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Luaty Beirão diz que amnistia é forma de PR resolver um "quebra cabeças"

O "rapper" luso-angolano Luaty Beirão, um dos 17 ativistas condenados pelo Tribunal de Luanda por rebelião, afirmou hoje, em entrevista à Lusa, que a amnistia em preparação é uma forma de José Eduardo dos Santos resolver um "quebra-cabeças".

Luaty Beirão

Luaty Beirão e outros 16 ativistas foram condenados a penas entre os 02 anos e 03 meses e os 08 anos e meio de prisão por atos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores - inicialmente acusados ainda de atentado contra o Presidente -, mas poderão agora ser abrangidos por uma amnistia em preparação pelo Governo para penas até 12 anos, que apenas excetua os crimes de sangue.

"Sempre foi um caso político e é com a política que ele [Presidente José Eduardo dos Santos] está a resolver. Se tivéssemos de aceitar, não o podíamos fazer porque não fizemos nada de mal", apontou em declarações exclusivas à Lusa, em Luanda, Luaty Beirão, em liberdade, por decisão do Tribunal Supremo, há precisamente uma semana, depois de um ano entre prisão preventiva, domiciliária e cumprimento de pena após a condenação, a 28 de março.

"É uma maneira de sair de fininho de uma coisa que foi um quebra-cabeças para ele", disse ainda Luaty Beirão, um dos críticos mais visíveis aos 37 anos de governação de José Eduardo dos Santos.

Contudo, recorda que em épocas pré-eleitorais "é habitual" a aplicação de indultos e amnistias em Angola: "Não quero ser egocêntrico ao pensar que isto tem a ver só connosco, estamos em fase eleitoral [eleições gerais agendadas para 2017] e é algo que ele costuma fazer", disse.

Assumiu ainda, para justificar esta decisão, que os vários casos conhecidos nos últimos meses, envolvendo o regime e direitos humanos em Angola, "colocaram a Justiça angolana sob o microscópio da sociedade".

"Numa de sair por cima como o grande magnânimo que perdoa quem ofende e tenta matar - supostamente era um atentado [a acusação inicial] -, sem dúvida nenhuma que isto vai ser um forte argumento para justificar esta ação de amnistia", afirmou.

A proposta de lei de amnistia foi aprovada em reunião do Conselho de Ministros de 29 de junho - precisamente no dia em que os 17 ativistas foram libertados por decisão do Tribunal Supremo, que deu provimento ao 'habeas corpus' da defesa - e a votação final do novo diploma legal, na Assembleia Nacional, está já marcada para 20 de julho.

Abrangerá, segundo o Ministério da Justiça, crimes praticados até novembro de 2015 - as detenções dos ativistas aconteceram em junho do mesmo ano - e visa "perdoar todos os crimes comuns puníveis com a pena de prisão até 12 anos" cometidos por cidadãos nacionais e estrangeiros, excetuando contravenções e crimes dolosos cometidos com violência ou ameaça contra as pessoas.

A medida abrangerá a pequena e média criminalidade, bem como os crimes militares, mas acautelando os que foram cometidos com violência, do qual tenha resultado a morte. Além disso, prevê a redução da pena aos demais agentes, através do perdão de um quarto das suas penas, sendo aplicável aos processos atualmente pendentes.

Em março, na última sessão do julgamento dos 17 ativistas, o Ministério Público deixou cair a acusação de atos preparatórios para um atentado ao Presidente e outros governantes, apresentando uma nova, de associação de malfeitores, sobre a qual os ativistas não chegaram a apresentar defesa, um dos argumentos dos recursos.

Os ativistas garantiram em tribunal que defendiam ações pacíficas e que faziam uso dos direitos constitucionais de reunião e de associação.

Luaty Beirão esteve em prisão preventiva entre 20 de junho e 18 de dezembro, período em que fez uma greve de fome de 36 dias que obrigou ao seu internamento, passou então a prisão domiciliária até 28 de março. Nesse dia foi condenado a prisão, pena que começou a cumprir de imediato - tal como os restantes 16 -, por decisão do tribunal, apesar dos recursos interpostos pela defesa.

Ao fim de uma semana de liberdade "quase total" - não pode sair do país, por estar em liberdade provisória -, afirma que o reencontro com a filha, há dois dias, por esta se encontrar em Portugal, foi o momento de maior emoção, desde que saiu da cadeia.

Lusa