O secretário-geral adjunto da ONU para o contraterrorismo defendeu, esta quarta-feira, a capitalização da morte do líder do Daesh, na semana passada, através da abordagem dos temas que permitem aos grupos terroristas atraírem novos seguidores.
Vladimir Voronkov refere, perante o Conselho de Segurança das Nações Unidas, que a morte de Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurayshi, na sequência de um ataque dos Estados Unidos no noroeste da Síria na semana passada, foi “talvez o mais significativo de uma série de golpes” contra a liderança do Daesh nos últimos meses.
No entanto, o chefe do Escritório das Nações Unidas para o contraterrorismo alerta que o grupo terrorista é conhecido pela capacidade para se reagrupar, apesar de perdas semelhantes anteriores.
“[Conseguem] manter e intensificar as suas atividades em regiões afetadas por conflitos em todo o mundo”, frisa.
Ensinamentos do 11 de setembro
Os ataques de 11 de setembro nos Estados Unidos estimularam as atividades contraterrorismo da ONU e Voronkov realça que o organismo aprendeu que combater o terrorismo “é um jogo de longo prazo e que não há soluções rápidas”.
“As operações militares de contraterrorismo podem ser necessárias, mas medidas abrangentes com um forte foco na prevenção são necessárias para lidar com a dinâmica que alimenta o apelo ao terrorismo”, defende.
Apelo ao combate contra recrutamento
O responsável insta todos os 193 países membros da ONU, começando pelo Iraque e Síria, onde o Daesh ainda se encontra concentrado, a “impedirem a sua expansão regional, a reduzirem a sua capacidade de lançar ataques e de recrutarem novos membros para as suas fileiras”.
Vladimir Voronkov refere que é momento de aproveitar a morte de al-Qurayshi para abordar as queixas que o Daesh e outros grupos extremistas exploram para recrutar.
“Devemo-nos concentrar em restaurar a dignidade humana, a confiança e a coesão social. Isso deve começar com a abordagem da situação de desespero nos campos de refugiados e instalações de detenção na Síria e no Iraque”, apontou.
As dificuldades humanitárias de milhares de pessoas, especialmente crianças com supostos vínculos familiares a membros do Daesh, levam a “um risco crescente de uma maior radicalização e recrutamento”.
Menores expostos ao radicalismo
Um relatório elaborado por especialistas da ONU, que monitorizam as sanções contra o Daesh e a Al-Qaeda, divulgado esta semana, refere que o acampamento de Al Hol, no nordeste da Síria, que acolhe familiares do grupo jihadista, abriga cerca de 60 mil pessoas, dois terços destas com menos de 12 anos.
O acampamento tem ainda um “anexo para estrangeiros”, com aproximadamente 2 mil mulheres e 7 mil crianças.
Os especialistas alertam que os menores neste acampamento continuam expostos à ideologia do Daesh.
Ataque à prisão de Hassakeh
Voronkov, que apresentou ao Conselho de Segurança o relatório, aborda ainda o ataque de combatentes do Daesh a uma prisão na cidade de Hassakeh, no nordeste da Síria, a 20 de janeiro, onde cerca de 3 mil militantes e jovens estão detidos.
O ataque à prisão resultou em dez dias de confrontos entre combatentes apoiados pelos EUA e militantes do Daesh e resultaram em quase 500 mortos.
“Fiquei particularmente perturbado pelo uso de crianças pelo grupo como escudo humanos durante os intensos combates que ocorreram dentro e ao redor da prisão”, atira.
Perigo da afiliações regionais
O secretário-geral adjunto da ONU para o contraterrorismo cita também outras organizações humanitárias e a ONU, que pedem aos países para repatriarem os seus cidadãos deste tipo de instalações.
Além da Síria e do Iraque, Voronkov realça que afiliadas regionais do Daesh “continuam a expandir-se numa escala e ritmo inquietantes”.
O responsável destaca a África Central, Oriental e Ocidental, alertando que a expansão dos afiliados do Daesh naquelas regiões “teria repercussões sérias e duradouras muito além do continente”.
Em Cabo Delgado, na zona fronteiriça entre Moçambique e a Tanzânia, Voronkov diz que a afiliada do Daesh sofreu derrotas após o destacamento de tropas estrangeiras, mas alerta que “o grupo parece mais deslocado do que derrotado”.
Numa nota positiva, o chefe do Escritório da ONU para o contraterrorismo reconhece que a atividade terrorista do Daesh diminuiu no Egito, Líbia e Marrocos no último semestre de 2021 “após ganhos de contraterrorismo, deserções e investimentos públicos em iniciativas de desenvolvimento”.
Quanto à Europa, Voronkov aponta que a principal preocupação continua a ser a “radicalização e recrutamento terrorista ‘online’” que pode inspirar a ataques isolados ou por pequenos grupos, “inspirados, mas não afiliados” aos extremistas do Daesh.