Opinião

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Catarina e a beleza de matar fascistas

Um artigo de opinião da editora de Política da SIC, Cristina Figueiredo, sobre a saída de Catarina Martins da coordenação do Bloco de Esquerda. Na corrida, até ver isolada, está Mariana Mortágua.

Catarina e a beleza de matar fascistas
Rodrigo Antunes/Lusa

Tiago Rodrigues que me desculpe a usurpação do (controverso) título de uma das suas peças de teatro, mas vem mesmo a calhar na hora em que, dez anos, três meses e três dias depois de ter tomado posse como coordenadora do Bloco de Esquerda (nos primeiros dois anos a meias com João Semedo), Catarina Martins anuncia a sua saída de cena.

Não sabemos se vai voltar à sua profissão original (atriz, nem mais), mas a acreditar nas suas palavras - e não há razão para duvidar -, não vai “andar por aí”, o que quer dizer que se auto-remete a figurante, depois de tantos anos como protagonista de um drama que nunca foi comédia mas praticamente acabou em tragédia, com o BE em apenas dois anos a perder metade do seu eleitorado e a ficar reduzido a um quarto do grupo parlamentar que chegou a ter entre 2015 e 2022.

Catarina sai um ano depois das legislativas que o BE ajudou a precipitar (com o chumbo do Orçamento do Estado para 2022) e que deram a maioria absoluta ao PS. Para alguns sairá um ano tarde de mais, mas terá sido um ano só aparentemente desperdiçado se tivermos em conta que foi o tempo preciso para convencer (e preparar) Mariana Mortágua a aceitar ficar ela agora com o papel principal.

Há tantos anos apontada como sucessora, já saberá as falas de cor, não vai precisar de ponto que lhe sopre as deixas. Mas ter a tarefa facilitada não é o mesmo que ter uma tarefa fácil: o BE tem de recuperar boa parte dos 250 mil eleitores que deixou fugir (a maior parte para o PS, outros para o Iniciativa Liberal) nas últimas eleições.

Daqui até às próximas legislativas, apesar da irrelevância a que as maiorias absolutas condenam as oposições, a nova coordenadora vai ter de demonstrar que o BE continua a fazer sentido, e que o Parlamento só tem a ganhar com a diversidade dos protagonistas - sem deixar que a embarcação democrática se incline excessivamente para estibordo; vai ter de provar que tem respostas para os problemas concretos do país (a crise climática e energética, as políticas de trabalho e salários, a habitação - só para citar os prioritários) e que poderá fazer a diferença em eventuais futuros reequilíbrios parlamentares.

O BE tem de deixar de vez para trás a imagem do partido que começou por ser disruptivo e anti-sistema, se afirmou como peça-chave da engrenagem que governou o país durante seis anos e acabou por ser uma das pedras na engrenagem que ajudara a criar, com isso cavando a própria sepultura.

Não, não é fácil. Como se diz nas estreias: muita merda, Mariana.