Chegou à primeira equipa do Benfica com 16 anos e rapidamente se tornou num dos meninos bonitos das bancadas da Luz. Nada que depois não mudasse quando, em 1999, rescindiu contrato e rumou ao Atlético de Madrid.
“A ideia inicial era continuar no Benfica, mas melhorar as minhas condições. Tinha um contrato de quatro anos com outros quatro de opção e queria condições mais vantajosas para esses últimos quatro anos.”
Hugo Leal lembra que foi aí que se iniciou um conflito com a direção então presidida por João Vale e Azevedo: “Ainda hoje sou insultado na rua pela forma como saí do Benfica. É a parte do clubismo em que as pessoas não conseguem separar o profissional do homem. Muitas não me conhecem, nem sabem se sou simpático, boa pessoa ou má pessoa. O futebol tem esse lado em tudo é validado, aceite e normalizado.”
Além de Benfica e Atlético, passou por clubes como Paris Saint-Germain, FC Porto ou Braga e representou a Seleção Nacional em diferentes escalões, mas foi já como dirigente do futebol de formação do Estoril Praia que procurou contornar as partes mais negativas do futebol, algumas pelas quais passou, e procurar um processo construtivo.
Essa experiência pode ser lida no livro que acaba de lançar, “Não é só futebol, estúpido”, escrito com o jornalista Filipe Mendonça, e que conta com as participações de nomes como Jorge Jesus ou Rúben Amorim: “A ideia do título era provocar para mostrar esse lado menos bom do futebol e a forma como pode ser melhorado através da formação”, confessa.
Sobre ele, dizem várias vezes que passou ao lado de uma grande carreira. Hugo Leal tem a resposta pronta: “Estaria mais preocupado se tivesse passado ao lado de uma grande vida.”
“Não vejo nenhum jogo de futebol e não sei os nomes de muitos jogadores atuais”
Em 2013, a jogar no Estoril Praia e com 33 anos, Hugo Leal decide terminar a carreira. De lá para cá, confessa que perdeu a ligação com o futebol enquanto adepto.
“À medida que se aproximava o final, comecei a agarrar-me à ideia de que passaria a ter tempo para a família e que todos aqueles fins-de-semana em que estava ausente a jogar, iriam chegar ao fim. Acho que parte desse momento. Cortei com o futebol para desfrutar do pós-carreira, depois também fui deixando de ter jogadores do meu tempo para ir vendo. Mais tarde não me consegui voltar a vincular a esse gosto de ver futebol.”
Ao invés, lembra, assiste a jogos de pádel inteiros: “Não é por falta de tempo que não vejo futebol. O meu filho goza comigo porque gosta, vê jogos e até inventa nomes de jogadores para me deixar no ridículo, mas a verdade é que não me organizo para ver futebol. Nem finais de Champions, Mundiais ou Europeus. É muito raro.”
“Rúben Amorim dá 10 a zero aos demais na parte da comunicação. É um tipo que faz falta ao futebol”
Hugo Leal é amigo de Rúben Amorim e vê com orgulho o percurso do atual técnico do Sporting: “Ele dá 10 a zero aos demais na parte da comunicação. Falo da comunicação positiva, daquilo que eu gostaria de ver no futebol, de olharmos para os nossos, fazermos por nós e não estar a pôr veneno nos processos dos outros.”
Hugo Leal sublinha a transparência de Amorim como um dos fatores mais importantes: “Se há coisas que não podem dizer com ele, não percebo quais são porque ele vai dizendo quase tudo o que sente e dessa forma envolve os jogadores, os adeptos e os jornalistas e faz tudo isto com uma normalidade incrível. É um tipo que faz falta ao futebol”.
“Jorge Jesus foi a pessoa com quem mais aprendi no futebol, mas não queria tê-lo apanhado nos meus primeiros anos”
Hugo Leal foi orientado por Jorge Jesus no Belenenses, durante uma época, numa equipa da qual fazia parte Rúben Amorim. De todos os treinadores que teve no futebol, não tem dúvidas sobre o lugar onde coloca o atual técnico do Al Hilal: “Foi a pessoa com quem mais aprendi no futebol.”
Apesar de não se rever no estilo, admira a frontalidade de Jesus.
“Tem coisas que eu não faria como treinador, que eu não copiaria como a forma mais bruta no trato. No entanto, é super dedicado à sua função e é um ótimo comunicador. E quando falo em comunicador é no sentido de que ele sabe muito bem fazer chegar aos jogadores a mensagem sobre a sua ideia de jogo.”
Na comparação com outros treinadores, Hugo Leal destaca a faceta de Jesus “não deixar nada para depois”: “És confrontado com a sua verdade e sabes que é aquilo que ele pensa. Não é alguém que é mais ‘rato’, que te diz que sim a tudo com um sorriso e que depois, por trás, está a fazer-te outro tipo de situação. Ele não é assim.”
Apesar da admiração, Hugo Leal diz que não gostaria de ser treinado por Jorge Jesus mais cedo.
“Acho que não poderia apanhá-lo nos primeiros anos, sem moral, naquela fase em que ele te grita e tu não consegues defender-te. Aí, se calhar, não me teria feito bem [risos]. Mas na fase da carreira em que estava, nunca tive um confronto com Jorge Jesus. Ele sabe bem a quem não convém dar o grito. É inteligente nessa gestão. Com ele nunca tive nenhum episódio negativo. ”