o quando ainda era jornalista numa ação de solidariedade. Gosto dele, de vez em quando falo com ele. É um tipo solidário e preocupado com os outros. E alguém que vive muito o seu clube com muita emoção e que é sincero nisso, mas devia ter ali uma gestão emocional que não tem.”

Raminhos sublinha que a sua perspetiva é a de quem está de fora, mas deixa o conselho ao treinador do FC Porto: “Sérgio, é uma questão de saúde, é para chegares, pelo menos, aos 55 anos. Porque isso esgota uma pessoa [risos].”